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Nova legislação e penas mais severas: o que outros países fizeram após intoxicação por metanol

Países como Rússia e Índia já registraram dezenas de mortes por intoxicação por metanol

O metanol é produzido naturalmente durante a fermentação de alguns carboidratos, porém apenas se torna um risco em concentrações mais altas, que podem ser atingidas por meio da destilação feita de forma inadequada (invizbk/Getty Images)

O metanol é produzido naturalmente durante a fermentação de alguns carboidratos, porém apenas se torna um risco em concentrações mais altas, que podem ser atingidas por meio da destilação feita de forma inadequada (invizbk/Getty Images)

Publicado em 3 de outubro de 2025 às 14h20.

Última atualização em 3 de outubro de 2025 às 17h50.

O Brasil vive uma escalada de casos de intoxicação por metanol. Segundo o Centro Nacional de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (CIEVS), já são 59 notificações: 53 em São Paulo — 11 confirmados e 42 em investigação —, cinco em Pernambuco e uma no Distrito Federal. Há ainda uma morte confirmada e outros sete óbitos sob investigação.

Além disso, uma morte em Feira de Santana (BA) está sob análise das autoridades de saúde municipal e estadual. O homem de 56 anos morreu na madrugada desta sexta-feira, 3, após ser atendido na UPA da Queimadinha. Em nota, o governo baiano informou que o caso será monitorado por equipes de vigilância locais e estaduais, com apoio da segurança pública.

Casos semelhantes já foram registrados em países como Rússia, Índia e Laos, que enfrentaram surtos fatais de intoxicação por metanol nos últimos anos. Nessas nações, governos adotaram medidas regulatórias e de fiscalização para tentar conter o problema — experiências que podem servir de referência para o Brasil neste momento de crise.

Rússia aprova nova legislação

A Rússia teve um caso emblemático em 2016, quando pelo menos 60 pessoas morreram após consumir um óleo de banho adulterado com metanol na região de Irkutsk, na Sibéria. O episódio gerou grande repercussão, levou à abertura de investigações criminais e resultou em prisões de comerciantes acusados de vender o produto de forma irregular. O governo foi pressionado a revisar suas normas de fiscalização do mercado de bebidas e derivados.

O doutor Knut Hovda, especialista em intoxicação por metanol, é professor do hospital Universitário de Oslo e consultor de Médicos Sem Fronteiras. Ele explica que os surtos se apresentam de formas diferentes a depender do contexto local. No caso russo, ele explica que "lugares que já têm um consumo de álcool muito alto também podem haver numerosos surtos de metanol, mas acompanhados de um alto número de fatalidades por álcool regular."

Em maio de 2025, o presidente sancionou uma lei que transfere ao Executivo a responsabilidade de regulamentar o comércio de metanol e líquidos que contenham a substância. A nova legislação cria um registro oficial de empresas e empresários autorizados a comercializar metanol e derivados, com regras de fiscalização e acesso público às informações. O objetivo é reforçar a rastreabilidade e coibir a venda irregular.

Mesmo com o avanço regulatório, o problema voltou a se repetir. Em setembro de 2025, ao menos 25 pessoas morreram na região de Leningrado após ingerirem álcool adulterado com altos níveis de metanol, segundo a AFP. As mortes foram registradas entre os dias 10 e 17 no distrito de Volosovsky. Até agora, três suspeitos foram detidos e aguardam julgamento, em mais uma tentativa das autoridades de conter o avanço do mercado ilegal.

Índia aumentou fiscalização

A Índia enfrenta surtos recorrentes de intoxicação por metanol. Em junho de 2024, no distrito de Kallakurichi, em Tamil Nadu, no sul do país, pelo menos 56 pessoas morreram após ingerirem álcool adulterado.

"Países como a Índia são enormes, com realidades muito diversas, onde as diferenças entre as regiões são como as entre países. Alguns locais são mais capacitados no tratamento (eles também têm muitos toxicologistas). Apesar de alguns produtores de fomepizol na Índia, o antídoto raramente está disponível para os pacientes internados", diz Hovda.

A tragédia levou o governo estadual a suspender o administrador distrital e o chefe de polícia da região, além de abrir investigações formais. Mais de 200 litros da bebida foram apreendidos, e ao menos sete suspeitos foram presos.

Casos semelhantes já haviam ocorrido em Uttar Pradesh e Uttarakhand, no norte da Índia, em 2019, quando pelo menos 99 pessoas perderam a vida. Na ocasião, as autoridades iniciaram uma operação estadual que resultou em mais de 3.000 prisões, numa tentativa de desmantelar a rede de produção e distribuição clandestina.

Em Punjab, também no norte do país, em 2020, outra onda de mortes provocou mais de 20 prisões e investigações criminais contra fornecedores ilegais.

Além da repressão imediata, houve mudanças legais em alguns estados. Em Gujarat, no noroeste da Índia, após uma tragédia em 2009 que deixou mais de 100 mortos, a assembleia estadual aprovou uma emenda à lei de proibição do álcool prevendo pena de morte ou prisão perpétua para casos em que a fabricação ou venda de bebidas adulteradas resultem em mortes.

Laos fechou fábricas

Em novembro de 2024, pelo menos seis turistas estrangeiros morreram na cidade de Vang Vieng, em Laos, após um possível caso de envenenamento por metanol em bebidas alcoólicas. Entre as vítimas estavam duas jovens da Austrália, duas da Dinamarca, um britânico e um americano.

O episódio levou países como Austrália, Reino Unido e Nova Zelândia a emitirem alertas para viajantes sobre os riscos do consumo de álcool adulterado no país.

No Laos, diz Hovda, "a situação é similar a outros países e regiões com recursos muito limitados e conhecimento precário sobre surtos de envenenamento. Com o incidente de novembro passado, o problema se tornou muito mais aparente para eles também, mas suas capacidades diagnósticas, disponibilidade de tratamento e conhecimento ainda são escassos."

Após o caso, o governo do Laos anunciou medidas emergenciais. O Departamento de Alimentos e Drogas do Ministério da Saúde proibiu a venda e o consumo das marcas Tiger Vodka e Tiger Whisky, identificadas como ligadas às intoxicações, e ordenou o fechamento da fábrica responsável até que os processos fossem regularizados.

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