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A batalha mais dura dos guerreiros de Chapecó

Após a tragédia, o povo sofre desorientado pela dor para organizar um grande funeral

Chapecó: o mundo segue estremecido por seu drama (Ricardo Moraes/Reuters)

Chapecó: o mundo segue estremecido por seu drama (Ricardo Moraes/Reuters)

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AFP

Publicado em 2 de dezembro de 2016 às 09h22.

Última atualização em 2 de dezembro de 2016 às 09h22.

Chapecó sempre foi uma terra de guerreiros. Assim era Vitorino Condá, o líder indígena que lutou para que seu povo mantivesse as terras do oeste de Santa Catarina. Sua lenda batizou o estádio da Chapecoense, time que lutou para ser grande, até que a tragédia venceu a batalha.

A estátua do Índio Condá na entrada da arena está hoje cercada pelo luto da cidade, que até a madrugada terrível do acidente planejava a festa de seu centenário em 2017, com o sonho de celebrar junto com a Copa Sul-americana.

Agora o povo sofre desorientado pela dor para organizar um grande funeral.

"Chapecó está parada, sofreu o primeiro impacto da notícia e, quando aconteceu o acidente, ninguém podia acreditar, demoramos a acreditar. Logo tivemos planejar a logística para trazer os corpos. Agora vem o impacto de sua chegada e a comoção será muito grande", disse à AFP o vice-prefeito eleito da cidade, Élio Cella.

O clube prevê que cerca de 100.000 pessoas vão se reunir nos arredores do estádio para se despedir de seus heróis durante o velório coletivo. Essa previsão pode ser superada com a confirmação de que os corpos chegarão nas primeiras horas de sábado, em pleno fim de semana.

O presidente Michel Temer poderia comparecer ao velório e se espera uma ampla representação do mundo do futebol, já que o país ama tanto esse esporte.

Logística do luto

Mas o maior desafio para o clube, que em média reunia 8.000 espectadores em suas partidas, chega no momento em que está completamente quebrado.

A Chapecoense trabalha contra o relógio, afogado em cadeiras vazias de seus dirigentes mortos em um profundo silêncio fúnebre. Dezenas de jornalistas de todo o mundo ocupam a pequena sala de imprensa no lugar dos cronistas veteranos que seguiam a equipe e nunca mais voltarão.

Mas o clube não está sozinho.

O mundo segue estremecido por seu drama e Medellín fez na quarta-feira uma homenagem que estremeceu essa cidade emocionada pela tragédia há dois dias.

A ajuda vem de voluntários, funcionários de Santa Catarina vindos de Florianópolis e também de várias equipes sanitárias.

"Somos uma média de 30 médicos, dezenas de psicólogos e enfermeiros se revezando em turnos dia e noite para dar apoio ao clube", disse à AFP o cardiologista Marcio Borges, no gramado do estádio.

Desde que se soube do pior, a Arena Condá se transformou no marco zero da dor para os familiares, refugiados em seu interior à espera de boas notícias que nunca chegaram, e para os torcedores que não deixam o estádio.

"Estamos tratando principalmente problemas emocionais, de muito desespero e tristeza, que desencadeiam também problemas de saúde como desidratação, muita dor de cabeça ou pressão alta. Os familiares e os dirigentes não se alimentam e sofrem dores de estômago ou desmaios", disse o médico.

Raro tesouro

Enquanto isso, o gramado vai se transformando pouco a pouco em um necrotério ao ar livre, onde um dos gols deu lugar às estruturas metálicas que receberão os 51 caixões e suas famílias em luto.

No gol oposto, ainda em pé e coroado de fitas pretas, flores lembram que há uma semana, que parecem muitos anos, a Arena Condá transbordava de alegria com sua histórica classificação para a final da Copa Sul-americana.

Ali, o goleiro Danilo pôs o famoso pé que eliminou o San Lorenzo, que agora estará nas páginas mais gloriosas e ao mesmo tempo mais tristes do clube. Como essa geração de lutadores que conseguiu o impossível, mas de que a tragédia roubou a vida e a fantástica aventura.

"O clube era especial pelo carinho com que todo mundo trabalhava, joguei quatro anos e meio aqui e sentia que era uma família, algo muito difícil de encontrar em outros lugares", contou emocionado o zagueiro Douglas Grolli.

Hoje jogando no Ponte Preta, Douglas, de 27 anos, estreou na 'Chape' por indicação de uma equipe técnica que já não existe.

"Ainda não assimilei bem. É muito difícil porque, além de ter um carinho gigante pelo clube, tinha também pelas pessoas, que me ajudaram muito. Se não fosse por eles, não estaria aqui hoje, diz Douglas.

E não é só ele que se sente agradecido.

Em um cartaz pendurado no gol da arena, se lia: "Eternamente campeões, obrigada guerreiros".

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