Murilo Specchio, da Honest Market Brazil: 5.000 unidades até 2030 e 1 bilhão de reais de receita anual (Honest Market/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 25 de setembro de 2025 às 11h50.
Última atualização em 25 de setembro de 2025 às 14h59.
A expressão "varejo de proximidade" nunca fez tanto sentido quanto para os minimercados autônomos.
Instalados dentro de condomínios residenciais, esses pontos de venda dispensam caixa, funcionário e até portaria. O cliente desce o elevador, pega o que quer e paga pelo celular. Simples assim — sem sair de casa.
A tendência, que ganhou tração na pandemia, agora se adapta a uma nova fase do consumo, com a volta aos escritórios e a retomada da rotina fora de casa.
E é justamente nesse setor que o paulista Murilo Specchio resolveu apostar, bem antes do boom pandêmico.
Ex-executivo de grandes empresas, ele enxergou na tecnologia e no modelo de autoatendimento uma forma de escalar conveniência — e receita.
Fundada em 2019, a Honest Market Brasil nasceu como uma rede de mercadinhos autônomos 100% franqueada.
Hoje, são mais de 570 unidades, em 80 cidades e mais de 20 estados.
A rede deve fechar 2025 com 100 milhões de reais em faturamento, crescimento de 40% em relação ao ano anterior.
E já projeta um salto bem maior: 5.000 unidades até 2030 e 1 bilhão de reais de receita anual.
“A gente está só arranhando a superfície. Nem 2% do mercado foi explorado”, afirma Murilo.
A meta agora é dobrar de tamanho em 2026, com expansão em três frentes: abertura de novas lojas, aumento de vendas nas unidades atuais e aquisição de concorrentes menores.
“Tem muita loja largada, gente que tentou operar sozinho e não conseguiu. A consolidação é inevitável — e queremos liderar esse movimento.”
Antes de virar franqueador, Murilo teve uma carreira longa no mundo corporativo.
Trabalhou em empresas como Nextel, Telefônica e GVT, sempre em áreas de negócios.
Atuou com vendas, marketing, canais e até M&A, fusões e aquisições. Mas sempre com uma pulga atrás da orelha: empreender.
“Nunca tive referência de empreendedorismo na família, mas desde o início da faculdade já sabia que queria criar algo meu. Via o executivo trabalhando para alguém e queria ser esse ‘alguém’”, afirma.
Ainda como CLT, tentou pequenos negócios paralelos. Montou uma marca de biquínis, revendeu produtos, testou algumas ideias.
Foi em uma viagem para a Austrália, em 2013, que viu de perto o que se tornaria a base do seu negócio atual.
“Lá já tinham soluções de self-checkout funcionando em supermercados e lojas de moda. Aquilo ficou na minha cabeça.”
Em 2017, já de volta ao Brasil, criou a Natural Box, uma indústria de alimentos saudáveis com modelo de distribuição por meio de freezers e geladeiras instalados em empresas e academias.
Mas o modelo tinha limitações. A margem era apertada e o crescimento lento. Em 2019, Murilo vendeu a operação e tirou do papel a Honest Market.
A ideia era simples: manter a conveniência, ampliar o mix e apostar na escalabilidade com franquias.
Desde o começo, a rede foi 100% franqueada — sem lojas próprias. “A gente acredita que não deve concorrer com o franqueado. Ele é nosso parceiro, não nosso competidor.”
Hoje, a Honest está presente em mais de 20 estados e segue crescendo. Mas o modelo ainda carrega um traço da origem de Murilo. “Nosso foco é conveniência com eficiência. Menos estrutura, mais dados, mais inteligência na ponta.”
Um dos diferenciais da Honest está no formato de expansão.
Em vez de cobrar por unidade, a franqueadora adota uma taxa única de 35.000 reais — que dá direito a abrir quantas lojas o franqueado quiser.
“É uma forma de atrair gente com visão de escala. E tem funcionado: hoje, metade da nossa base já é formada por multifranqueados.”
Além do modelo acessível, a rede oferece um suporte robusto: escolha de ponto, implantação, operação e consultoria.
“Não estamos interessados em vender franquia por vender. Nosso foco é performance. Menos franqueados, mais lojas por cabeça. Isso é o que garante resultado”, diz.
Outro ponto incomum: a Honest não lucra na revenda de produtos.
Em vez de montar uma estrutura de distribuição e faturar em cima dos franqueados, a empresa intermedeia acordos com indústrias como BRF, Coca-Cola e Red Bull — e o franqueado compra direto. “No varejo, você ganha comprando bem e vendendo melhor. Então a gente foca em garantir a melhor condição para eles.”
Um gargalo clássico desse modelo — o risco de quebra, ou seja, o consumidor pegar o produto e não pagar — hoje é tratado com tecnologia e processo.
“Dois anos atrás, isso era a principal objeção. Hoje, nem aparece mais. O mercado está mais educado. E a gente tem câmera, IA e até o síndico como aliado.”
A perda média por loja é de 2,5% do faturamento — incluindo furtos, validade vencida e quebra de embalagem. “É desperdício, toda operação tem. A diferença é que aqui é medido, controlado e compensado. Se houver perda acima do previsto, a gente desconta no valor repassado ao condomínio pela energia elétrica.”
Hoje, o Brasil tem cerca de 20.000 minimercados autônomos em operação. Parece muito — mas é só o começo.
Segundo Murilo, o potencial total passa de 1 milhão de pontos, somando condomínios, academias e empresas com mais de 200 funcionários.
“A gente está falando de 1,8% de penetração. É uma fatia muito pequena. Tem muito espaço.”
Com a pandemia, o setor explodiu — mas de forma desorganizada. Muita gente criou negócios informais, sem suporte ou estrutura, apenas colocando um freezer no prédio.
“Tinha muito operador que foi desligado, pegou o acerto e investiu nisso sem preparo. E aí abandonou, não repôs, deixou o produto vencer.”
A Honest passou a ocupar justamente esses espaços. Em 2024, 25% das novas lojas foram abertas em pontos onde já havia uma operação anterior falida.
Hoje, 80% das lojas da rede ainda estão em condomínios residenciais. Mas esse perfil está mudando. Nos últimos meses, 35% das novas unidades abertas foram em ambientes corporativos.
“Esse é o futuro. Nos Estados Unidos, 95% dos minimercados autônomos estão em empresas, universidades, hospitais. E o Brasil vai seguir esse caminho.”
Além de mais estabilidade, o corporativo também oferece menor risco de quebra.
“Se um funcionário pega um produto e não paga, ele pode ser demitido. O controle é maior. E a compra é recorrente. O mercadinho passa a ser parte da rotina do trabalho.”
Com 570 lojas ativas e previsão de fechar o ano com 630, a Honest Market se prepara para um novo salto.
A meta para 2026 é dobrar de tamanho — tanto em unidades quanto em faturamento. Para isso, aposta em três frentes de crescimento: novas lojas, aumento de vendas nas lojas existentes e aquisições.
“O crescimento orgânico está forte. Mas também estamos olhando oportunidades de fusão. Tem rede com 50, 60 lojas que não conseguiu escalar. A gente entra com suporte, tecnologia e gestão”, diz Murilo. A empresa já conta com assessoria de M&A para mapear e estruturar essas aquisições.
Do total de crescimento esperado para 2025 — de 60 para 100 milhões de reais — cerca de 30 milhões virão de novas lojas e 10 milhões das lojas já existentes. “Investimos muito em consultoria para os franqueados aumentarem o tíquete médio. Lançamos campanhas, combos e até telas digitais com anúncios que mudam por horário.”
Outro pilar da expansão está no canal B2B. Em agosto, a Honest participou do ConarH, maior evento de RH da América Latina, para captar leads corporativos. “Saímos de lá com 250 empresas interessadas. São clientes em potencial para nossos franqueados atenderem.”
A meta final, o chamado “1B2030”, está clara: 5.000 lojas e 1 bilhão de reais em faturamento anual até o fim da década.
“Já existem três redes de conveniência entre as 10 maiores franquias do Brasil: BR Mania, Shell Select e AMPM. A gente está construindo a quarta — só que sem loja, sem caixa, sem vendedor.”