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83% dos professores não se sentem preparados para ensinar online

Antes da pandemia do novo coronavírus, quase 90% deles nunca tinha tido experiência com o ensino à distância, revela pesquisa do Instituto Península

 (Wikimedia Commons/Divulgação)

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EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 17 de maio de 2020 às 16h20.

Última atualização em 17 de maio de 2020 às 16h20.

Quase dois meses depois de as escolas fecharem por causa da pandemia do coronavírus, 83% dos professores não estão preparados para ensinar online. E são eles que dizem isso, em pesquisa realizada pelo Instituto Península.

Os docentes de redes públicas e particulares ainda se declaram ansiosos e nada realizados com o trabalho no momento atual.

Estudos internacionais e experiências em países que são considerados exemplos de educação mostram que o professor é fator determinante para o ganho de aprendizagem do aluno, principalmente para os mais vulneráveis. Em tempos de isolamento a importância aumenta, já que muitas vezes o profissional é o único vínculo com a escola.

Quase 90% dos docentes informaram na pesquisa que nunca tinham tido qualquer experiência com um ensino a distância e 55% que não receberam, até agora, suporte ou treinamento para atuar de maneira não presencial. Sem orientação clara, os profissionais têm criado as próprias atividades. Não é à toa que 83% afirmaram se comunicar pelo WhatsApp com as famílias, em vez de usar ferramentas pedagógicas.

"Enquanto uma série de profissionais no meio de uma pandemia está fazendo seu trabalho de casa e já é difícil, o professor ainda está tendo de se reinventar completamente", diz a diretora executiva do Instituto Península, Heloisa Morel. "Imagine a sobrecarga e o estresse." Desde meados de março, quando as aulas foram paralisadas, as secretarias de Educação têm oferecido programas a distância, alguns pela TV, e feito parcerias para usar ferramentas online. "Mas é preciso uma organização maior para que o professor entenda o que ele tem de fazer."

A professora Márcia Cristina Amorim Chagas, de 50 anos, decidiu gravar vídeos com o celular no sítio onde mora em Itapecerica da Serra. É a filha de 17 anos que faz as filmagens, "quando está de bom humor", brinca. Em um deles, Márcia teve a ideia de mostrar aos alunos como as cinzas das queimadas podem ajudar a adubar a terra para plantar cebolinha. Depois, o material vai sempre por WhatsApp para os pais das crianças.

Márcia ainda pede que os alunos escrevam ou gravem em áudio o que aprenderam. "Uso o meu celular, com a minha internet, que às vezes não funciona, e meu computador que paguei durante dois anos", diz ela, que dá aulas para 4.º e 5.º ano em uma escola estadual na Vila Madalena, zona oeste. "Eu trabalho numa escola integral e tive alguma formação em tecnologia, mas, para o que estamos precisando agora, o que aprendi foi mínimo." A professora diz que ainda não conseguiu usar com suas turmas o Centro de Mídias, plataforma criada pelo governo do Estado para o ensino remoto durante a pandemia.

Na rede particular, o WhatsApp é menos comum e 56% disseram usar o aplicativo de mensagens para se comunicar com o aluno. Mais frequente é a comunicação por meio de plataformas da escola. Mesmo assim, o sentimento de despreparo diante do desafio de ensinar online é o mesmo. "As coisas foram impostas de um dia para o outro, com o isolamento. Ninguém teve tempo de se preparar", diz a professora de ensino fundamental de uma escola particular de elite da capital, que pediu para seu nome não ser divulgado. Ela dá aulas para a fase de alfabetização e passou a criar jogos em aplicativos, com quebra-cabeça, localização de palavras, para seus alunos. "Estamos fazendo o melhor possível, mas não é nem de longe o que a gente entende por educação. Isso é bastante angustiante."

A presidente executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz, diz que poucas secretarias de Educação ou mesmo escolas particulares no País deram formação ou infraestrutura para professores em aulas não presenciais. A maioria dos profissionais tem usado seus próprios computadores, Wi-Fi ou celulares. "Não há preparação para aulas a distância e que são muito diferentes das presenciais. Não é intuitivo saber o que fazer online para assegurar a aprendizagem dos alunos", diz. "Os professores estão indo na tentativa e erro. E isso tem causado ainda mais estresse a um profissional que está sendo muito demandado nesse período."

A pesquisa ainda mostra que o cenário inclui uma saúde mental já prejudicada do professor. Quase 70% deles se disseram ansiosos e só 3%, realizados. E a maioria (75,2%) relatou que não recebeu até agora nenhum apoio emocional da escola em que trabalha. Mesmo em redes particulares, as equipes costumam se reunir online para discutir as abordagens pedagógicas durante a pandemia, mas raramente há grupos com psicólogos para que os professores possam expor o que sentem.

Em documento divulgado pelo Todos pela Educação na semana passada, o impacto emocional em professores foi um dos pontos principais apontados para que as escolas se preocupem na volta às aulas. O grupo de especialistas que analisou 43 pesquisas sobre momentos semelhantes ao atual, como desastres e guerras, diz que o suporte psicológico para professores é crucial porque, além de serem diretamente impactados pela crise, precisarão atuar na minimização dos efeitos sentidos pelos alunos.

A pesquisa "Sentimento e percepção dos professores brasileiros nos diferentes estágios do coronavírus no Brasil", do Instituto Península, ouve profissionais desde março e continuará até o fim da crise. Participaram nesta etapa 7.734 professores de escolas públicas e particulares do País, entre os dias 13 de abril e 14 de maio.

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