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P&D e o futuro dos alimentos

OPINIÃO | A indústria alimentícia está vendo grandes avanços acontecerem em sua atividade, e o setor de Pesquisa e Desenvolvimento foi essencial para esse feito

A biologia sintética, segmento da ciência que constroem novos componentes biológicos a partir do DNA de um ser vivo, vem ganhando um espaço cada vez maior na indústria (Nastasic/Getty Images)

A biologia sintética, segmento da ciência que constroem novos componentes biológicos a partir do DNA de um ser vivo, vem ganhando um espaço cada vez maior na indústria (Nastasic/Getty Images)

John Lin
John Lin

Chief Business Officer da Evera

Publicado em 8 de junho de 2023 às 09h33.

No início desse ano, a startup europeia Cradle, captou 5,5 milhões de euros para seu projeto de criação de proteínas personalizadas que podem ser usadas na produção de alimentos, assim como no mercado têxtil, cosmético e de higiene. Meses antes, a startup americana Melonfrost, que junta biologia e inteligência artificial, captou 7 milhões de dólares para a produção de “micróbios do bem” que seriam usadas para as mais diversas aplicabilidades que iriam do setor de alimentos e energia até terapias e materiais sintéticos. A Melonfrost, inclusive, captou seu primeiro cliente no setor de gorduras comestíveis.

Esses são apenas alguns exemplos de como a biologia sintética, segmento da ciência que constroem novos componentes biológicos a partir do DNA de um ser vivo, vem ganhando um espaço cada vez maior na indústria, devendo fazer parte do nosso cotidiano em poucos anos. De acordo com dados da consultoria MarketsandMarkets Research, o mercado de biologia sintética deve alcançar 35 bilhões de dólares até 2027.

Essa previsão é recente, mas é possível dizer que, até lá, já esteja obsoleta e que um volume maior de investimentos seja feito nesta área. Tal movimento não surpreende pois, cada vez mais, as fontes de recursos naturais vêm se esgotando, ou se mostrando insustentáveis do ponto de vista de sobrevivência do planeta e seus habitantes. Isso também leva a uma mudança no comportamento onde mais pessoas começam a olhar atentamente o rótulo de tudo aquilo que consomem e escolher aquele produto ou serviço que menos vai impactar negativamente no seu ambiente.

Essa mudança, por sua vez, obriga o setor produtivo a buscar alternativas de como continuar ofertando os mesmos produtos de uma forma sustentável para consumidores e para seus negócios. É desse raciocínio que parte a necessidade do investimento em P&D e que vem sendo fundamental para a transformação do setor de alimentos como um todo.

É certo que a indústria alimentícia e os órgãos competentes precisam investir no desenvolvimento de produtos com alternativas mais saudáveis. Em questão de tempo, produtos sem esse cuidado irão gradativamente desaparecer das prateleiras do supermercado, uma vez que essa passou a ser uma exigência da sociedade como um todo. Esse é um movimento que já começou. 

A produção de alimentos fabricados com ingredientes mais saudáveis, 100% naturais, não serve apenas para responder uma demanda de consumo, mas também para valorizar a produção de alimentos e o seu aproveitamento integral. A consciência da sociedade tem movido as indústrias para efetivamente desenvolver alternativas mais saudáveis e sustentáveis.

Em nosso país, ainda temos um longo caminho a percorrer. Todo tipo de avanço ou inovação só pode ser alcançada após um dedicado período de pesquisa, tendo o objetivo de conhecer melhor o objeto estudado, mas, acima de tudo, de gerar dados e informações que irão servir de base para outros trabalhos de desenvolvimento de soluções tecnológicas para essa indústria. Cada novo bloco de conhecimento é fundamental para gerar essas soluções.

No ano passado, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia lançou um programa para acelerar o desenvolvimento de soluções tecnológicas sustentáveis ao agronegócio, que deve beneficiar startups e pessoas físicas vinculadas a programas de pós-graduação strictu sensu com perfil de atender áreas de bioinsumos, biologia sintética aplicada, micro e nanomateriais e produtos alimentícios. É um esforço tímido, mas que precisa ter início.

John Lin é Chief Business Officer (CBO) da Evera, nova unidade de negócios da Citrosuco (Evera/Divulgação)

Mas imagine mais iniciativas como essa partindo de fundos de investimento do setor privado para capitalizar pesquisas, análise de informações e levantamentos realizados por entidades como universidades brasileiras, e empresas com foco em tecnologia e inovação.

É a persistência dos profissionais e investimentos das empresas em P&D na área de produção de alimentos que irão melhorar o valor nutricional e seu total aproveitamento para atender às necessidades dietéticas, prezar pela segurança alimentar, alinhar produtos e fórmulas à novas demandas e exigências do consumidor, gerar soluções para prolongar o shelf life dos produtos, além de encontrar e desenvolver ingredientes alternativos aos de origem animal.

A cerca de cinco anos faço parte de um grupo que vem trabalhando em novas iniciativas para aproveitar 100% a produção vinda da laranja – da fruta ao bagaço. Se apenas metade do fruto é usada na produção do suco especificamente, a outra metade é usada para a produção de ração animal para gado bovino, ovino e suíno. Até o momento já conseguimos identificar alguns ingredientes do bagaço de laranja com ampla aplicação na indústria de alimentos e bebidas e desenvolver a tecnologia de extração deles, como óleos e fibras alimentares (no formato de purês e seca) – soluções 100% naturais e sustentáveis. Nosso P&D também tem identificado uma série de outros ingredientes que tem potencial e estamos trabalhando para encontrar as tecnologias moderna e sustentáveis para obtê-las. Aqui a biotecnologia pode ser uma das respostas.

Temos visto avanços expressivos no P&D, principalmente no agro. A Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgou em março o Índice de Produção Agroindustrial (PIMAgro), onde se registrou avanço de 2,5% no segmento de produtos alimentícios e bebidas, compensando o recuo de 0,5% no grupo de não-alimentícios entre os anos de 2021 e 2022. Ou seja, espaço para crescer não é um desafio para essa indústria.

No momento que crescem também as discussões em torno da produção e consumo de alimentos que não tragam malefícios para o meio ambiente e nem para os seres vivos, o timing é perfeito. Que a construção de pontes e parcerias para o fomento à pesquisa e desenvolvimento conquiste, de fato, este espaço, conseguindo explorar o que for possível na produção de alimentos, desde as sementes até a mesa do consumidor.

* John Lin é Chief Business Officer (CBO) da Evera, nova unidade de negócios da Citrosuco, empresa líder mundial no setor de suco de laranja. Evera foi criada com o objetivo de produzir ingredientes 100% naturais a partir do total aproveitamento da laranja

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