(New Holland/Divulgação)
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 2 de junho de 2025 às 12h36.
Última atualização em 2 de junho de 2025 às 14h21.
O aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) deve elevar os preços dos fretes marítimos, pressionar as margens do produtor rural e dificultar o acesso ao crédito rural, afirmam especialistas ouvidos pela EXAME.
No agronegócio, o custo do IOF sobre pagamentos internacionais subiu de 0,38% para 3,5%, aumento de oito vezes, explica Lucas Moreno, CEO da Ello X, startup de logística internacional de carga.
Isso significa que todas as remessas para pagamento de frete internacional, armazenagem no exterior e a compra de mercadorias terão agora um imposto maior.
“Os donos dos navios e agentes de carga já comunicaram os clientes sobre a necessidade de repassar esse custo imediatamente. Com isso, o produtor rural perde competitividade e margem, pois a commodity tem preço de bolsa e não permite repassar o custo adicional”, afirma Moreno.
Um frete marítimo que custava cerca de US$ 4 mil passou a ter um custo adicional de IOF que subiu de US$ 15 para US$ 140 por contêiner, segundo cálculos citados pelo CEO.
O aumento expressivo nos custos de frete marítimo compromete a competitividade das exportações brasileiras, elevando o custo da logística e reduzindo as margens de produtores e exportadores.
“No caso das importações, o impacto é igualmente severo, já que insumos como fertilizantes e máquinas ficam mais caros, pressionando ainda mais o custo da produção agrícola”, ressalta Moreno.
Na conjuntura atual, marcada por juros altos — com a Selic a 14,75% ao ano — e margens já comprimidas desde 2023, o aumento do IOF tende a agravar a crise financeira do produtor rural.
Na visão de Moreno, a conta não fecha: o custo do fertilizante e outros insumos supera o retorno obtido com a venda das commodities, o que pode levar o produtor a optar por menor uso de insumos, plantio reduzido e até prejuízo em escala mais ampla.
Além do aumento nos fretes, o reajuste do IOF pode agravar o acesso ao crédito rural, afirma David Télio, diretor de Novas Estruturas Financeiras na Terra Magna.
O IOF está embutido no custo dos empréstimos bancários que fornecedores de insumos agrícolas — como sementes, fertilizantes, agroquímicos, máquinas e equipamentos — contraem para financiar suas operações e os prazos de safra.
Desde a safra 2023/24, o produtor rural opera com margens apertadas devido ao aumento dos custos, principalmente dos insumos. Para a safra 2025/26, se o aumento do IOF for mantido, os custos podem "estrangular" a produção, alerta o diretor.
Segundo Télio, cooperativas de crédito, que atendem principalmente pequenos e médios produtores, também enfrentarão custos maiores, o que pode dificultar ainda mais o acesso a financiamentos essenciais para a produção agrícola.
"Ele planta sabendo que, com o preço atual, terá prejuízo. O impacto do aumento do IOF é absolutamente sistêmico: atinge todos os elos da cadeia produtiva. E, embora a exportação não tenha IOF, produtores que tomam empréstimos para financiar sua produção voltada para o mercado externo também serão afetados", afirma Télio.
A dinâmica pode pressionar a inflação dos alimentos no Brasil — um dos principais motivos apontados pelo próprio governo, inclusive, que impactam a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Ao mesmo tempo, há o risco de prejuízo à competitividade do Brasil no mercado externo, com reflexos negativos para a balança comercial do agronegócio.
O setor e entidades como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Conselho Nacional dos Exportadores de Café (Cecafé) já buscam diálogo com o governo para tentar mitigar esses efeitos.
Na semana passada, a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), com outras 11 frentes, assinou um manifesto contra a medida do governo.
"Essa é mais uma iniciativa preocupante no contexto da política fiscal brasileira, sobretudo ao lidar com um tributo que, apesar de seu caráter extrafiscal, tem sido recorrentemente utilizado como instrumento de aumento da carga tributária, sem a devida transparência ou debate público", diz o documento.
No final de maio, o Ministério da Fazenda, comandado por Fernando Haddad, decidiu aumentar o IOF para reforçar a arrecadação federal e ajudar a cumprir as metas do arcabouço fiscal.
Segundo Haddad, não há alternativa para cumprir as obrigações orçamentárias sem os R$ 18,5 bilhões que o governo estima arrecadar com o aumento do imposto. A medida foi implantada, mas enfrentou resistência do Congresso, que pressiona o Executivo a buscar alternativas.
Haddad afirmou nesta segunda-feira, 2, que será necessário "corrigir outras distorções do sistema financeiro para abrir espaço para a calibragem do decreto" do IOF — [grifar]Haddad não esclareceu quais são as distorções.
Segundo ele, o tema foi debatido em conversa com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicano-PB), e com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e as medidas serão divulgadas após a apresentação aos dois do conteúdo das propostas da equipe econômica.