Bocayuva acredita que, se as negociações progredirem até o fim do ano e as taxas forem reduzidas para 15%, o impacto poderá ser absorvido pelas marcas americanas.
Sergio Bocayuva, CEO da Usaflex: "Perdemos a chance de expandir a produção para alguns players internacionais" (Leandro Fonseca/Exame)
Repórter de Negócios
Publicado em 2 de agosto de 2025 às 10h06.
O mercado de calçados vive um momento turbulento. A briga tarifária entre Estados Unidos e China parecia abrir oportunidades para a retomada das exportações brasileiras ao mercado americano. O otimismo, no entanto, não durou muito. Com o agravamento das tensões comerciais entre os EUA e o Brasil, os calçados passaram a ser taxados em 50%. Nem mesmo a vasta lista de isenções foi capaz de poupar os calçados brasileiros.
Sergio Bocayuva, CEO da Usaflex, sempre teve uma postura cautelosa em relação ao avanço das exportações para os Estados Unidos. Em maio, a calçadista gaúcha recebeu consultas para exportação de meio milhão de pares para os Estados Unidos, mas aguardava mais certezas antes de expandir a produção.
Agora, a taxa de 50% sobre produtos brasileiros representa a perda de oportunidades que estavam em negociação. "Perdemos a chance de expandir a produção para alguns players internacionais", disse o executivo. Porém, ele destaca que o impacto é restrito. A Usaflex fatura 525 milhões de reais por ano, dos quais 10% vêm do exterior, com os Estados Unidos sendo 1% do total.
Na visão do executivo, a tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros impacta principalmente as marcas brasileiras que operam no modelo de private label, no qual empresas brasileiras fabricam calçados sem marca própria para serem vendidos sob marcas de outras empresas."No Brasil, existem muitas calçadistas que operam nesse modelo e exportam mais de 60% da produção", diz.
"Se nada for feito, as tarifas podem levar empresas à falência e resultar em demissões em massa em seis meses", diz Sérgio Bocayuva.
O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de calçados, com uma produção anual de cerca de 900 milhões de pares. Após um período de estagnação, as exportações brasileiras de calçados voltaram a apresentar sinais de recuperação nos primeiros meses de 2025. Em junho, a Abicalçados anunciou um crescimento de 24,5% nas exportações de calçados em relação ao mesmo mês do ano anterior.
Nos Estados Unidos, principal destino das exportações brasileiras do setor, o aumento foi ainda mais expressivo, com uma alta de quase 40%. O país recebeu 1 milhão de pares brasileiros, gerando US$ 20,76 milhões — crescimentos de 39,4% em volume e de 25,4% em receita.
No acumulado do semestre, as exportações para os Estados Unidos somaram 5,8 milhões de pares e US$ 111,8 milhões, alta de 13,5% em volume e 7,2% em valor.
Com a imposição da tarifa de 50%, o setor enfrenta agora um cenário de incertezas, que ameaça interromper essa recuperação.
Haroldo Ferreira, presidente-executivo da Abicalçados, destacou que o tarifaço pode inviabilizar as exportações brasileiras de calçados. Ele ressaltou que muitas empresas do setor, que têm uma parte significativa de sua produção voltada para os EUA, enfrentam a dificuldade de tornar seus produtos mais caros do que os concorrentes chineses, que pagam uma tarifa inferior.
"Temos empresas cuja produção é integralmente enviada ao mercado externo, a maior parte para os Estados Unidos. Essas empresas terão produtos muito mais caros do que os importados da China, por exemplo, que pagam uma sobretaxa de 30%. Estamos falando, neste primeiro momento, de uma perda estimada em cerca de 8 mil empregos diretos", diz Ferreira.
Se a tarifa de 50% aos produtos brasileiros for mantida, muitas empresas terão que repensar seus modelos de negócios e estratégias de exportação para manter sua competitividade.
Para mitigar os efeitos, a Abicalçados tem buscado junto ao governo brasileiro medidas paliativas, como a ampliação de programas como o Reintegra e o BEm, além de linhas de crédito para ajudar a cobrir os custos de exportação.