O economista Aloizio Mercadante tem passado a maior parte do tempo voltado às negociações políticas e não se posicionou publicament (Ricardo Stuckert/Divulgação)
Estadão Conteúdo
Publicado em 6 de outubro de 2022 às 17h43.
Sob pressão para sinalizar com clareza suas propostas para as contas públicas, a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda está dividida em relação ao caminho da política fiscal a ser adotado num eventual novo governo do PT. O ponto central das divergências é sobre a necessidade, ou não, de se adotar uma regra de controle das despesas para substituir o atual teto de gastos — que Lula já antecipou que será revogado se ele vencer a eleição.
De um lado, a "turma da política" defende a revogação do teto com a permanência da regra de meta de resultados primários (receitas menos despesas, sem considerar os gastos com juros da dívida pública). De outro, uma ala de economistas — entre eles, integrantes da Fundação Perseu Abramo, braço do pensamento econômico do PT — defende a necessidade de um modelo de controle de gastos que permita, ao mesmo tempo, investimentos em projetos prioritários, com efeito "multiplicador" para acelerar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).
Em meio às divergências, há uma movimentação interna para que detalhes sejam apresentados ainda neste segundo turno, como mostrou o Estadão/Broadcast. Esse grupo defende mais transparência agora, mas os avanços dependem das articulações políticas de apoio a Lula nesta fase da campanha até o dia da eleição, no fim do mês.
Em conversas com integrantes da campanha, representantes do mercado financeiro têm cobrado uma regra de controle de gastos que permita calcular com maior precisão a trajetória da dívida pública e a sustentabilidade das contas públicas.
A "turma da política", porém, defende um modelo semelhante ao que já foi adotado no passado, de busca de superávits primários, proposta que tem a simpatia do próprio Lula e apoio de integrantes da cúpula do partido, entre eles, a presidente do PT Gleisi Hoffmann. Na véspera do primeiro turno, em jantar com empresários do grupo Esfera, Lula voltou a citar a revogação do teto de gastos e a defender o retorno de um regime de superávits fiscais.
Para "aperfeiçoar" esse modelo de resultados fiscais, uma das propostas em discussão é a fixação de "bandas" para a meta de resultado fiscal, de forma a permitir, no caso de desaceleração da economia e redução da arrecadação, o aumento de gastos como medida anticíclica. Na avaliação do PT, esse modelo evitaria a "amarra" que ocorreu no passado para o cumprimento da meta fiscal diante da necessidade de corte de gastos para acomodar a frustração de receitas e a desaceleração da atividade econômica.
Já o outro lado defende uma nova regra de controle de gastos, mas com permissão de crescimento das despesas acima da inflação. O teto em vigor hoje, criado no governo Michel Temer, atrela o crescimento das despesas à variação da inflação.
Presidente da Fundação Perseu Abramo e coordenador do programa de governo de Lula, o economista Aloizio Mercadante tem passado a maior parte do tempo voltado às negociações políticas e não se posicionou publicamente. Economistas que discutem as novas medidas seguem "pisando em ovos". Porta-voz mais frequente para temas da área econômica da campanha, o economista Guilherme Mello defendeu um novo arcabouço fiscal, mas não deu detalhes dos planos.
Texto recente para debates de grupo de economistas, publicado pela Fundação Perseu Abramo, critica a regra de metas de resultado primário como está prevista hoje na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), destacando que o Brasil está atrasado em relação aos países que adotaram regras de gasto modernas, mais estabilizadoras do ciclo econômico.
Para esse grupo de economistas, que participa das discussões internas e faz o mapeamento da necessidade de aumento de gastos no início do próximo governo, as regras fiscais brasileiras - com destaque para a meta de resultado primário, a regra de ouro e o teto de gasto - são superpostas e contribuem para ampliar a volatilidade da economia. Um dos problemas apontados é que, dada a meta de resultado primário, exige-se bloqueio nas despesas quando há frustração de arrecadação, afetando as despesas que não são obrigatórias, em especial, os investimentos públicos.
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