Índio terena: Luis Henrique atuou em tribunais de justiça de diferentes estados (Valter Campanato/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 15 de agosto de 2014 às 14h19.
Rio de Janeiro - O jovem Luiz Henrique Eloy Terena, um advogado de 25 anos e que traz sua etnia em seu sobrenome, aparece como uma peça fundamental do movimento indígena devido ao seu trabalho exclusivo na defesa dos direitos dos índios no país.
Segundo o cacique Lindomar Terena, um dos principais líderes da tribo Terena no estado do Mato Grosso do Sul, "a luta pelas gerações futuras já começou, e Luiz já fez história como advogado".
No entanto, Luiz Henrique, que saiu da aldeia Ipegui pela primeira vez para se preparar para o vestibular, sabe que sua tarefa não é simples, mesmo sendo acostumado a lidar com adversidades.
"Além das dificuldades financeiras, o mais difícil é a convivência", disse à Agência Efe o jovem advogado, formado na Universidade do Mato Grosso do Sul e na Universidade Católica Dom Bosco graças à política de cotas para índios e afrodescendentes em universidades.
"Existem muitos preconceitos contra esse sistema", relatou Luiz Henrique, que cita um antigo professor para ilustrar a discriminação na universidade: "Meu professor de direito constitucional punha como exemplo de inconstitucionalidade o sistema de cotas, o mesmo que me permitia estar na universidade", relatou.
Segundo Luiz Henrique, a falta de conhecimentos em informática e outras áreas, os preconceitos sociais e a falta de poder aquisitivo são algumas das principais dificuldades que os índios enfrentam ao buscar uma formação no ensino superior.
Por outro lado, o agora advogado diz se sentir "muito realizado" por dedicar seu trabalho exclusivamente à defesa das causas coletivas do movimento indígena, principalmente aquelas relativas à demarcação de terras, e aos processos contra lideres tribais.
"Recebi propostas para trabalhar no governo federal e no municipal, mas agora o que quero é trabalhar nas comunidades dando assistência jurídica", assegurou.
Com três anos de exercício da advocacia, Luis Henrique atuou em tribunais de justiça de diferentes estados do Brasil, incluindo o Superior Tribunal de Justiça em Brasília, onde apareceu como advogado de defesa.
Um de seus maiores sucessos veio à tona em 2013, quando conseguiu reverter uma decisão judicial que expulsava várias comunidades das terras tradicionais que haviam retomado.
"A comunidade Terena de Guriti, por exemplo, recuperou os 12 mil hectares de seu território, enquanto a de Bicatú recuperou 10 mil hectares, embora o processo de demarcação ainda tenha sido concluído em ambos os casos", explicou.
"Ter um pé na comunidade me permite ganhar processos, não basta ter só oratória e conhecimento técnico", defende o advogado Terena, que diz não ter recebido tratamento diferenciado por parte dos juízes e de outros letrados.
Atualmente, Luiz Henrique assessora o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), uma comissão do Episcopado brasileiro dedicada aos índios, e trabalha em um caso polêmico no Mato Grosso do Sul, o estado que registrou mais violência étnica em 2013.
Segundo Luiz Henrique, em 2006, dois policiais sem fardas entraram de madrugada na aldeia Dourados e dispararam indiscriminadamente. Alguns índios pensaram que eram pistoleiros a mando de fazendeiros e, em resposta, mataram dois agentes.
"Nas aldeias (indígenas) só é permitida a entrada de policiais federais acompanhados de representantes da Fundação Nacional do índio (Funai)", alegou o advogado.
Luis Henrique assegura que o programa do governo para dar proteção aos lideres indígenas ameaçados necessita de melhoras com urgência e, por isso, defende uma maior presença da Polícia Federal para inibir a violência nas tribos.
"A proteção não pode ser individual. Às vezes, as autoridades levam o líder ameaçado para outro lugar e isso desprotege e desestabiliza a sua comunidade", declarou.
Na opinião de Luiz Henrique, a Constituição brasileira é "muito boa", mas os direitos que recolhe são descumpridos. "O artigo 231 relativo aos indígenas não lhe sobra e nem falta uma só palavra, o problema é que ele não é cumprido", disse.
A Constituição brasileira de 1988 reconhece o direito dos povos indígenas sobre as terras que tradicionalmente habitaram e estabelece cinco anos para a demarcação desses territórios, embora esse processo ainda tenha sido finalizado.
"O governo não respeita a Constituição e o mais grave é que nos últimos anos há retrocessos importantes nos direitos garantidos", concluiu o primeiro advogado indígena do estado do Mato Grosso do Sul.