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Corte de imposto sobre trigo teria pouco impacto no preço dos alimentos, avalia especialista

Medida cogitada pelo governo enfrenta limitações, pois grande parte do trigo já é importada sem tarifa, especialmente da Argentina

Plantação de trigo (Bloomberg / Colaborador/Getty Images)

Plantação de trigo (Bloomberg / Colaborador/Getty Images)

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 28 de fevereiro de 2025 às 10h51.

A possibilidade de o governo cortar o imposto sobre a importação do trigo para reduzir o preço dos alimentos tem baixa efetividade no combate à inflação. A análise é de Leandro Gilio, professor e pesquisador do Insper Agro Global. Segundo ele, as medidas cogitadas pelo Planalto até o momento são simplistas diante do atual cenário inflacionário.

“É mais uma medida sem grande impacto. Primeiramente, a redução da tarifa de importação do trigo teria um efeito marginal na inflação, pois seu impacto seria diluído ao longo das cadeias produtivas, resultando em pouca influência no preço final. Além disso, grande parte do trigo importado vem do Mercosul, especialmente da Argentina, onde já não há a aplicação de tarifas”, afirma o professor.

Na tarde desta quinta-feira, 27, os ministérios da Agricultura e Pecuária (Mapa), Desenvolvimento Agrário e Fazenda se reuniram com entidades do setor produtivo para discutir medidas para reduzir o preço dos alimentos. Segundo fontes presentes no encontro, a proposta foi cogitada durante a reunião. Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a alta dos preços tem sido um dos principais fatores para a queda de sua popularidade.

"O impacto não seria imediato, pois há estoques disponíveis. Além disso, apenas uma pequena parte das importações seria afetada, e o efeito se diluiria ao longo da cadeia produtiva, já que o trigo é, em grande parte, um insumo. Logo, a influência nos preços ao consumidor seria mínima", diz Gilio.

Fontes ligadas ao comitê criado pelo governo para discutir essas medidas disseram à EXAME que o corte no imposto sobre a importação do trigo é uma ação viável.

"Os países do Mercosul abastecem o Sul, Sudeste e parte do Centro-Oeste do Brasil. Já o Nordeste e o Norte dependem do trigo importado do Hemisfério Norte", explica um interlocutor.

O Brasil consome, em média, 12,8 milhões de toneladas de trigo por ano, sendo que mais da metade desse volume vem de outros países. Em 2024, o país importou 6,6 milhões de toneladas, um aumento de 59% em relação a 2023. A Argentina foi responsável por 63% das exportações para o mercado brasileiro.

Para Gilio, o governo deveria focar em reduzir custos de produção e solucionar gargalos internos que prejudicam a produtividade e os preços, como logística e infraestrutura.

“Redução de perdas na produção, ampliação do crédito subsidiado para investimentos produtivos e ações sobre insumos são fatores essenciais. Além disso, grande parte dos insumos agrícolas é importada e, com a taxa de câmbio atual, os custos seguem elevados. O problema é que o governo busca ações imediatistas", diz o pesquisador.

O Brasil mantém uma cota anual de até 750 mil toneladas de trigo importado de fora do Mercosul com tarifa zero. Acima desse volume, incide uma taxa de 10%, além da tarifa da Marinha Mercante. O compromisso foi firmado com a Organização Mundial do Comércio (OMC) para garantir a oferta, mas fontes do governo negam a retirada da tarifa de importação.

Procurada, a Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), entidade que representa o setor produtivo, informou à EXAME que só comentará a medida após sua publicação oficial pelo governo.

Crise na Agricultura

A pressão de Lula por medidas para reduzir o preço dos alimentos tem recaído principalmente sobre o Ministério da Agricultura, comandado por Carlos Fávaro. Nesta semana, especulações indicavam que o ministro poderia deixar o cargo em razão de conflitos com a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).

Embora a informação não tenha sido confirmada pela pasta, interlocutores afirmam que a posição de Fávaro é delicada, já que ele resiste em adotar medidas heterodoxas para conter a alta dos alimentos.

Lula, por sua vez, nunca fez críticas públicas ao ministro. Pelo contrário, o presidente confia em sua gestão à frente da Agricultura, segundo fontes ligadas à pasta.

Fávaro e outros membros do governo apostam na safra recorde de grãos em 2024/25 como fator para reduzir os preços dos alimentos.

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