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Alta rejeição a Bolsonaro e Haddad impõe dificuldades de governo em 2019

Elevado índice de rejeição dos dois postulantes ao Planalto mostrado nas pesquisas de intenção de voto indica dificuldades nos possíveis governos

Bolsonaro x Haddad: Aliada a esse cenário, que acirra a polarização política, está a agenda de decisões difíceis e potencialmente impopulares que o próximo presidente terá de tomar (Montagem/Exame)

Bolsonaro x Haddad: Aliada a esse cenário, que acirra a polarização política, está a agenda de decisões difíceis e potencialmente impopulares que o próximo presidente terá de tomar (Montagem/Exame)

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Reuters

Publicado em 3 de outubro de 2018 às 20h14.

São Paulo - O provável segundo turno da eleição presidencial entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) pode dar à luz um governo com dificuldades de engrenar a partir de 2019 devido ao elevado índice de rejeição dos dois postulantes ao Planalto, mostrado nas pesquisas de intenção de voto, disseram analistas ouvidos pela Reuters.

Líder e vice-líder na corrida presidencial, Bolsonaro e Haddad têm, de acordo com pesquisa Datafolha divulgada na terça-feira, rejeição de 45 e 41 por cento, respectivamente, o que pode levar a um segundo turno movido pela escolha do menos pior e a problemas de formação de uma base de sustentação a partir de janeiro.

"Vai ser um segundo turno em que os dois candidatos são rejeitados por quase metade da população", disse à Reuters Danilo Gennari, sócio da Distrito Relações Governamentais em Brasília.

Bolsonaro tem afirmado que não aceitará um resultado eleitoral que não seja a sua eleição à Presidência, ao passo que o PT adotou, antes de formalizar a candidatura de Haddad, discurso de que uma eleição sem a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva --barrado pela Justiça Eleitoral com base na Lei da Ficha Limpa-- seria uma fraude.

Aliada a esse cenário, que acirra a polarização política, está a agenda de decisões difíceis e potencialmente impopulares que o próximo presidente terá de tomar, diante de um cenário fiscal complicado e da necessidade de reformas para fazer frente a ele.

Assim, Gennari prevê que, qualquer que seja o vencedor do pleito de outubro, haverá reclamações e contestações. Para ele, a questão é qual será a repercussão delas.

"A grande questão que se coloca é: dado o nosso atual momento político, institucional, social, a gente vai ver um movimento parecido com o da última eleição em que o lado perdedor, no caso o Aécio (Neves), começou na segunda-feira atirando para tudo que é lado questionando e isso teve eco, principalmente na imprensa?", indagou, em referência ao candidato tucano derrotado em 2014.

"Tem espaço para isso acontecer de novo, termos mais quatro anos de buraco ou após a eleição, seja lá qual for o resultado, as pessoas vão parar, pensar e falar: 'Está bom, chega, vamos ser um pouco mais responsáveis dessa vez e vamos ver o que pode ser feito para o Brasil sair desse buraco, pelo menos para não afundar ainda mais?' Essa é a primeira questão."

Sem lua de mel

Com um cenário de acirramento da polarização política à frente, o analista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria, aponta também as decisões econômicas difíceis --muitas delas impopulares-- que o próximo presidente terá pela frente a partir de janeiro de 2019 como outro fator complicador.

O Brasil caminha para o sexto ano de déficit nas contas públicas em 2019 e o teto dos gastos, aprovado na gestão do presidente Michel Temer, deve impor à próxima administração escolhas difíceis.

"A minha leitura é de que nós temos um dilema político bastante significativo, independentemente do resultado eleitoral e a situação política muito mais exacerbada que sairia desse segundo turno entre Bolsonaro e Haddad. Isso exacerbaria o risco de não gerar um ambiente mais estável para a construção de coalizões", disse Cortez à Reuters.

"O Brasil não vive a sua normalidade política, nós vivemos um quadro muito polarizado, a agenda do próximo presidente é uma agenda marcada por conflitos complicados, por escolhas difíceis", avaliou.

Nesse cenário, a maior probabilidade é de que o presidente que assumir o leme do país em 1º de janeiro de 2019 não conte com a benevolência que costuma marcar o período inicial dos novos governos, na avaliação tanto de Cortez quanto de Gennari.

"Não acredito que exista essa lua de mel, diante não só do problema político, da polarização, mas também pelo tipo de agenda que o próximo presidente deve enfrentar", disse o analista da Tendências.

Inteligência política

Para o cientista político Creomar de Souza, da Universidade Católica de Brasília, as condições de governabilidade também dependerão do placar do segundo turno da disputa pelo Palácio do Planalto.

"Quanto menos consensual for a vitória, pior será o resultado em termos de eficiência presidencial no início do governo", avaliou.

"Porque esse chamado cheque em branco dos primeiros 100 dias parte do princípio de que você teve um rito totalmente civilizado", afirmou.

"Significa que um candidato ganha, o candidato que perde reconhece a derrota, dá um telefonema dizendo que perdeu, depois vai à mídia e diz: 'Agradeço aos votos e aos apoiadores, mas agora acabou a eleição, vamos todos seguir em frente, porque somos todos brasileiros'. Isso não existe no Brasil já há algum tempo."

Para ele, findo o primeiro turno no próximo domingo, com a consequente definição das bancadas de deputados e senadores a partir do ano que vem, os dois presidenciáveis que restarem da disputa pelo Palácio do Planalto deverão intensificar as negociações para formação de suas bases congressuais.

Bolsonaro, por exemplo, já conquistou o apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária e deverá se concentrar na busca por apoios de bancadas setoriais. Coordenadores da Frente Parlamentar Evangélica do Congresso e da Frente de Segurança Pública disseram à Reuters que a maioria dos integrantes dos dois grupos também apoia a candidatura do PSL.

Para o cientista político Adriano Oliveira, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Haddad parece ter mais condições de formar uma base parlamentar, dado seu histórico político, enquanto Bolsonaro é uma incógnita, pois nunca esteve nesta posição.

Creomar, da Universidade Católica de Brasília, faz, no entanto, uma previsão pouco otimista sobre o que deve ser a próxima legislatura, diante do cenário de polarização e da necessidade de tomada de decisões na área fiscal.

"Muito provavelmente, pelo que nós temos visto como constante nos últimos anos, o Congresso Nacional não vai ter inteligência política para entender a gravidade dessas agendas, vai estar muito mais preocupado com a manutenção de privilégios de toda a ordem", disse.

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