Tecnologia

Trump deixa Vale do Silício em alerta com visto H-1B de US$ 100 mil

Taxa de US$ 100 mil por visto pode impactar diretamente empresas como Microsoft, Amazon e Infosys

Publicado em 22 de setembro de 2025 às 06h54.

O Vale do Silício entrou em estado de alerta após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinar, na noite de sexta-feira, 20, uma ordem executiva que estabelece uma taxa de US$ 100 mil por vistos H-1B (categoria usada por empresas norte-americanas para contratar profissionais estrangeiros).

A medida, divulgada sem aviso prévio, causou pânico em empresas de tecnologia e no setor financeiro, que dependem desses vistos para manter engenheiros, cientistas de dados e desenvolvedores, entre outros profissionais, em posições-chave. A nova taxa representa uma elevação drástica em relação ao valor anterior, de US$ 215.

Na prática, isso significava que, se uma empresa que quisesse manter 10 funcionários estrangeiros em seu quadro, teria de desembolsar US$ 1 milhão adicional por ano, além dos salários e benefícios. Apesar de a Casa Branca ter recuado no dia seguinte, esclarecendo que a cobrança aconteceria somente no momento da emissão do visto e não recorrente, o estrago nas big e mini techs já estava feito.

No sábado, 20, empresas como Microsoft, Google, Meta, Amazon, Salesforce e JP Morgan enviaram comunicados internos orientando que funcionários com visto H-1B não deixassem o território americano, segundo a Bloomberg. Aqueles que já estavam no exterior foram instruídos a voltar imediatamente aos EUA antes da entrada em vigor da ordem, prevista para o domingo, 22, às 00h01.

Em um voo da Emirates prestes a decolar de San Francisco para a Índia, ao menos 40 passageiros com visto H-1B abandonaram a aeronave ao receberem e-mails de seus empregadores. “Foi um pesadelo”, relatou Zarna Joshi, cidadã americana, ao Business Insider. Segundo ela, uma funcionária da Microsoft inicialmente se recusou a sair, após três anos sem visitar a família, mas mudou de ideia após ler o comunicado da equipe de imigração da empresa.

Ruptura com a elite da tecnologia

A decisão foi particularmente surpreendente porque ocorreu semanas depois de um jantar na Casa Branca entre Trump e os principais CEOs do setor: Satya Nadella (Microsoft), Sundar Pichai (Google), Tim Cook (Apple), Mark Zuckerberg (Meta) e Sam Altman (OpenAI). No encontro, os líderes agradeceram o presidente por apoiar investimentos em solo americano. Mas durou pouco.

Nas horas seguintes ao anúncio da nova taxa, departamentos jurídicos e de recursos humanos correram para esclarecer o impacto da medida, revisar contratos e emitir orientações urgentes aos trabalhadores estrangeiros.

Empresas como Google, Amazon, Salesforce e Zoom alertaram que deixar os EUA poderia resultar em negação de reentrada, mesmo para quem possui visto vigente. Um memorando interno do Google dizia que “partir dos EUA pode causar complicações sob a nova política”.

No caso da Salesforce, o engenheiro Akaash Hazarika cancelou as férias em Toronto e pagou US$ 500 em uma passagem de última hora para voltar a Bellevue, Washington. “Não dormi a noite inteira. Só pensava: e se eu não conseguir voltar?”, contou ele ao Business Insider.

Indústria indiana no centro da tempestade

A medida também representa um ataque direto ao modelo de negócios das grandes prestadoras de serviços de TI da Índia, como Tata Consultancy Services (TCS), Infosys, Wipro e HCL Tech. O país concentra 72,3% dos beneficiários de vistos H-1B, segundo dados dos Serviços de Cidadania e Imigração dos Estados Unidos (USCIS, na sigla em inglês).

Apenas a Infosys contou com mais de 2.500 aprovações em 2024 — o que, sob a nova regra, resultaria em pelo menos US$ 250 milhões em custos extras.

Segundo a Bloomberg, o setor de outsourcing indiano representa um mercado de US$ 280 bilhões e emprega centenas de milhares de profissionais alocados nos EUA, atendendo empresas como Citigroup, Walmart, e Bank of America.

Chander Gurnani, ex-CEO da Tech Mahindra, afirmou à Bloomberg que a medida “não ajuda os EUA, apenas empurra as empresas para fora”. Ele prevê uma aceleração do movimento de realocar operações para países como Índia, México e Canadá.

Startups sob risco de colapso

Se para as big techs a medida é um incômodo caro, para startups e empresas em fase inicial ela pode ser fatal. “US$ 100 mil por visto não é problema para Microsoft, mas pode destruir o orçamento de uma startup”, afirmou Garry Tan, CEO da Y Combinator, em sua conta na rede X (antigo Twitter).

Deedy Das, sócio da Menlo Ventures, disse ao Business Insider que o impacto será maior nas empresas pequenas. “Se a base salarial é de US$ 150 mil a US$ 200 mil, uma taxa extra de US$ 100 mil inviabiliza qualquer contratação.”

Para David Hornik, fundador da Lobby Capital, a regra atinge o coração do ecossistema de inovação. “Se criamos barreiras para contratar os melhores, dificultamos a criação das melhores empresas”, afirmou ao BI. Ele acredita que, diante das dificuldades de imigração, as startups simplesmente abrirão operações no exterior e manterão times distribuídos globalmente.

Pressão judicial e cenário incerto

Para Jason Finkelman, advogado de imigração ouvido pelo Business Insider, a ordem não tem respaldo legal claro e deve ser contestada nos tribunais. “O texto diz que é para proteger empregos americanos, mas isso não basta juridicamente.”

Ele prevê ações judiciais tanto de startups quanto de grandes corporações. Mesmo que a medida seja suspensa, o sinal enviado ao mercado já causou dano: a instabilidade jurídica e o medo de novas restrições podem afastar talentos e impactar a atratividade do ecossistema de tecnologia dos EUA.

A administração Trump justificou a taxa como forma de “corrigir distorções” e combater abusos no sistema. Citou casos em que empresas demitiram milhares de trabalhadores americanos enquanto contratavam estrangeiros com H-1B. A ordem executiva afirma que a nova política visa reservar os vistos “apenas aos melhores dos melhores” — mas o Vale do Silício não concorda.

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