Sônia Ramos, fundadora da Casa de Bolos: “Eu encontrei no bolo caseiro meu verdadeiro propósito – e ele transformou a minha vida e a da minha família” (Tabata Barbosa)
Jornalista especializada em carreira, RH e negócios
Publicado em 17 de junho de 2025 às 10h31.
Em 2009, aos 64 anos, fase em que muitas pessoas pensam em desacelerar, Sônia Ramos – mais conhecida como vó Sônia – decidiu iniciar uma nova jornada profissional para ajudar nas despesas da casa. Já aposentada, viu a necessidade bater à porta após a demissão do filho caçula, justamente num período em que o país ainda sentia os reflexos da crise financeira do ano anterior. “Foi um baque. Meus filhos e eu nos reunimos à mesa para um café da tarde, um hábito de família, e pensamos na possibilidade de comercializar os bolos que eu fazia para complementar a renda. Foi uma ideia simples, mas movida pelo amor”, conta.
No ano seguinte, alugaram um espaço comercial no centro de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, e inauguraram a primeira loja. Quinze anos depois, a ideia singela e impulsionada pela necessidade se transformou na maior franquia de bolos do Brasil: a Casa de Bolos. Atualmente, a rede conta com mais de 600 lojas espalhadas por 250 cidades em 20 estados, além de uma operação internacional em Lisboa (Portugal). Apenas nos primeiros cinco meses do ano, 25 unidades foram inauguradas pelo Brasil. A perspectiva é alcançar um faturamento de R$ 650 milhões em 2025, ante os R$ 580 milhões registrados em 2024.
O caminho até aqui foi guiado por união familiar, simplicidade e muito trabalho, sempre com os pés no chão. “Eu fazia os bolos e atendia os clientes, enquanto Rafael, o caçula, saía pelo bairro divulgando a loja”, lembra Sônia. As receitas, as mesmas que ela costumava preparar para familiares e amigos – simples, caseiras e cheias de afeto – logo conquistaram o paladar dos primeiros clientes, que foram se multiplicando ao longo dos meses.
No primeiro ano, mais quatro unidades foram abertas na região. Diante da rápida aceitação, os outros três filhos – Daniel, Eduardo e Fabrício – também passaram a integrar o negócio. Em 2011, a família decidiu apostar no modelo de franquias.
O crescimento foi sustentado por uma proposta clara: oferecer um produto artesanal, acessível e com sabor de casa de vó. “Quando se trabalha com um único produto, ele precisa ser o melhor”, afirma a empreendedora. Os bolos não levam massa pronta, ovo em pó, conservantes ou corantes. São feitos com frutas frescas e cuidado em cada detalhe. Atualmente, a produção diária ultrapassa 55 mil bolos, que chegam a mais de 1 milhão de clientes por mês.
Transformar um negócio familiar em uma rede com presença nacional sem perder a essência foi um dos grandes desafios. “Alguns duvidaram do potencial do bolo caseiro e da possibilidade de produção em larga escala”, conta Sônia De acordo com ela, era preciso manter o sabor e o carinho de vó, mesmo com o crescimento.
A parte burocrática também exigiu esforço. “Fomos vencendo etapa por etapa, com muita persistência”, diz. Apesar de nunca ter feito cursos formais de gestão ou finanças, ela sempre teve espírito empreendedor. Ao longo do tempo, já teve um açougue, uma estamparia e até uma confecção de roupas esportivas, além de preparar bolos para casamentos e aniversários. Mas faz questão de destacar que sua verdadeira escola foi a vida “Fui aprendendo no dia a dia, escutando muito, observando, errando e acertando.”
O apoio dos filhos foi decisivo. Com especializações diferentes, cada um contribuiu à sua maneira para profissionalizar o negócio. Ao lado deles, encontrou o equilíbrio entre a tradição familiar e a gestão estruturada.
Para acompanhar a expansão e dar suporte estratégico aos franqueados, a Casa de Bolos investiu na construção de uma nova sede administrativa em Ribeirão Preto, inaugurada no final de 2024. O espaço tem 1.600 m², distribuídos em cinco andares, e abriga o centro de treinamento da rede, além da 11ª loja no município.
Outro passo importante foi o início da internacionalização da marca, com a inauguração da primeira operação no exterior, em Lisboa (Portugal), em outubro do ano passado. O plano, agora, é seguir com a expansão, tendo como base a experiência adquirida na cidade portuguesa, para chegar a outros países da Europa. A expansão será gradual, respeitando as preferências locais, sem abrir mão da tradição dos bolos caseiros brasileiros.
Sônia acredita que a maturidade é uma aliada nos negócios. Aos 79 anos, segue ativa na operação – participa da criação de receitas, testa os produtos e faz questão de manter contato com os funcionários. “O segredo está em fazer o que se ama. Isso me dá energia”, afirma. Ela reconhece que mulheres em cargos de liderança ainda enfrentam olhares desconfiados, especialmente após os 60, mas isso não a abala. Segundo a empreséria, um bom gestor reúne características que independem do sexo. “O que talvez a mulher tenha de diferente seja o ‘sexto sentido’ mais aflorado. Somos mais atentas aos detalhes e reconhecemos com facilidade expressões de alegria ou tristeza. Para quem lida com o público, isso faz toda a diferença.”
A trajetória da vó Sônia mostra que nunca é tarde para começar. Como conselho para as mulheres com mais de 60 que desejam empreender, ela é direta: “Sonhe, tenha fé e propósito. Com esses ingredientes, nada é capaz de impedir a realização dos seus objetivos. Eu encontrei no bolo caseiro meu verdadeiro propósito – e ele transformou a minha vida e a da minha família.”