Protesto em São Paulo contra o assassinato da vereadora Marielle Franco (Leonardo Benassatto/Reuters)
Talita Abrantes
Publicado em 17 de março de 2018 às 06h30.
Última atualização em 17 de março de 2018 às 06h30.
São Paulo - As condições do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, Anderson Gomes, colocaram em alerta de autoridades dentro e fora do Brasil sobre a possibilidade de um crime político. Para especialistas, os indícios de execução parecem claros. A questão a ser respondida é: quem os matou e por quê?
Por ora, as investigações do crime estão sendo conduzidas pela Polícia Civil do Rio de Janeiro. Mas a Procuradoria-Geral da República já avalia se, a depender das circunstâncias, será necessário federalizar a apuração — ou seja, requerer que a condução do caso seja transferido para a Polícia Federal e Ministério Público Federal.
Nesta sexta, a procuradora-geral da República afirmou que espera que não seja necessário adotar essa medida.
Para entender o que está em jogo no debate sobre quem deve investigar a morte de Marielle, EXAME consultou o jurista Oscar Vilhena, professor de Direito Constitucional da FGV Direito de São Paulo. Entenda:
De acordo com a Constituição Federal de 1988, a investigação de crimes comuns é de responsabilidade dos estados por meio da Polícia Civil e do Ministério Público Federal, e o julgamento acontece na Justiça Estadual.
Dessa forma, neste momento, a apuração do assassinato de Marielle e de seu motorista está sendo liderada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro, com a cooperação da Polícia Federal. A Procuradoria-Geral da República, no entanto, estuda pedir a federalização do caso.
A Emenda à Constituição 45 de 2004 criou o mecanismo chamado tecnicamente de “incidente de deslocamento de competência” (IDC), que permite federalizar a apuração de crimes contra direitos humanos — em outros termos, autoriza a Polícia Federal e o Ministério Público Federal a conduzir a investigação, cujo caso passa, então, a tramitar na Justiça Federal.
Para federalizar uma investigação, é preciso que a Procuradoria-Geral da República ingresse com um pedido no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que pode acolher ou não a medida.
Até 2014, data do último levantamento do Ministério da Justiça sobre o assunto, o dispositivo foi requerido em quatro ocasiões. O STJ aprovou apenas dois. Um dos pedidos rejeitados estava relacionado ao caso do assassinato da morte da missionária americana e ativista Dorothy Stang, no Pará, em 2005.
Não. De acordo com Vilhena, para que os órgãos federais possam assumir o caso, é preciso estar comprovado que o estado não tem condições de conduzir as investigações.
“Há deslocamento de competência para a esfera federal quando for constatado que as autoridades estaduais não têm condições de investigar ou por não ter força, ou por estarem envolvidas e terem perdido a imparcialidade ou quando há um risco para o julgamento”, afirma o professor da FGV Direito SP.
Na quinta-feira (15), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, abriu uma investigação preliminar para avaliar a necessidade de federalizar a apuração da morte de Marielle.
A ideia, nesse caso, segundo Vilhena, é checar se as autoridades estaduais estão aptas para conduzir o caso. Segundo uma pessoa próxima à Dodge revelou ao Estadão, a intenção é acompanhar as investigações e, em caso de eventuais falhas, pedir ao STJ para que a investigação seja repassada para a esfera federal.
Por conta disso, ao anunciar o procedimento preliminar, Dodge autorizou a Polícia Federal a fazer as diligências necessárias desde que respeitados os limites de competência. Nesse caso, diz Vilhena, será uma apuração das condições da investigação estadual e não uma apuração do caso em si.