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Acordo UE-Mercosul: o que o agro brasileiro deve ganhar; entenda

Crescimento da produção do agro brasileiro a ser gerado pelo acordo deverá ser de 2%, ou US$ 11 bilhões anuais, segundo estudo do Ipea

 (Ricardo Stuckert/Divulgação)

(Ricardo Stuckert/Divulgação)

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 6 de dezembro de 2024 às 11h48.

Última atualização em 6 de dezembro de 2024 às 17h39.

Depois de 25 anos, o Mercosul e a União Europeia fecharam, nesta sexta-feira, 6, um acordo histórico entre os dois blocos. A tratativa permitirá ao Brasil aumentar suas exportações agrícolas para a Europa, especialmente de setores como os de carnes e óleos vegetais juntos os blocos reúnem cerca de 718 milhões de pessoas e economias que, somadas, alcançam aproximadamente US$ 22 trilhões.

O anúncio do acordo nesta sexta não significa que ele entrará em vigor automaticamente. O tratado terá de ser votado pelo Conselho Europeu (grupo que reúne os chefes de estado), pelo Parlamento Europeu (congresso formado pelos eurodeputados, que são eleitos para representar seus países na União Europeia) e pelos Legislativos de todos os países da UE e do Mercosul. Não há prazo final previsto para essas etapas.

No caso de ser aprovado, o crescimento da produção do agro brasileiro a ser gerado pelo acordo deverá ser de 2%, ou US$ 11 bilhões anuais, segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado em fevereiro.

A maior parte deste ganho (75%) se dará em quatro setores: carne de suínos e de aves, pescado e preparos alimentares, óleos vegetais e gado vivo.

"Apenas as carnes de suíno e aves estão entre os [produtos] que iriam se beneficiar com aumento de cotas de exportação. Nos demais, como carne bovina, açúcar e arroz processado, as cotas adicionais não se reverteriam em grande aumento de produção. Isso porque as exportações para a União Europeia não representam uma fração elevada da exportação total ou da produção doméstica", aponta o estudo do Ipea.

"Em linhas gerais, a UE terá que zerar 82% das importações agrícolas do Mercosul e prover acesso preferencial com tarifa reduzida para 97% dos produtos. Estamos falando de bens com alto valor agregado à pauta exportadora do país, como suco de laranja, café solúvel, proteína animal (avícola e bovina), etanol, açúcar, entre outros, diz à EXAME, José Luiz Pimenta Júnior, diretor de Comércio Internacional  e Relações Governamentais na BMJ Associados.

No caso da carne bovina, o acordo prevê que o Mercosul poderá exportar 99 mil toneladas por ano adicionais para a Europa, além das 200 mil toneladas já vendidas atualmente. Desse total, 42,5% (42.075) corresponderão ao Brasil.

De janeiro a outubro deste ano, o Brasil exportou 92 mil toneladas de carne bovina para o bloco europeu, o que representa 2,66% do total embarcado pelo país no período, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) e compilados pela consultoria Safras & Mercado.

As exportações fora desta cota serão submetidas a uma tarifa reduzida de 7,5%, bem abaixo das tarifas padrão aplicadas pela UE a produtos de países fora do bloco.

A implementação das cotas, contudo, será gradual, ao longo de cinco anos. As 99 mil toneladas representam 1,2% do consumo anual de carne bovina na UE — que gira em torno de 8 milhões de toneladas.

Em nota, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) afirmou que o acordo oferece mecanismos para lidar com eventuais impactos negativos de medidas unilaterais que possam afetar exportações do Mercosul.

"Os dois blocos acordaram compromissos em matéria de desenvolvimento sustentável que adotam abordagem colaborativa e equilibrada, reconhecendo que os desafios nessa área são comuns e devem ser enfrentados de forma cooperativa", disse a pasta. 

O Brasil fez questão de incluir no acordo compromissos que garantem transparência e inclusividade, especialmente para assegurar que agricultores familiares, comunidades locais e mulheres tenham acesso efetivo aos benefícios que o acordo pode gerar.

Críticas ao acordo

Nas últimas semanas, agricultores franceses fizeram protestos contra o acordo. O CEO do Carrefour criticou a carne brasileira, mas se retratou após produtores brasileiros iniciarem um boicote contra a rede. Além disso, o Parlamento francês rejeitou o acordo em votação na semana passada. O tratado foi aprovado pela UE, mesmo sem o aval de alguns países, como Polônia e Itália.

"A União Europeia representa aproximadamente 15% das exportações da agropecuária brasileira para o exterior. Esse número explica, em parte, a preocupação de alguns países europeus, especialmente a França, talvez devido à percepção de um impacto maior do que os dados indicam", afirma Leandro Gilio, professor e pesquisador do Insper Agro Global.

O Mercosul é formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, países de destaque no setor de grãos e pecuária. O bloco sul-americano tem uma participação superior a 15% do total mundial em apenas seis produtos como soja e seus derivados, cana-de-açúcar, girassol, café, mandioca e carne bovina.

Na visão de Pimenta, do BMJ Associados, o bloco europeu não deveria enxergar a questão como concorrencial.

"O que teremos é uma complementariedade produtiva. O Brasil oferece carne de qualidade, com preço acessível, o que permitirá que essa carne seja processada e complemente a produção europeia", afirma.

O acordo também permitirá à União Europeia ampliar suas vendas, especialmente de produtos manufaturados.

"A UE quer expandir suas exportações para outros mercados, mas a China, por exemplo, provavelmente elevará as tarifas sobre esses produtos, tornando ainda mais difícil a venda. Onde, então, a Europa pode colocar esses produtos? Em mercados como a América Latina, onde já tem parceiros comerciais de longa data", diz Pimenta.

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