EXAME Agro

A executiva que quer descarbonizar o agro — começando pelos fertilizantes

Em entrevista à EXAME, vice-presidente da Yara Fertilizantes para as Américas, fala sobre os desafios e oportunidades do agronegócio brasileiro na jornada de descarbonização

Chrystel Monthean: "Brasil é um país com enorme potencial, mas também enfrenta desafios regulatórios", diz VP da Yara Fertilizantes para as Américas. (Yara Fertilizantes/Divulgação)

Chrystel Monthean: "Brasil é um país com enorme potencial, mas também enfrenta desafios regulatórios", diz VP da Yara Fertilizantes para as Américas. (Yara Fertilizantes/Divulgação)

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 8 de junho de 2025 às 06h02.

A relação de Chrystel Monthean, vice-presidente executiva da Yara Fertilizantes para as Américas, com o Brasil é longa. A executiva conhece de perto o agronegócio brasileiro, tanto por seu trabalho com a empresa norueguesa de insumos quanto por sua atuação em outras frentes no setor, um dos mais importantes da economia nacional.

"O Brasil é um país com enorme potencial, mas também enfrenta desafios regulatórios, principalmente pela falta de uma estrutura clara que guie a agricultura nesse caminho de descarbonização", disse em entrevista à EXAME no escritório da Yara, em São Paulo.

Monthean veio ao Brasil nesta semana para acompanhar a colheita do primeiro lote de café com o fertilizante lower carbon (baixíssimo carbono) da Yara, na Cooxupé, a maior cooperativa de café do mundo, em Minas Gerais. O produto, produzido a partir de uma matriz renovável, reduz em 40% a pegada de carbono das plantações. O acordo entre a Yara e a Cooxupé foi assinado em 2023.

LEIA MAIS: A colheita da maior cooperativa de café do mundo será diferente em 2025 — e a Yara é parte disso

Nesta primeira fase, aproximadamente 30 produtores da cooperativa aplicaram o fertilizante, que é proveniente da planta de Porsgrunn, na Noruega, e foi disponibilizado aos cooperados em novembro do ano passado.

Além da Cooxupé, a Yara anunciou nesta semana uma parceria com a Coocacer, outra cooperativa referência em café de alta qualidade, para o fornecimento do fertilizante lower carbon.

O contrato também inclui a transferência de conhecimento sobre práticas agrícolas, métodos e ferramentas digitais, para aumentar a produtividade da cultura, diminuindo ainda mais a pegada climática envolvida na produção do grão.

Em entrevista, Monthean discute o papel do setor de fertilizantes na descarbonização do agro, os desafios do Brasil neste processo e revela os planos da Yara para o país — e para a América Latina.

Leia a entrevista na íntegra:

Quais são os principais desafios que você vê no Brasil para alcançar os objetivos de descarbonização?

O principal desafio no Brasil é a falta de um marco regulatório claro que incentive a transição para práticas agrícolas mais sustentáveis. Embora o país seja um líder em energia renovável, especialmente na matriz elétrica com 89% de energia renovável, a falta de incentivos para o investimento em tecnologias limpas, como o biometano, é uma barreira. Precisamos de mais infraestrutura e incentivos fiscais para ajudar as empresas a fazer essa transição.

Como a Yara tem trabalhado com cooperativas, como a Cooxupé, para implementar sua estratégia de descarbonização?

A Cooxupé é um exemplo interessante de como conseguimos aplicar nossa estratégia de descarbonização no setor agrícola. A cooperativa tem sido uma parceira-chave, pois, além de ser a maior cooperativa de café do mundo, ela compartilha da nossa visão de tornar a agricultura mais sustentável. Trabalhamos juntos para melhorar a produtividade e a qualidade, incorporando práticas mais eficazes e com menor impacto ambiental. Esse tipo de parceria é essencial para alcançar um futuro mais sustentável.

Você mencionou a importância das parcerias. Como isso se aplica à expansão da Yara para outros países da América Latina, como Argentina, Uruguai e Paraguai?

A parceria com empresas e agricultores é a chave para expandir nossas iniciativas, especialmente na América Latina. No caso da Argentina, trabalhamos com produtores de batata, como o Parque Papas (o maior produtor de batatas do país vizinho) em um projeto que visa reduzir a pegada de carbono na produção. O modelo é similar ao que implementamos com a Cooxupé no Brasil. A ideia é aplicar as mesmas soluções de fertilização de baixo carbono, fundamentais para tornar a produção agrícola mais eficiente e menos poluente.

Quais são os planos da Yara para 2025 em relação à descarbonização e à produção de fertilizantes renováveis?

Estamos muito animados com o projeto de produção de amônia renovável no Brasil, que é um marco para a empresa na América Latina. A amônia renovável é produzida a partir de biometano, uma fonte de energia renovável que poderia transformar nossa produção, tornando-a 100% sustentável. No entanto, o grande desafio ainda é a falta de infraestrutura e incentivos para conectar as fontes de biometano aos nossos processos produtivos. Se conseguirmos resolver essa questão, poderemos avançar significativamente em direção à descarbonização de nossas fábricas e, consequentemente, da cadeia alimentar.

Como você vê o papel do governo brasileiro nesse processo?

O Brasil tem um grande potencial, especialmente na área de energia renovável e biometano. No entanto, o governo precisa dar mais clareza sobre a regulação desses setores, além de fornecer incentivos fiscais e de infraestrutura para as empresas. A Yara já está fazendo sua parte, mas para que o país realmente aproveite seu potencial, é preciso um esforço conjunto entre o setor privado e o governo.

Para encerrar, como a Yara lida com a pressão de tornar a descarbonização viável financeiramente, especialmente em um momento de crise climática como o que estamos vivendo?

A Yara está comprometida com a descarbonização, independentemente das dificuldades financeiras ou políticas. Acreditamos que, mesmo que a situação política seja instável, o compromisso com a sustentabilidade é inegociável. A estratégia de descarbonização está no centro dos nossos valores, e isso não muda, independentemente do cenário. Sabemos que precisamos continuar investindo em novas tecnologias, fortalecer as parcerias com nossos clientes e agricultores e trabalhar para tornar a descarbonização financeiramente viável, para que se torne prática comum e não uma exceção. A sustentabilidade é, e sempre será, um compromisso da Yara. Governos e governantes passam.

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