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Produção de soja em Mato Grosso: o agronegócio foi beneficiado por alta dos preços e desvalorização cambial (Paulo Fridman/Bloomberg/Getty Images)
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 28 de dezembro de 2024 às 06h17.
Clima fora do controle, como as enchentes no Rio Grande do Sul, e a seca e as queimadas que atingiram o Brasil ao longo do ano, marcaram o agronegócio brasileiro em 2024.
O preço do azeite disparou, e a aprovação de temas importantes para o setor no Congresso, como a Lei do Combustível do Futuro e a Lei dos Bioinsumos, também tiveram grande relevância para o agro.
A EXAME reuniu os oito principais acontecimentos para o agronegócio brasileiro em 2024.
Entre o final de abril e o começo de maio, o Rio Grande do Sul enfrentou enchentes devastadoras provocadas por chuvas intensas.
Os eventos climáticos causaram danos sem precedentes, resultando no transbordamento das bacias dos rios Caí, Gravataí, Jacuí, Pardo, Sinos e Taquari, além do Lago Guaíba e da Lagoa dos Patos.
O estado, um dos maiores produtores de soja do Brasil e o principal de arroz, sofreu prejuízos em lavouras, pastos e fazendas.
Segundo a Emater-RS, as inundações nas áreas produtoras reduziram em 9% a produtividade do arroz — a expectativa inicial era de 8.325 kg/hectare, mas o número oficial, com a colheita finalizada, ficou em 7.600 kg/hectare.
A soja, que estava na fase final de colheita, também foi impactada, com uma redução de 10% na produção, para 19,65 milhões de toneladas.
Dados da Emater-RS mostram que 206.604 propriedades foram afetadas. A Farsul estima que o prejuízo do setor agropecuário no estado chegou a cerca de R$ 4 bilhões.
Com as condições climáticas mais favoráveis e a área já plantada, as previsões indicam que 2025 será um ano de recuperação, com um aumento estimado de cerca de 17% no volume de grãos produzidos no estado.
Para próximo ano, o governador Eduardo Leite (PSDB) disse à EXAME que lancará um programa voltado para a recuperação de solos, com o objetivo de ajudar na recuperação da produtividade, além de investimentos em infraestrutura.
Uma seca histórica marcou 2024, impactando profundamente os produtores rurais. A safra de café em Minas Gerais, maior estado produtor do Brasil, registrou queda de 3,3% em 2024, com uma produção de 28 milhões de sacas de 60 quilos, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) — a estiagem ocorreu durante a florada do café, etapa crucial para o desenvolvimento da colheita.
Além da seca, o Brasil registrou recordes alarmantes de queimadas em comparação a 2023. Entre janeiro e setembro de 2024, o país contabilizou 22,38 milhões de hectares queimados, um aumento de 150% em relação ao ano anterior.
Setembro foi o mês mais crítico, com 10,65 milhões de hectares consumidos pelo fogo, que atingiu principalmente as plantações de cana-de-açúcar no estado de São Paulo.
Os incêndios devastaram cerca de 414 mil hectares de áreas de cana-de-açúcar e de rebrota de cana no Brasil, causando um prejuízo estimado em R$ 2,67 bilhões aos canavicultores, segundo a Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), que atualmente representa 35 associações de fornecedores de cana e mais de 12 mil produtores.
Os preços do azeite dispararam até 50% em junho de 2024, impulsionados pela menor produção na Europa, principal região produtora.
O aumento refletiu os impactos de uma seca severa que, ao longo dos últimos dois anos, afetou as plantações de oliveiras em Espanha, Grécia e Portugal, três dos maiores produtores globais de azeite.
Na safra 2023/24, a Espanha, maior produtor mundial, colheu apenas 850 mil toneladas de azeitonas, resultado significativamente abaixo da média histórica.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a inflação do azeite de oliva começou a desacelerar em julho de 2024.
No mês passado, o produto registrou um aumento de 25%, indicando um ritmo menor de alta em comparação ao pico de 50% registrado em junho.
Em 2025, os preços do azeite devem registrar uma queda de 20% por causa de uma maior produção europeia.
Pela primeira vez na história, o Brasil superou os Estados Unidos e se tornou o maior exportador global de algodão.
Na safra 2023/24, o embarques brasileiros totalizaram 2,7 milhões de toneladas, enquanto os norte-americanos somaram 2,4 milhões de toneladas, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Dados da Conab mostram que o Brasil produziu 3,7 milhões de toneladas da pluma.
Para a temporada 2024/25, o USDA estima que o Brasil produza 3,66 milhões de toneladas e exporte 2,68 milhões de toneladas.
A aprovação da Lei do Combustível do Futuro representou um marco para o Brasil em 2024, com impactos significativos previstos no setor agrícola, especialmente na produção de biodiesel.
A nova legislação ajusta os percentuais de mistura de etanol na gasolina e biodiesel no diesel, além de incentivar o uso de diesel verde e do combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês).
A lei determina que o percentual de mistura de etanol na gasolina será fixado em 27%, podendo ser ajustado pelo Poder Executivo entre 22% e 35%, conforme as condições de mercado. Atualmente, a mistura pode chegar a 27,5%, com um mínimo de 18%.
Para o biodiesel, a mistura vigente de 14%, em vigor desde março deste ano, será ampliada gradualmente a partir de 2025. O incremento será de 1 ponto percentual por ano, alcançando 20% em 2030. Com a nova legislação, a expectativa é de que a produção de etanol no Brasil salte de 36 bilhões de litros para 59 bilhões de litros até 2037.
No próximo ano, a oferta de etanol de milho deverá saltar dos 8 bilhões de litros na safra 2024/25 para 10 bilhões de litros na safra 2025/26, segundo a Datagro Consultoria.
Para o biodiesel, que utiliza a soja como principal componente da mistura, a Datagro estima um crescimento de 10% na demanda em 2025 — o aumento resultará em um consumo estimado de 10,3 bilhões de litros no próximo ano, ante os 9,3 bilhões atuais.
Depois de o Brasil e alguns stakeholders pedirem, a União Europeia adiou em um ano a implementação da Lei Antidesmatamento (EUDR, na sigla em inglês), prevista para começar em 30 de dezembro de 2024.
Com o adiamento, a previsão é de que a lei passe a valer a partir de 30 de dezembro de 2025 para grandes empresas e em 30 de junho de 2026 para micro e pequenos empreendedores.
Desde o anúncio da implementação da lei, diversos segmentos do setor agroindustrial, tanto local quanto globalmente, se mobilizaram para adiar a legislação do bloco europeu, considerada impositiva por parte do agronegócio.
Após 25 anos de negociações, o Mercosul e a União Europeia fecharam um acordo que permitirá ao Brasil ampliar as exportações agrícolas para a Europa, especialmente de carnes e óleos vegetais. Juntos, os blocos representam cerca de 718 milhões de pessoas e economias que somam aproximadamente US$ 22 trilhões.
No entanto, o tratado ainda precisa ser aprovado pelo Conselho Europeu, pelo Parlamento Europeu e pelos Legislativos de todos os países da UE e do Mercosul, sem um prazo final definido para essas etapas.
Durante as negociações, países europeus, liderados pela França, criticaram o agronegócio brasileiro, alegando descumprimento de requisitos ambientais. O caso mais emblemático foi o do CEO do Carrefour, Alexandre Bompard, que publicou uma carta no LinkedIn criticando o setor.
A reação no Brasil foi imediata, com pecuaristas suspendendo o fornecimento de carne para a rede Carrefour no país. O impasse só foi resolvido após um pedido de desculpas de Bompard, embora ele tenha mantido sua posição sobre a carne brasileira.
Uma das principais demandas do setor, a legislação que regulamenta a produção de bioinsumos no Brasil foi sancionada sem vetos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Lei nº 15.070 estabelece normas para a produção e uso desses insumos no país.
Entre os destaques, a nova legislação oferece a segurança jurídica necessária para que os agricultores possam produzir bioinsumos de forma regulamentada e segura, especialmente o on-farm, ou seja, diretamente em suas propriedades.
De autoria do deputado Zé Vitor (PL-MG), o projeto foi aprovado por unanimidade na Câmara dos Deputados em 27 de novembro de 2024 e, poucos dias depois, no Senado Federal, com relatoria do senador Jaques Wagner (PT-BA).
A sanção foi considerada um marco para o agronegócio brasileiro, promovendo maior sustentabilidade e competitividade, segundo diversas entidades do setor.