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Colaboradora
Publicado em 25 de novembro de 2025 às 16h03.
A Prefeitura de Angra dos Reis, no sul do Rio de Janeiro, vai começar a cobrar uma taxa de até R$ 95 a partir de janeiro de 2026 para turistas que visitarem a cidade e as ilhas locais. O valor será aplicado a visitantes que ficarem por até sete dias na região.
A medida integra um projeto de lei de iniciativa do Executivo aprovado pela Câmara em regime de urgência, sem consulta pública, o que repercutiu negativamente entre moradores e comerciantes da área.
A lei, publicada em 13 de novembro, usa a UFIR-RJ (Unidade Fiscal de Referência do Rio de Janeiro) como base de cálculo. O valor da UFIR é atualizado todos os anos pelo governo estadual - em 2025, cada UFIR-RJ equivale a R$ 4,75.
A taxa insular foi fixada em 20 UFIR-RJ (o equivalente a R$ 95) e a continental em 10 UFIR-RJ (R$ 47,50). Para permanência acima de uma semana, o visitante paga 1 UFIR-RJ adicional por dia. Caso o turista compre a tarifa do continente e depois decida ir para a ilha, ele paga apenas a diferença entre os valores.
Moradores de Angra, familiares de até segundo grau, crianças até 12 anos e pessoas acima de 60 anos estão isentos. Turistas que chegarem em cruzeiros poderão ter descontos entre 10% e 90%, a serem definidos por decreto.
O texto prevê ainda isenção para pacotes comprados até 31 de dezembro de 2025, com viagem programada até 31 de julho de 2026, além de descontos transitórios de 50% em 2026 e até 25% em 2027.
A lei também cria regras sobre ordenamento turístico. O Executivo poderá definir limites de embarcações e visitantes por atrativo, seguindo estudos técnicos sobre capacidade de carga.
A norma estabelece, ainda, que o Sistema Digital do Turismo (SDT) será o responsável pelo controle e arrecadação, mas autoriza o uso temporário dos sistemas existentes até que a taxa seja implementada.
Em nota, a gestão do prefeito Cláudio Ferreti (MDB) afirmou que a taxa financiará ações de preservação ambiental, saneamento, infraestrutura turística e segurança.
A prefeitura informou, ainda, que o processo de licitação para operar o sistema de cobrança está em elaboração e que um manual de pagamento e fiscalização será publicado.
O anúncio repercutiu entre moradores, comerciantes e empresários do setor hoteleiro, especialmente na Ilha Grande, onde a taxa será mais cara e pode chegar até R$ 95.
À Exame, Frederico Britto, morador e dono de pousada, afirma que o projeto foi aprovado sem participação da comunidade.
"Após a sanção, houve grande reação de moradores e comerciantes. Só então foi aberto um pequeno canal de comunicação com algumas secretarias, mas praticamente nada do que apresentamos foi levado em consideração", diz.
Britto defende que ordenar o turismo na Ilha Grande é necessário, mas a taxa não cumpre esse papel. "Somos contrários à taxa porque ela não atende a nenhuma dessas finalidades. A medida ignora um estudo de controle de visitação que custou milhões aos cofres públicos", pontua, em referência a um estudo elaborado pela Fundação CERTI em 2013, contratado inicialmente pelo governo estadual e atualizado pela prefeitura em 2024.
O estudo, ao qual a reportagem teve acesso, recomenda que a cobrança seja um dos instrumentos de gestão, e defende que o controle de fluxo seja feito por atrativo, com base na capacidade de suporte das áreas naturais. O documento também sugere que os valores arrecadados sejam destinados a um fundo específico para a Ilha Grande — o Fundo da Ilha Grande (FIG).
A minuta que propõe a criação do FIG lista como fontes de receita não só a taxa de visitação, mas também multas ambientais, taxas pelo uso de recursos naturais, eventuais ingressos para unidades de conservação, repasses públicos, doações, convênios e rendimentos financeiros.
O empresário também aponta incoerências na lei. “Há ofensa ao princípio da isonomia. Um turista que se hospedar na pousada de um caiçara na ilha vai pagar o dobro de quem ficar num grande resort no continente e visitar as mesmas praias por lancha”, afirma. Ele lembra que o estudo técnico chegou a sugerir valor de R$ 2,70 por visitante, bem abaixo dos R$ 95 fixados na lei.
Segundo Britto, o custo adicional pode encarecer a viagem. "A nossa preocupação é que isso vai onerar muito o ticket. Se nós considerarmos o gasto que o turista tem, já com o transporte terrestre, o transporte aquaviário e a hospedagem, isso pode ser com que a operação. Fica extremamente onerosa e acabe por inviabilizar o turismo aqui na nossa região", diz.
Ele também critica a falta de inventário turístico e de cadastro atualizado de moradores. Para ele, isso pode dificultar a fiscalização, estimular informalidade e aumentar o transporte clandestino, o que coloca em risco a segurança dos visitantes.
O tema chamou a atenção de autoridades estaduais. O deputado Marcelo Dino (União Brasil) pediu abertura de inquérito civil para apurar possível irregularidade, mas o Ministério Público informou que não cabe ao órgão contestar a lei. O Tribunal de Contas do Estado também foi notificado.
A reportagem tentou contato com a Secretaria de Comunicação e com a Secretaria de Desenvolvimento Regional (Ilha Grande) para confirmar informações repassadas à imprensa e esclarecer a implementação da taxa, mas não obteve retorno até a publicação.