Plantação de soja (Gary Conner/Getty Images)
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 15 de abril de 2025 às 17h32.
Cerca de 46% das doenças agrícolas no Brasil devem se agravar até 2100 em razão das mudanças climáticas, afetando diretamente as safras de arroz, soja, milho, café e cana-de-açúcar. O dado faz parte de um estudo da Embrapa, que aponta que o aumento da temperatura e as alterações no regime de chuvas favorecerão fungos, vírus e vetores, exigindo uma reestruturação urgente nos sistemas de monitoramento e controle fitossanitário no país.
"Muitos desses estudos destacam a necessidade de medidas de adaptação que ainda não foram efetivamente adotadas", afirma o estudo.
A previsão foi feita a partir dos dados presentes nos relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que indicam um aumento de temperatura no Brasil de até 4,5°C neste século — o aumento, aliado a mudanças nos padrões de umidade, afetará a interação entre plantas e patógenos.
A pesquisa avaliou 304 patossistemas (conjunto formado por patógeno e planta hospedeira) em 32 das principais culturas agrícolas brasileiras. O levantamento revela que os fungos são os patógenos mais recorrentes, presentes em quase 80% dos casos analisados.
Além disso, esse cenário cria condições ideais para a proliferação desses organismos, já que, alterações nas chuvas, com períodos mais secos ou intensamente úmidos, também interferem na dinâmica das doenças.
O estudo mapeou também que pode haver crescimento de anomalias transmitidas por vetores, como pulgões, cochonilhas, tripes, moscas-brancas e ácaros.
Segundo o pesquisador Wagner Bettiol, da Embrapa Meio Ambiente, o ciclo de vida desses insetos se torna mais curto com o aumento da temperatura, o que eleva sua longevidade. Isso resulta em populações maiores, mais ativas e com maior período de atividade durante o ano.
Como consequência, o risco para culturas como batata, banana, tomate, citros e milho, que já enfrentam esses problemas, será ainda maior.
O estudo da Embrapa apontou que as mudanças climáticas podem comprometer a eficácia dos defensivos agrícolas, exigindo ajustes nas estratégias de controle fitossanitário.
Segundo a pesquisa, toda a dinâmica dos fungicidas nas plantas – ou seja, como são absorvidos, transportados e degradados – pode ser alterada pelo novo cenário climático, que também afetará as características morfológicas e fisiológicas das plantas.
Dessa forma, o uso de produtos químicos pode se tornar menos eficiente ou exigir mais aplicações, o que aumenta os custos e os riscos ambientais. Esse perspectiva já impulsiona a busca por alternativas, com destaque para os agentes biológicos de controle, como os biopesticidas.
Atualmente, o Brasil é o maior produtor e consumidor global de biopesticidas, além de ser o país com a maior área agrícola sob controle biológico. Segundo projeção da consultoria Research and Markets, o mercado mundial desses produtos deve atingir US$ 19,49 bilhões até 2030.
Apesar desse protagonismo, os pesquisadores alertam que o Brasil precisa reforçar a adaptação desses bioagentes às novas condições climáticas.
“Precisamos desenvolver, com urgência, bioherbicidas e produtos biológicos que aumentem a eficiência do uso de nitrogênio e reduzam o estresse abiótico das plantas”, afirma BettioL.
Ele também defende o avanço no desenvolvimento de soluções biológicas para o controle de doenças estratégicas, como a ferrugem asiática da soja e a ferrugem do cafeeiro, além da seleção de agentes de biocontrole adaptados ao novo clima.