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Desmatamento, clima e economia: Como o agronegócio será tratado na COP28?

Analistas acreditam que Lula precise ir além de ‘o Brasil voltou’ e incluir Itamaraty e Fazenda nas conversas sobre soluções baseadas na natureza e agricultura de baixo carbono

Soluções baseadas na natureza: uso sustentável dos recurso naturais, ciclagem de nutrientes e manejo biológico são exemplos (Syngenta/Divulgação)

Soluções baseadas na natureza: uso sustentável dos recurso naturais, ciclagem de nutrientes e manejo biológico são exemplos (Syngenta/Divulgação)

Mariana Grilli
Mariana Grilli

Repórter de Agro

Publicado em 29 de setembro de 2023 às 18h21.

Última atualização em 29 de setembro de 2023 às 18h22.

Ao longo das décadas, as mudanças climáticas que se intensificaram foram atribuídas às emissões de gases de efeito estufa de alguns setores econômicos. Embora ao redor do mundo, a maior parte delas esteja relacionada à combustão de combustíveis fósseis, no Brasil, são desmatamento e mudanças do uso da terra que agravam a situação ‘poluidora’ do país – sobretudo se 71% destas emissões recai sobre a Amazônia. De acordo com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), em todo o país, 92% das emissões brutas são causadas por alterações de uso da terra, que em sua maioria consistem no desmatamento e conversão de vegetação para atividade agropecuária. Neste sentido, o relatório do IPAM aponta que, em 2021, a atividade agropecuária respondeu por 74% de toda a poluição climática brasileira.

Passados dois anos destes números, o governo federal tenta recuperar a credibilidade perante a comunidade internacional em relação à preservação de suas florestas. Mas não acaba aí. Separar o joio do trigo e mostrar qual desmatamento é ilegal, qual realmente se torna prática agropecuária e em quais condições ela é feita são particularidades brasileiras que podem ser esclarecidas na COP28 – a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima da ONU, realizada entre 30 de novembro e 12 de dezembro em Dubai, nos Emirados Árabes.

Para isso, é preciso mais do que a presença diplomática do presidente Lula, que no ano passado, mesmo sem ainda ter sido eleito, ficou marcado pelo discurso na COP27 de que ‘o Brasil voltou’, em alusão a ‘voltar para o protagonismo ambiental’. Na opinião de Marco Antônio Fujihara, agrônomo consultor e ex-diretor do Ibama, é preciso ir além do slogan. “Acho que a gente já foi mais protagonista. Até porque, para o ser, é preciso colocar coisas concretas na mesa”, diz Marco Antônio Fujihara, ex-diretor do Ibama e fundador da Infrapar Capital Partners, consultoria com foco em projetos de ESG que tenham impacto na economia.

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Segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), o primeiro semestre de 2023 fechou com uma redução de 60% no desmatamento da Amazônia, alcançando a menor área devastada em seis anos, desde 2018. Resultado importante, mas depois de alguns retrocessos, pondera Fujihara. Para ele, haverá pouco avanço para mostrar na COP28. No entanto, com inteligência, o Brasil pode se apropriar das discussões sobre soluções baseadas na natureza (NBS, sigla em inglês), aliadas à atividade agropecuária de baixa emissão de gases poluentes. A expressão refere-se a projetos de intervenções humanas inspiradas nas funções naturais de ecossistemas saudáveis. São soluções que protegem o meio ambiente e proporcionam benefícios econômicos e sociais, como armazenar carbono e regular o fluxo hídrico.

Agro, Fazenda e Itamaraty

Marco Antônio Fujihara concorda que o agronegócio está em um momento mundial de obter mais atenção e de ser discutido entre a sociedade. No entanto, ele vê que esta correlação entre clima, agropecuária e economia ainda está atrasada e demonstra superficialidade por parte do corpo técnico do governo federal. “O que representa o contingenciamento das emissões do setor no Brasil? Você tem que fazer uma correlação clara do impacto na economia, o Ministério da Fazenda deveria entrar mais na discussão”, ele diz.

Além disso, Fujihara vê fragilidade na forma como as posições brasileiras são construídas internamente antes de levar para a COP, não havendo consenso, por exemplo, entre ruralistas e ambientalistas. “Se o Itamaraty pudesse ouvir a sociedade civil, o privado e construir uma posição local antes... Mas acho que as nossas discussões são muito pouco profundas, muito superficiais e elas não conseguem evoluir justamente por isso”, afirma.

Quem também fala do papel do Itamaraty é Carlos Sanquetta, professor titular da Universidade Federal do Paraná e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). De acordo com ele, o Ministério das Relações Exteriores deve manter a diplomacia, mas não há como negar que o país sempre teve momentos de promessas difíceis de cumprir, bastante discurso e agora é preciso fortalecer as práticas. “O desmatamento é muito crucial, é o ponto nevrálgico”, diz.

Financiamento climático

Lula deve manter, em Dubai, a postura que teve na Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque, sobre reforçar o pedido por financiamento climático. O passo seguinte deveria ser, segundo Sanquetta, mostrar a viabilidade econômica de ampliar as soluções baseadas na natureza (NDS, sigla em inglês) na discussão da agropecuária sustentável. “A atenção dada na COP27 para as NDSs foi bastante importante. Esse ponto vai voltar com mais relevância e o Brasil é um player importante, mas não dá para negar que esse assunto entre agropecuária e floresta tem relação com o desmatamento”, diz.

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Além do financiamento climático, Sanquetta ressalta que as discussões sobre transferência de créditos de carbono também interessam ao Brasil, incluindo o setor de bioenergia e a geração de créditos pelo setor da cana-de-açúcar. Para ele, “não é tão fácil para os países entenderem a nossa lógica”, então o melhor a fazer é mostrar avanços concretos, com dados. “O Brasil precisa de financiamento e pode levar como bandeira ser o possível fornecedor mundial de etanol ou até mesmo a volta do Fundo Amazônia, mas para isso tem que cumprir o desmatamento zero até 2030 e mostrar que sabe usar os recursos da natureza para uma atividade agrícola mais sustentável”, diz.

Marco Antônio Fujihara enfatiza que, mesmo com o financiamento dos países, “se não houver comando e controle lá na ponta de onde acontece o desmatamento, não tem sentido outras discussões, como carbono ou agricultura regenerativa”.

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