Lula, presidente brasileiro: "O multilateralismo está diante de nova encruzilhada" (Ricardo Stuckert / PR)
Editora ESG
Publicado em 23 de setembro de 2025 às 11h05.
Última atualização em 23 de setembro de 2025 às 11h31.
*Nova York
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu nesta terça-feira, 23, o debate geral da 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, com um discurso marcado pela defesa firme da soberania nacional e uma menção indireta à condenação recente do ex-presidente Jair Bolsonaro, situação que gerou sanções do governo dos Estados Unidos ao Brasil.
Por tradição, cabe ao Brasil fazer o primeiro pronunciamento no encontro anual dos líderes mundiais na sede da ONU.
Logo no início de sua fala, Lula alertou para as ameaças aos ideais que inspiraram a criação das Nações Unidas. "Este deveria ser um momento de celebração. Hoje, contudo, os ideais que inspiraram sua criação estão ameaçados como nunca estiveram em sua história", declarou o brasileiro.
O presidente também criticou o que classificou como "desordem internacional" e apontou problemas como "atentados à soberania, sanções arbitrárias e intervenções unilaterais" como fatores que colocam em xeque a autoridade da organização internacional.
Em um dos trechos mais contundentes de sua fala, Lula atacou o que chamou de "falsos patriotas". "Brasil optou por resistir e defender sua democracia reconquistada depois de décadas de governo ditatorial", afirmou.
Lula foi ainda mais direto ao criticar aqueles que, segundo ele, "arquitetam e promovem publicamente ações contra o Brasil", em uma referência que pode ser interpretada como um recado ao presidente americano Donald Trump e aos apoiadores do ex-presidente Bolsonaro.
"Há poucos dias e pela primeira vez em 525 anos, um ex-chefe de Estado foi condenado, julgado e responsabilizado em um processo minucioso e com direito de defesa - prerrogativa que ditaduras negam às vítimas", declarou, em alusão às decisões judiciais contra Bolsonaro.
Em seguida, reafirmou a posição brasileira - e as mensagens que têm repetido em discursos oficiais: "Nossa democracia e nossa soberania são inegociáveis. Seguiremos como nação independente e livre", disse Lula, sendo ovacionado pelos presentes à plenária.
Em um dos principais anúncios do discurso, Lula revelou que o Brasil voltou a sair do Mapa da Fome em 2025. "Foi com orgulho que recebemos da FAO a confirmação de que o Brasil voltou a sair do Mapa da Fome neste ano de 2025", declarou o presidente.
Lula contrastou a situação brasileira com o cenário mundial, onde "ainda há 670 milhões de pessoas famintas" e "cerca de 2,3 bilhões enfrentam insegurança alimentar". O presidente defendeu que "a única guerra de que todos podem sair vencedores é a que travamos contra a fome e a pobreza".
O presidente também destacou a aprovação de legislação para regular plataformas digitais no Brasil. "Com orgulho, promulguei na última semana uma das leis mais avançadas do mundo para a proteção de crianças e adolescentes na esfera digital", afirmou.
Lula defendeu que "a internet não pode ser uma 'terra sem lei'" e que "regular não é restringir a liberdade de expressão", mas sim garantir que crimes digitais sejam tratados adequadamente.
Em um dos trechos mais duros do discurso, Lula condenou veementemente a situação em Gaza. "Nada, absolutamente nada, justifica o genocídio em curso em Gaza", declarou, classificando a situação como "massacre" que conta com "a cumplicidade dos que poderiam evitá-lo".
O presidente brasileiro defendeu a criação de um Estado palestino independente e lamentou que o presidente palestino Mahmoud Abbas tenha sido impedido de ocupar a bancada da Palestina durante a assembleia.
Lula destacou que a COP30, que será realizada em Belém, "será a COP da verdade" e anunciou que o Brasil se comprometeu a reduzir entre 59% e 67% de suas emissões de gases do efeito estufa.
O presidente revelou ainda a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, que pretende remunerar países que mantêm suas florestas preservadas, e informou que o Brasil já reduziu pela metade o desmatamento na Amazônia nos últimos dois anos.
Encerrando seu discurso, Lula defendeu uma reforma abrangente da ONU, incluindo a ampliação do Conselho de Segurança e a criação de um Conselho vinculado à Assembleia Geral para monitorar compromissos climáticos.
"O século 21 será cada vez mais multipolar. Para se manter pacífico, não pode deixar de ser multilateral", concluiu o presidente brasileiro.