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Disparada nos preços do cacau impulsiona contrabando na Costa do Marfim

Prática se intensificou a partir do segundo semestre de 2023, quando os preços do cacau chegaram a bater US$ 13 mil por tonelada

Cacau: altas intensas nos preços do grão impulsionam comércio ilegal. (Tomaz Silva/Agência Brasil)

Cacau: altas intensas nos preços do grão impulsionam comércio ilegal. (Tomaz Silva/Agência Brasil)

Estela Marconi
Estela Marconi

Freelancer

Publicado em 17 de junho de 2025 às 09h38.

Última atualização em 17 de junho de 2025 às 09h41.

A disparada nos preços do cacau no mercado internacional tem impulsionado uma forte onda de contrabando a partir da Costa do Marfim, maior produtor da commodity, ao lado de Gana.

Segundo a Bloomberg, agricultores e atravessadores locais passaram a cruzar as fronteiras para vender o produto em países vizinhos.

Mesmo com a alta, os produtores de cacau não estão se beneficiando com o aumento, motivado pela regulação imposta pelo governo, através do Conselho do Café-Cacau, que define os preços pagos aos agricultores.

Atualmente, o valor estabelecido para o pagamento gira em torno de um terço do preço internacional, o que incentiva a venda ilegal do produto em outros países. Nessas fronteiras, o valor pago pelo cacau é cerca de duas vezes maior que o preço fixado pelo governo marfinense.

Os principais destinos são Guiné, Togo e Libéria, países com menos controles estatais, que vêm registrando exportações muito superiores ao seu potencial de produção.

A situação tem causado alarme entre os comerciantes globais, que enfrentam dificuldades para garantir o fornecimento e manter a rastreabilidade da origem dos grãos - fator fundamental após as novas regulamentações europeias sobre desmatamento.

O contrabando se intensificou a partir do segundo semestre de 2023, quando os preços do cacau chegaram a bater US$ 13 mil por tonelada, frente a valores anteriores próximos a US$ 3 mil, diz a reportagem.

Estimativas apontam que cerca de 100 mil toneladas de cacau foram retiradas ilegalmente da Costa do Marfim na safra 2023/2024, o equivalente a quase 6% da produção nacional.

Na Guiné, por exemplo, os embarques de cacau subiram 15% em um ano, apesar da ausência de investimentos relevantes no setor. No início da nova temporada, as exportações guineenses já dobraram em relação ao ano anterior.

“Não dá para justificar um salto de 25 mil para 95 mil toneladas apenas com aumento de produção interna”, afirmou à Bloomberg Fabrice Laurent, da consultoria Forestero.

Como funciona o contrabando?

O esquema envolve desde pequenos motociclistas que cruzam as fronteiras à noite com sacas de cacau, até redes organizadas que operam caminhões carregando mais de 30 toneladas por viagem.

Fontes relataram que os subornos cobrados para atravessar os postos de controle variam de US$ 8 mil a US$ 21 mil por caminhão.

Apesar de ilegal e com risco de penas de até 10 anos de prisão, o contrabando se tornou lucrativo aos agricultores. Um operador ilegal pode ganhar mais de US$ 240 por semana, superando em três vezes o salário mínimo da Costa do Marfim.

“Deus esteve do nosso lado nesta temporada”, disse à Bloomberg um contrabandista identificado como Fred, na cidade fronteiriça de Danané.

Consequências e medidas do governo

O cacau é responsável por cerca de 40% da receita externa do país e o caso vem preocupando o governo da Costa do Marfim. A queda nos embarques também compromete contratos já firmados com traders internacionais. Algumas empresas já relataram prejuízos milionários em 2024.

A pressão fez o governo reforçar as ações de combate ao comércio ilegal. Tropas foram enviadas à fronteira e comitês regionais foram criados para coordenar operações.

Segundo o Conselho de Segurança Nacional, as forças de segurança já apreenderam mais de 590 toneladas de cacau e prenderam 34 pessoas. Em fevereiro, segundo informações da Bloomberg, 2 mil toneladas escondidas sob falsa declaração de borracha foram interceptadas.

Mesmo com os avanços, produtores locais relatam frustração. Em Duékoué, cidade a 400 km de Abidjan, o líder de uma cooperativa afirmou que parte dos agricultores preferiu vender para contrabandistas.

“Como convencer o produtor a aceitar menos, se outro comprador oferece mais?”, questionou. “Não dá para controlar o clima, mas o contrabando é algo que o governo deveria conseguir enfrentar.”

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