Entrada da paleotoca: preguiça-gigante cavou abrigo na pedra. (Miolo Wine Group/Divulgação)
Gilson Garrett Jr
Publicado em 9 de fevereiro de 2023 às 06h12.
Um abrigo de preguiça-gigante foi descoberto em Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul, divisa com o Uruguai. Tecnicamente chamado de paleotoca, o local é considerado um dos mais bem preservados do país, datado de pelo menos 200.000 anos. O achado histórico fica dentro da propriedade da Vinícola Almadén -- do Miolo Wine Group -- que pretende incluir o abrigo em roteiros turísticos que já são feitos dentro da propriedade.
O local era conhecido e chamado pela comunidade gaúcha como 'toca do tigre' porque acreditava-se ter sido feito por um animal contemporâneo. Uma pesquisa conduzida pelo geólogo Serlécio Guilherme Pinz, com mais de 25 anos de experiência de campo e contratado pela Miolo, analisou diversos sinais de que a paleotoca não era uma simples caverna.
"Identificamos as primeiras marcas na parede que eram das garras da preguiça-gigante. Outro ponto que chamou a atenção é o formato de domo. Povos originários costumavam fazer estruturas semelhantes, mas com uma forma mais ovalada. Há indícios de que deveria ser uma fêmea porque há espaços laterais indicando que ela não estaria sozinha dentro da peleotoca, provavelmente com filhotes. O local era usado como dormitório uma vez que o animal não tinha predadores na época", explica o pesquisador em entrevista exclusiva à EXAME.
O abrigo do animal pré-histórico tem três metros de altura, três de largura e 35 metros de profundidade. No mesmo local também foi identificada uma outra toca, de um tatu-gigante, datada entre 10.000 e 30.000 anos. Como as preguiças-gigantes foram extintas há cerca de 50.000 anos, acredita-se que o tatu-gigante aproveitou o espaço para fazer seu próprio abrigo.
Pinz explica que a paleotoca da preguiça-gigante foi isolada e identificada. Todos os dados e análises foram catalogadas e serão cadastradas junto ao ICMBio/Cecav, que reúne o registro das cavernas existentes no Brasil. O órgão classifica os achados de acordo com o estado de conversação e importância em uma escala que vai de zero -- quando está bastante deteriorada -- até três. "Por tudo o que coletamos, eu acredito que o Cecav deve classificá-la como categoria três", afirma o geólogo.
O abrigo da preguiça-gigante faz parte da propriedade da Vinícola Almadén que conta com 1.200 hectares, sendo 450 dedicadas ao cultivo de vinhedos e o restante de matas preservadas. Com o achado pré-histórico, a ideia da marca é fazer um roteiro especial de visitação à paleotoca. Os estudos estão sendo feitos para não causar danos à estrutura e garantir segurança aos visitantes. A expectativa é que nos próximos meses o novo roteiro seja lançado. Atualmente, cerca de 1.000 pessoas visitam a vinícola por mês.
"Nosso compromisso é garantir sua preservação, mas também oportunizar aos nossos visitantes o acesso ao local, para que possam ver as marcas dos animais pré-históricos, a formação geológica e a própria história”, diz Adriano Miolo, diretor superintendente da MWG.
Paleotocas são estruturas cavadas por animais pré-históricos como a preguiça-gigante e o tatu-gigante. Esse abrigos são mais comuns de ser encontrados na região Sul do Brasil, em especial o pampa gaúcho, onde viveram boa parte dos animais que construíam essas estruturas como dormitório ou para fugir de predadores.
Uma das mais bem preservadas fica no distrito de Monte Bonito, em Pelotas. O local foi descoberto durante as obras de duplicação da BR-116/392, em 2015. As pesquisas indicam que a paleotoca foi feita por um tatu-gigante e é datada de aproximadamente 10.000 anos.
A preguiça-gigante foi um animal que viveu na Terra há mais de 50.000 anos, atingia cerca de 4,5 metros de altura e mais de três toneladas. As garras, com formato semelhantes ao das preguiças contemporâneas, chegaram a ter mais de 40 centímetros de comprimento. É classificada dentro do grupo de meso-fauna por estar em um tamanho entre os dinossauros e os animais contemporâneos.
A espécie desapareceu em uma extinção em massa. A causa mais provável e aceita pelos pesquisadores é em consequência do aquecimento global do planeta que ocorre de forma periódica. "Como o animal vivia em locais de clima temperado e frio, com muitos pelos, ele não aguentou o aumento da temperatura", explica Guilherme Pinz.