Blockbuster: no auge, locadora chegou a ter 9.000 lojas pelo mundo (Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 4 de agosto de 2025 às 13h19.
Durante anos, ela foi praticamente sinônimo de entretenimento caseiro.
No fim dos anos 1990 e início dos 2000, poucas experiências eram tão comuns quanto passar na Blockbuster em uma sexta-feira à noite, escolher uma comédia, um terror ou o último lançamento em DVD ouVHS, pegar uma pipoca no caixa e curtir um filme em casa.
A marca fazia parte da rotina, da cultura pop e da memória afetiva de milhões de pessoas ao redor do mundo.
Mas o que parecia um império indestrutível desmoronou rapidamente.
De gigante global, com presença em dezenas de países — inclusive no Brasil — a Blockbuster foi reduzida a uma única loja em funcionamento — e hoje sobrevive mais como peça de museu do que como empresa.
Sua história é estudada em escolas de negócios como um dos exemplos mais emblemáticos de empresas que fracassaram por resistir à inovação.
Fundada em 1985 nos Estados Unidos, a Blockbuster cresceu com rapidez e dominou o setor de locadoras ao longo das décadas seguintes. O auge veio nos anos 1990, com 65 milhões de clientes e lojas em cada esquina de grandes cidades.
Mas a partir dos anos 2000, enquanto o mundo migrava para os serviços digitais, a empresa manteve seus pés fincados no passado — e pagou caro por isso.
A derrocada foi rápida e dolorosa. A empresa rejeitou uma proposta de compra da Netflix, não investiu em streaming a tempo, e acumulou dívidas bilionárias até declarar falência em 2010.
A trajetória da Blockbuster, do sucesso absoluto ao colapso total, revela muito sobre os perigos da arrogância corporativa e da incapacidade de adaptação diante de mudanças tecnológicas.
A Blockbuster surgiu em 1985, idealizada por David P. Cook, em Dallas, Texas.
Seu modelo de negócios foi disruptivo desde o início. Enquanto locadoras de bairro ofereciam poucas centenas de títulos, a Blockbuster inaugurou sua primeira unidade com cerca de 8.000 filmes em fita VHS, além de um sistema computadorizado para controlar os estoques e prever a demanda com base em dados de mercado — uma inovação para a época.
A loja também apostava em horário de funcionamento estendido e na padronização da experiência do cliente.
Era um ambiente limpo, bem iluminado, com produtos organizados por gênero e novidades em destaque. Isso a distanciava das locadoras independentes, muitas vezes improvisadas e desorganizadas. O sucesso da primeira unidade foi quase imediato e atraiu a atenção de investidores.
Em 1987, apenas dois anos após a fundação, Cook vendeu a Blockbuster para Wayne Huizenga, um empresário conhecido por transformar negócios locais em redes nacionais.
Huizenga deu início a uma agressiva estratégia de expansão, baseada em franquias e aquisições. Em pouco tempo, a Blockbuster se espalhou pelos Estados Unidos e, no início dos anos 1990, já era a maior rede de locadoras do mundo.
Com Huizenga, a empresa cresceu como uma franquia que oferecia previsibilidade e escala, algo raro no setor de entretenimento da época. Sua ascensão coincidiu com o boom do VHS e da cultura do home video, o que fez dela uma marca familiar em diversos países.
O sucesso atraiu a atenção da gigante de mídia Viacom, que comprou a empresa por US$ 8,4 bilhões em 1994.
Nos anos 1990, a Blockbuster atingiu seu auge. Chegou a operar mais de 9.000 lojas espalhadas por dezenas de países e contava com cerca de 65 milhões de clientes cadastrados.
Era a principal referência em locação de filmes e jogos no mundo, com uma presença massiva também no Brasil — onde se estabeleceu com lojas próprias e depois por meio de parcerias com empresas como a Americanas.
A expansão foi impulsionada também pela transição do VHS para o DVD, que oferecia mais qualidade de imagem e som, além de ser mais compacto. A Blockbuster acompanhou esse movimento e manteve sua liderança. Em alguns mercados, chegou a testar modelos complementares de venda de produtos relacionados, como snacks, bonecos de personagens e até brinquedos licenciados.
Mais do que um negócio, a Blockbuster se consolidou como símbolo cultural. Foi tema de filmes, séries e propagandas de TV, e seu logotipo azul e amarelo virou ícone da cultura pop dos anos 1990 e 2000. Para muitos jovens da época, a ida à locadora era um dos pontos altos do fim de semana. Era onde se descobriam filmes novos, se escolhia pela capa ou pela indicação do atendente.
Durante esse período, parecia que nada poderia ameaçar seu domínio. A empresa investia em campanhas publicitárias, fortalecia o relacionamento com os estúdios de Hollywood e testava modelos como aluguel antecipado de lançamentos. Mas, por trás dessa fachada de sucesso, os primeiros sinais de risco já estavam no horizonte — e a Blockbuster não soube (ou não quis) enxergar.
Em 2000, a Blockbuster teve a chance de comprar uma pequena empresa chamada Netflix por US$ 50 milhões.
À época, a Netflix ainda operava no modelo de aluguel de DVDs via correio e parecia inofensiva. Os executivos da Blockbuster riram da proposta — literalmente. Achavam que a líder do setor não tinha nada a temer de uma empresa tão pequena e de um modelo tão “complicado”.
O problema é que a Netflix soube evoluir. Após conquistar uma base fiel com entregas pelo correio e planos mensais sem taxas de atraso, a empresa deu um salto com o streaming, que eliminava a necessidade de mídias físicas. Enquanto isso, a Blockbuster resistia às mudanças, mantinha seu modelo baseado em lojas e insistia nas famigeradas taxas por devolução fora do prazo.
A demora para reagir ao digital foi fatal. Quando a Blockbuster tentou lançar sua própria plataforma de aluguel online, o mercado já havia migrado. Em 2004, ela finalmente eliminou as multas por atraso nos EUA — mas era tarde demais. A base de clientes estava em declínio, os hábitos de consumo mudavam rápido e a empresa continuava presa a um modelo físico e engessado.
Em setembro de 2010, sem conseguir pagar suas dívidas, a Blockbuster entrou com pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos. A dívida ultrapassava 900 milhões de dólares. O colapso parecia inevitável. Um ano depois, os ativos da empresa foram vendidos para a operadora de TV a cabo Dish Network por US$ 320 milhões, em uma tentativa de revitalização da marca.
A Dish até tentou manter algumas lojas funcionando e relançar o serviço de aluguel sob um novo modelo, mas os esforços foram em vão. O estrago já estava feito. Em 2013, a nova controladora anunciou o fechamento das unidades remanescentes e o encerramento das atividades da marca como rede comercial. Em 2014, praticamente todas as lojas foram fechadas.
Hoje, só uma unidade sobrevive — em Bend, no estado do Oregon. A loja, que virou documentário da Netflix (The Last Blockbuster), funciona como ponto turístico e nostalgia pura. Mantida por uma administradora local, virou museu vivo dos anos 1990, vendendo camisetas, souvenirs e, sim, ainda alugando filmes.