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A geada que dizimou cafezais do Paraná – e tirou de Londrina o título de "capital mundial do café"

Fenômeno, que ocorreu no inverno de 1975, atingiu fortemente as lavouras de café do norte do estado

 (Embrapa/ Fabiano Bastos)

(Embrapa/ Fabiano Bastos)

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 21 de setembro de 2024 às 06h01.

Mesmo sendo reconhecido como um dos principais estados agrícolas do Brasil, o Paraná, atualmente, não é um grande produtor de café.

Minas Gerais e Espírito Santo ocupam 58,2% e 20,6%, respectivamente, da área total em produção no país, de acordo com dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), enquanto o Paraná ocupa de 15% a 20%. Mas nem sempre foi assim.

A história da cafeicultura paranaense é marcada por altos e baixos, mas um evento específico se destaca por seu impacto devastador: a geada negra.

O fenômeno, que ocorreu no inverno de 1975, atingiu fortemente as lavouras de café do norte do estado, deixando um rastro de destruição que afetou a economia local e a vida de milhares de agricultores.

A geada negra é um tipo de geada severa que, além de causar a morte das folhas, também queima os brotos por dentro, deixando-os com aparência escura e pode devastar a planta por completo – em uma noite de julho, as temperaturas caíram drasticamente, atingindo marcas que não eram vistas há anos na região.

“O vento frio colabora para que a geada seja bastante intensa. Foi o caso. Uma geada como a de 1975 aniquilou toda a produção de café. Nesse caso, seria preciso esperar três anos até o café se recuperar. Quando ocorre uma geada dessas, o tronco queima até o nível solo. Mas depois o café brota”, explica o agrônomo Irineu Pozzobon.”

Em apenas algumas horas, vastas áreas de café foram dizimadas, afetando propriedades que, em sua maioria, dependiam exclusivamente dessa cultura para sua sobrevivência.

Na época, a cidade de Londrina, localizada no norte do Paraná, a cerca de 430 quilômetros de Curitiba, se destacou como um dos principais polos cafeeiros do Brasil.

O desenvolvimento do município foi impulsionado pelo cultivo do café, que na época era conhecido como “Ouro Verde” devido ao seu alto valor comercial. Londrina chegou a ser chamada de "Capital Mundial do Café", especialmente nas décadas de 1960 e 1970, quando a Cia. Cacique de Café Solúvel se consolidou como a maior exportadora do produto no país, segundo a Embrapa.

Para 2024, espera-se que o Paraná produza 40 mil toneladas de café, um leve declínio em relação às 41 mil toneladas de 2023. No ano passado, o estado registrou uma produção de 722 mil sacas de café beneficiadas, um aumento de 48,2% em relação à colheita de 2022 , segundo as estimativas são do Departamento de Economia Rural do Paraná (Deral).

Para este ano, a estimativa para a safra paranaense de café varia entre 700 e 750 mil sacas, indicando uma estabilidade em comparação com a temporada anterior, de acordo com o Deral.

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Café no Paraná

Diante do fenômeno, a repercussão econômica foi imediata – o Paraná, que se destacava como um dos principais produtores de café do Brasil, viu sua produção despencar.

Segundo dados da época, a perda estimada nas lavouras chegou a 60%. Isso não apenas afetou os produtores, mas também gerou um efeito dominó que impactou toda a cadeia produtiva, desde a colheita até a comercialização.

Pequenos agricultores, que já enfrentavam dificuldades financeiras, foram os mais afetados. Muitos se viram obrigados a abandonar suas propriedades, e outros enfrentaram a dura realidade de uma economia em crise – agravada pela falta de recursos e apoio do governo.

De acordo com o estudo "A "geada negra" de 1975 em Londrina-PR : de evento climático a lugar de memória", o estado e as cooperativas tentaram intervir, oferecendo crédito e assistência técnica, mas os efeitos da geada foram profundos e prolongados.

Além disso, as consequências sociais foram significativas. Comunidades inteiras que dependiam do cultivo de café enfrentaram um aumento no desemprego e na migração rural – muitos agricultores foram forçados a buscar alternativas de trabalho nas cidades, alterando a dinâmica demográfica da região, mostrou a pesquisa.

Apesar da tragédia que afetou as lavouras de café no Paraná, o setor agrícola do estado conseguiu se reerguer. Com o tempo, os agricultores começaram a diversificar suas plantações**, adotando novas técnicas de cultivo e incorporando variedades de café mais resistentes às condições climáticas adversas.

Embora o Paraná não tenha recuperado seu status de grande produtor de café, essa diversificação permitiu ao estado desenvolver uma agricultura mais robusta e adaptada às mudanças climáticas.

A reestruturação não apenas ajudou a recuperação da produção, mas também trouxe inovações que tornaram o estado um exemplo de superação e adaptação no setor agropecuário. Hoje, além do café, o estado do Paraná é um dos principais produtores de soja e milho do país, ao lado do Mato Grosso e Rio Grande do Sul.

A Geada Negra de 1975 se tornou um marco na história da cafeicultura paranaense, lembrada não apenas pela devastação que causou, mas também pela capacidade de recuperação e inovação que emergiu a partir dela.

O evento serve como um lembrete da fragilidade das práticas agrícolas diante das forças da natureza e da importância de uma gestão sustentável e adaptativa no campo.

Em um momento marcado pelas mudanças climáticas, a memória da geada, ainda presente nas conversas entre agricultores mais velhos, é uma lição constante sobre a força da adversidade e a determinação dos que dependem da terra para viver.

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