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Como o clima pode ameaçar — até 2100 — a hortaliça mais consumida do Brasil

Brasil produz cerca de 680 mil toneladas de alface por ano, com São Paulo sendo o principal estado produtor

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 6 de setembro de 2025 às 14h08.

Última atualização em 6 de setembro de 2025 às 14h14.

Plantar alface ao ar livre no Brasil pode se tornar cada vez mais difícil nas próximas décadas. Até o final do século, quase todo o território brasileiro enfrentará alto risco climático para a produção da hortaliça mais consumida no país.

Esse é o resultado de uma pesquisa divulgada pela Embrapa Hortaliças, que utilizou dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

Atualmente, o Brasil produz cerca de 680 mil toneladas de alface por ano, com São Paulo sendo o principal estado produtor, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O valor da produção é estimado em R$ 1,2 milhão.

As regiões Sudeste e Sul concentram cerca de 93% da produção comercial de alface no país, sendo essas áreas responsáveis por cerca de 60% da população, especialmente nas grandes cidades.

As regiões Nordeste, Centro-Oeste e Norte também apresentam produções significativas, variando entre 70 mil e 15 mil toneladas por ano, segundo o último Censo do IBGE.

O estudo da Embrapa considerou dois cenários climáticos: um otimista, com controle parcial das emissões de gases de efeito estufa, e outro pessimista, em que as emissões continuam a crescer até 2100.

Em ambos os cenários, o cultivo de alface, especialmente ao ar livre, está ameaçado. O verão, com temperaturas que podem ultrapassar os 40°C em grande parte do Brasil, será a estação mais crítica, pois a alface exige um clima ameno e uma umidade equilibrada para seu desenvolvimento.

"Compreender os impactos das mudanças climáticas sobre a produção de alface no Brasil é crucial para desenvolver estratégias de adaptação e evitar prejuízos", afirma Carlos Eduardo Pacheco, pesquisador da Embrapa.

No cenário otimista, em que há controle parcial das emissões e aumento da temperatura global entre 2°C e 3°C até 2100, a pesquisa aponta que quase todas as regiões do Brasil apresentarão alto risco climático para o cultivo de alface durante o verão, com algumas pequenas áreas produtivas restantes.

Já no cenário pessimista, onde o território brasileiro enfrentará aumento contínuo das emissões de gases de efeito estufa, todo o país será afetado por risco climático muito alto para a produção da hortaliça, com a faixa litorânea apresentando risco alto.

"Esses mapas destacam a urgência de desenvolver sistemas produtivos adaptados ao clima, especialmente para hortaliças, que são mais sensíveis às condições climáticas do que grandes culturas como milho ou soja", diz Pacheco.

Clima e alface

Uma das soluções propostas pela Embrapa é o desenvolvimento de cultivares de alface mais tolerantes ao calor, além da implementação de sistemas de produção sustentáveis.

Entre as alternativas estão o uso de sistemas regenerativos, como o plantio direto de hortaliças e o cultivo orgânico com compostagem, além do cultivo em ambientes controlados ou protegidos para minimizar os impactos de condições climáticas adversas.

Uma das cultivares mais promissoras é a BRS Mediterrânea, que tem se mostrado especialmente resistente ao calor.

A pesquisa da Embrapa também foca na identificação de cultivares com raízes mais vigorosas, o que pode melhorar o aproveitamento de água e nutrientes do solo, além de aumentar a resistência ao estresse hídrico.

A partir destes resultados, os planos da Embrapa são expandir o mapeamento para outras espécies de hortaliças, como tomate, batata e cenoura com o uso de inteligência artificial visando obter maior escala e agilidade no desenvolvimento dos estudos.

“É preciso olhar para esses mapas e seus dados como uma ferramenta estratégica para o delineamento de novas pesquisas em resposta à crise climática”, afirma o pesquisador em Mudanças Climáticas Globais da Embrapa.

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