Brasil

A questão que importa: como o Brasil vai usar o dinheiro do petróleo?

Sobram bons e maus exemplos de como usar abundantes recursos naturais para impulsionar, ou para melar, o crescimento e o avanço social de um país

Petrobras (Reuters/Reuters)

Petrobras (Reuters/Reuters)

DR

Da Redação

Publicado em 6 de novembro de 2019 às 13h36.

Última atualização em 6 de novembro de 2019 às 13h49.

O leilão da cessão onerosa do pré-sal, na manhã desta quarta-feira, frustou expectativas. Em vez dos 106 bilhões de reais previstos, o país arrecadou apenas 68 bilhões em bônus de assinaturas.

Os dois blocos sem ofertas devem ser novamente oferecidos à iniciativa privada. O sucesso ou fracasso da nova oferta não muda uma questão de fundo: o Brasil tem uma oportunidade de ouro de mudar de patamar no mercado global de petróleo, e de usar os recursos para um salto de desenvolvimento. A dúvida é como chegar lá.

Reportagem de capa da última edição de EXAME mostrou que sobram bons e maus exemplos de como usar abundantes recursos naturais para impulsionar, ou para melar, o crescimento e o avanço social de um país.

A tendência é diminuir a dependência do petróleo, mas ele continuará sendo um ótimo negócio por décadas. De acordo com a projeção da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), a demanda por petróleo poderá avançar a um ritmo máximo de 1% ao ano até 2040, enquanto o crescimento médio anual de renováveis como eólica e solar deverá ser de pelo menos 3,4%. O crescimento pequeno, mas contínuo, do consumo dos combustíveis fósseis virá de regiões como China, Índia, África e América Latina.

A cadeia produtiva do petróleo é responsável por 4% do PIB, segundo cálculos da Fundação Getulio Vargas — algo como 270 bilhões de reais em 2018. Com os novos leilões, a projeção do banco Standard Chartered, feita antes da frustração desta quarta-feira, é que a geração de riqueza da cadeia petrolífera poderá chegar a cerca de 700 bilhões de reais no final da próxima década — cerca de 8% de um PIB estimado em 8,6 trilhões de reais.

O problema é que a combinação de recursos naturais com países emergentes costuma dar errado. É o que os economistas Jeffrey Sachs e Andrew Warner, da Universidade Harvard, eternizaram como “maldição dos recursos naturais”.

O PIB, a renda e os gastos dos governos tendem a crescer quando o preço das commodities está alto, mas caem e deixam um rastro de dívida pública tão logo o preço baixa — o ciclo de ascensão e bancarrota do Rio de Janeiro é uma parábola desse movimento. A corrupção é outro traço comum a países e regiões ricos em recursos naturais — o Brasil do pré-sal e a Venezuela são dois exemplos.

Os exemplos de fora

A boa notícia é que, mesmo no mundo em desenvolvimento, há exemplos de países fartos em commodities com políticas que conseguiram usar bem os ganhos e evitar a doença holandesa. Um mecanismo forte entre vários deles é a criação de fundos soberanos, uma espécie de poupança pública abastecida pelos royalties.

Noruega e Arábia Saudita são donas dos principais fundos desse tipo no mundo. Rússia, Timor Leste, Emirados Árabes e Catar também têm fundos soberanos. No Chile, o fundo nacional começou a ser abastecido em 1987 pelas receitas do cobre, responsável por 50% das exportações do país. Hoje, sempre que a arrecadação do governo fica acima da meta, o excedente vai para o fundo.

Transparência e instituições fortes são outros itens da lista de boas práticas. Noruega e Austrália, com mais de 60% das exportações em petróleo e minério, são as grandes referências. Sites do governo trazem detalhes de quanto é arrecadado e onde são gastos os recursos.

O Brasil já tem um fundo do gênero, mas está longe de ser um bom exemplo. O Fundo Social do Pré-Sal foi criado em 2010 com a função de acumular parte da renda com royalties e destiná-la a saúde, educação e outras áreas sociais. Não há, entretanto, informações claras e acessíveis sobre ele, e sua gestão segue, até hoje, sem regulamentação.

Em nove anos de existência, o fundo ainda não teve as diretrizes de investimento definidas, e boa parte do dinheiro que já arrecadou — um saldo de 32,7 bilhões de reais até outubro, de acordo com a Secretaria-Geral da Presidência da República — está parada à espera de decisão.

No superpacote econômico apresentado nesta terça-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes anunciou o plano de extinguir 247 fundos públicos para direcionar recursos para a gestão da dívida. Os bons exemplos de gestão de recursos de commodities mostram que transparência e preocupação social são fundamentais para que a riqueza encontrada no subsolo construa um país melhor.

A história recente, e os maus resultados no leilão desta quarta-feira, lançam grandes dúvidas sobre o futuro. Mas oportunidade melhor não há de pintar tão cedo. “É uma bênção o Brasil ter esse tesouro. Precisa ser bem usado”, diz José Mauro Ferreira Coelho, diretor da Empresa de Pesquisas Energéticas.

Acompanhe tudo sobre:Exame HojePetrobrasPetróleo

Mais de Brasil

Em votação apertada, Câmara aprova urgência de projeto que amplia número de deputados para 531

Por unanimidade, STF torna mais sete réus por trama golpista

Ninguém será contra a isenção de IR e vontade é entregar relatório ainda no 1º semestre, diz Lira

INSS: descontos irregulares serão devolvidos na conta em que o benefício é pago, diz presidente