A escalada do conflito entre Israel e o Irã começa a refletir no agro brasileiro, especialmente no mercado de fertilizantes. Com a produção de ureia paralisada — já que o Irã é um dos principais produtores desse fertilizante — o impacto no abastecimento global coloca os agricultores brasileiros em alerta para a safra 2025/2026, que começa em 1º de julho.
No Brasil, a ureia é um dos principais insumos utilizados no plantio do milho, uma das commodities mais importantes do país, ao lado da soja. O Brasil importa 85% dos fertilizantes que utiliza, sendo que, em 2024, o Irã foi responsável por 17% das importações brasileiras, o que torna o setor vulnerável a choques externos.
Um relatório da StoneX, divulgado na segunda-feira, 16, revela que as notícias sobre o conflito impulsionaram os preços futuros da ureia nos Estados Unidos, no Oriente Médio e no Brasil, refletindo a percepção do mercado de que o evento representa um fator de alta.
Segundo a consultoria de commodities Argus, o preço da ureia granulada no Brasil estava, em média, US$ 398 por tonelada na quinta-feira passada, 12, quando o mercado de fertilizantes apresentava baixa liquidez, ou seja, poucos negócios estavam sendo realizados.
Esse cenário ocorreu porque os compradores aguardavam os resultados de um leilão na Índia. O país asiático é um dos principais compradores do insumo.
No entanto, o leilão e o mercado de fertilizantes ficaram em segundo plano devido ao aumento das tensões no Oriente Médio. Nesse cenário, o preço da ureia atingiu US$ 430 por tonelada na sexta-feira, 13. Já na segunda, 16, o preço médio alcançou US$ 435 por tonelada, conforme registrado pela consultoria Argus.
"Essa alta foi influenciada não apenas pela situação política no Oriente Médio, mas também pela valorização do mercado de futuros, com a ausência de muitos participantes no mercado físico, ou seja, aqueles que compram e vendem o produto diretamente", afirma a Argus.
Queda no mercado global
Para Tomás Pernías, especialista da StoneX, embora não haja danos diretos nas plantas de produção de fertilizantes no Irã e em Israel, a guerra já gerou uma redução significativa na oferta de ureia no mercado global.
"O Egito, que depende do gás israelense para a produção de fertilizantes, paralisou parte de sua produção, enquanto o Irã, também grande produtor de ureia, diminuiu a oferta devido aos riscos do conflito", diz. De janeiro até a última quinta-feira, os preços da ureia já subiram cerca de 9%.
Em 2024, os preços da ureia subiram 11%. A escassez de oferta, agravada pela ausência de fornecimento da China — principal produtor global do fertilizante — e pela crescente demanda de países como a Índia, torna o cenário ainda mais incerto.
Além disso, mesmo com a proximidade do início da safra, muitos produtores não garantiram seus fertilizantes. Os mais preparados, diz Pernías, podem antecipar a compra de fertilizantes até um ano antes, quando as relações de troca são favoráveis. Já outros podem deixar a decisão para a última hora.
"A maior parte do consumo e das entregas de fertilizantes ocorre no segundo semestre no Brasil. Portanto, podemos afirmar que, sim, haverá um aumento no consumo nos próximos meses, especialmente com a aproximação da safra", afirma o especialista.
A produção brasileira de milho, que depende na maioria da ureia para garantir a qualidade e o rendimento das lavouras, deve enfrentar custos mais elevados, pressionando ainda mais as margens dos produtores, já pressionadas desde a safra 2022/2023.
Os temores são de que com a escalada do conflito, justamente na chegada da próxima temporada, ocorra um efeito cascata sobre os preços dos alimentos, pressionando ainda mais a inflação.
Preços do petróleo e diesel
Além dos fertilizantes, o agronegócio brasileiro pode enfrentar desafios consideráveis em função do aumento dos preços do petróleo.
Segundo José Pimenta Júnior, diretor de Comércio Internacional e Relações Governamentais na BMJ Associados, o impacto da guerra vai além da geopolítica, afetando diretamente os custos de produção e o comércio internacional.
O aumento das tensões no Oriente Médio resultou em uma alta de 7,02% no preço do petróleo tipo Brent (referência mundial), com o barril alcançando US$ 74,23 na sexta-feira, 13. Na semana passada, a commodity teve uma valorização de 12,37%.
O Irã é um importante produtor de petróleo, com uma produção de 3,3 milhões de barris diários, o que representa quase 5% da produção mundial.
"O aumento no preço do petróleo, impulsionado pela guerra no Oriente Médio, já reflete no custo de energia e combustíveis, impactando diretamente a economia brasileira. O Brasil importa petróleo, e a alta nos preços tende a elevar os custos de insumos essenciais para o agronegócio", afirma Pimenta.
O efeito pode ser um aumento no preço do diesel. Como esse combustível é essencial para abastecer caminhões, responsáveis por transportar mais da metade das cargas no Brasil, isso pode pressionar o frete rodoviário.
Em maio, o preço médio do frete por quilômetro rodado no Brasil voltou a registrar alta. O valor médio nacional passou de R$ 7,34 para R$ 7,43, marcando um aumento de 1,23% em relação a abril e interrompendo uma sequência de dois meses de queda, segundo análise do Índice de Frete Rodoviário da Edenred Frete (IFR), com dados da plataforma Edenred Repom.
Pimenta alerta também que as mudanças nas rotas marítimas podem gerar um aumento nos custos para o agronegócio. No ano passado, a Maersk anunciou que a interrupção no transporte de contêineres no Mar Vermelho impactou não só as rotas comerciais entre a Ásia e a Europa, mas toda a sua rede global de transporte.
“Se essa valorização for sustentada, pode elevar os custos de fretes marítimos e rodoviários, além de pressionar os preços dos seguros de carga. Isso adiciona mais um componente de pressão sobre os custos de importação”, diz Pernías, da StoneX.
Desde dezembro de 2023, empresas do setor têm desviado embarcações e usado o Cabo da Boa Esperança, na África, a fim de evitar ataques de militantes Houthi, alinhados ao Irã, no Mar Vermelho. Como resultado, os tempos de viagem mais longos aumentaram os custos de frete.
O Oriente Médio é um destino crucial para as exportações brasileiras de produtos como carne e proteína animal. O impacto indireto nas rotas de transporte pode gerar uma escalada de preços, prejudicando tanto os exportadores quanto os consumidores finais.
Conflito Israel x Irã
O Exército de Israel anunciou nesta terça-feira, 17, que matou o principal comandante militar do Irã, Ali Shadmani, em um bombardeio noturno, descrevendo-o como a figura mais próxima do líder supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei.
"Após uma oportunidade repentina durante a noite, (a Força Aérea israelense) atacou um centro de comando no coração de Teerã e eliminou Ali Shadmani, chefe do Estado-Maior em tempos de guerra, o comandante militar de maior alta patente e a figura mais próxima de Khamenei", afirmou um comunicado militar.
O Exército acrescentou que Shadmani havia comandado tanto a Guarda Revolucionária quanto as Forças Armadas iranianas.
Israel e Irã entraram nesta terça-feira no quinto dia de conflito aberto, após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pedir para que os moradores de Teerã abandonassem a cidade "imediatamente".