Simone de Azevedo, sócia e CEO da Mobensani: “Diversidade não é discurso, é resultado. Nosso objetivo é abrir caminhos para mais mulheres se tornarem protagonistas do futuro industrial.”
Jornalista especializada em carreira, RH e negócios
Publicado em 5 de novembro de 2025 às 11h00.
Quando a paulistana Simone de Azevedo começou a trabalhar na empresa da família, em 1989, não imaginava que aquele seria o primeiro passo de uma jornada de 35 anos na indústria automotiva. Ela tinha acabado de concluir o magistério, cursava turismo e sonhava em abrir uma agência de viagens – ou talvez um buffet infantil e uma confecção de biquínis. O plano era apenas cobrir temporariamente o faturista que estava de férias, já que também havia tirado alguns dias. Mas, ao vivenciar o dia a dia, principalmente no chão de fábrica, com o som das máquinas e a transformação da matéria-prima em produto final, decidiu ficar. “Enxerguei a complexidade do antes e depois do processo – planejar, organizar, vender, divulgar e entregar valor –, o que despertou em mim a vontade de permanecer.”
Hoje, como sócia e CEO da Mobensani, comanda uma operação que produz 25 milhões de peças por ano e mantém um dos portfólios mais completos de componentes metal-borracha do mercado nacional. Sob sua liderança, a companhia registrou crescimento acumulado de 944% nos últimos dez anos, com alta de 25% em 2024 e projeção em torno de 23% para 2025. Os números impressionam em um setor que, segundo o Sindipeças, cresceu 13,3% em faturamento nominal no ano passado. Para 2029, está aprovada a construção de um centro logístico totalmente automatizado em um terreno de 15 mil m², anexo à fábrica, que ampliará a eficiência e reforçará a competitividade. Além da gestão financeira, ela lidera uma transformação cultural em um ambiente historicamente masculino.
A mudança de carreira não veio acompanhada de dúvidas. Simone conta que ficou encantada ao observar toda a produção e mesmo em uma operação relativamente pequena, com cerca de 20 colaboradores, percebeu espaço de crescimento e desenvolvimento. O magistério, que poderia deixá-la deslocada no ambiente industrial, se tornou um diferencial na liderança. “Treinar e desenvolver equipes exige a mesma sensibilidade e paciência de quem ensina crianças em seus primeiros aprendizados”, afirma.
Somado a isso, a habilidade de resolver imprevistos e dificuldades, e de atuar em contextos desafiadores para solução de problemas e identificação de oportunidades, ajudou no avanço. Ela começou com a emissão de notas, ainda na máquina de escrever, e rapidamente buscou entender pedidos, ampliar linhas de produtos e mapear tendências. Quando entrou no empreendimento, a linha automotiva era modesta, com apenas 20 itens, enquanto 80% do faturamento vinha de bombas vibratórias para poços artesianos. Logo viu que o segmento automotivo tinha um potencial maior.
Em 2010, veio a transição societária. O sócio inicial saiu e a empresária, junto à irmã Suzane, assumiu o comando ao lado do pai Amir. A partir dali, passou a exercer oficialmente a direção estratégica e comercial, consolidando-se como CEO.
O avanço da Mobensani nos últimos anos é resultado de uma estratégia deliberada: investir pesado em tecnologia, profissionalizar a gestão e focar nas pessoas. Apenas entre 2024 e 2025, foram R$ 48 milhões aplicados em inovação, incluindo simuladores de vibração, scanners digitais e sistemas de engenharia de precisão que elevam a qualidade dos produtos. Mas a executiva ressalta que o crescimento só foi possível graças à determinação e ao engajamento do time.
Já a implementação de governança corporativa, compliance, sistemas como o SAP e organograma estruturado, preparou a companhia para crescer de forma sustentável. Outro pilar fundamental foi o investimento na própria formação: cursos de branding na ESPM e especializações em autoconhecimento e neurociência reforçaram sua visão de liderança e desenvolvimento humano.
Por outro lado, a valorização da diversidade de gênero é um dos eixos centrais da gestão da empresária, que também é cofundadora da Associação das Mulheres do Mercado Automotivo (AMMA), ao lado de Carla Nórcia e Talita Peres. Hoje, 27% da força de trabalho da Mobensani é feminina, número expressivo em um setor no qual as mulheres representam só 6% da alta liderança. Para ela, a reindustrialização brasileira só será completa com diversidade. Nas operações de máquinas, a presença feminina resultou em um índice menor de manutenção e refugo, além de maior produtividade à companhia. “Diversidade não é discurso, é resultado. Nosso objetivo é abrir caminhos para mais mulheres se tornarem protagonistas do futuro industrial.”
Ao longo do caminho, no entanto, precisou driblar desafios. Ao assumir a liderança, teve de equilibrar tradição e modernização, além de enfrentar um obstáculo pessoal: deixar de ser vista apenas como “a filha do dono” para conduzir a profissionalização da companhia. O processo foi construído em conjunto com a irmã e o pai, em um modelo de decisões compartilhadas. De acordo com ela, modernizar não significa apagar o legado, mas construir a partir dele. A gestão tem como alicerces cultura organizacional, proximidade com as operações e planejamento estratégico. Frases como “Quem antecipa governa” e “Tem poder quem age” marcam o DNA do negócio.
A história de Simone mostra que liderar não é apenas gerenciar números, mas construir cultura, investir em pessoas e ter coragem para transformar. Em um setor que ainda busca equidade, prova que diversidade, inovação e legado podem – e devem – caminhar juntos.