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'Imaturo' x 'traidora': Troca de farpas entre Milei e sua vice expõe crise no governo da Argentina

Tudo começou quando a Casa Rosada tentou impedir Victoria Villarruel de validar uma sessão no Senado sobre aumento das pensões

Javier Milei e a vice-presidente Victoria Villarruel durante a cerimônia de posse (ALEJANDRO PAGNI/AFP)

Javier Milei e a vice-presidente Victoria Villarruel durante a cerimônia de posse (ALEJANDRO PAGNI/AFP)

Agência o Globo
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Publicado em 14 de julho de 2025 às 15h30.

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Como de costume, o presidente da Argentina, Javier Milei, usou as redes sociais para atacar seus críticos. Mas, neste caso, o alvo foi a vice-presidente Victoria Villarruel, com quem teve uma discussão acalorada nos últimos dias, após acusá-la de "traidora" por presidir a sessão em que foram debatidos o aumento das pensões e a lei de emergência para pessoas com deficiência.

A raiva do presidente foi desencadeada por uma pesada derrota no Congresso na quinta-feira, quando o Senado aprovou moções visando aumentar as pensões e aumentar os benefícios por invalidez — às quais Milei se opôs veementemente.

Com a escalada do conflito interno no governo argentino, Milei compartilhou uma série de postagens de outros usuários que criticavam a vice-presidente e a acusavam de não entender de economia, de ser " populista " e de estar alinhada ao kirchnerismo. Pessoas próximas ao presidente simplesmente disseram: "É ótimo que ele esteja tirando a máscara para que todos possam ver o que estamos vendo há algum tempo."

Uma das primeiras mensagens que Milei deixou em seu perfil na rede social X foi a do cineasta e diretor de Produções Audiovisuais da Presidência, Santiago Oría, que acusou Villarruel de falar sem ter conhecimento real sobre o assunto. “Além de ser uma traidora, uma demagoga e uma bruta em termos econômicos", escreveu ele.

Outra postagem, do usuário @PanAmPost, era um vídeo analisando o " novo erro de cálculo da populista Victoria Villarruel". Trata-se de uma alusão às ações da vice-presidente na última quinta-feira, quando ela autorizou a sessão que, em última instância, aprovou leis que não tiveram o apoio da Casa Rosada.

Naquele momento, diante das críticas do gabinete e do próprio presidente, Villarruel respondeu: "Um aposentado não pode esperar, e uma pessoa com deficiência, menos ainda. Que economize em viagens e no SIDE, e pronto ." Ela também afirmou que os projetos de lei já haviam sido aprovados pela Câmara dos Deputados. "Não sei por que são tão duros comigo e não com os responsáveis", disse.

O jornal La Derecha Diario, filiado ao governo Mileísta, publicou uma nota que dizia: “A vice-presidente traidora Victoria Villarruel confirmou que não suspendeu a sessão ilegal do Senado porque apoia as leis golpistas kirchneristas que estão destruindo o superávit fiscal”.

A última publicação da série compartilhada por Milei foi do economista e diretor-geral da Fundação Liberdade e Progresso, Agustín Etchebarne, que concordou com a "traição" de Villarruel, mas considerou que a governante também "adota o pior populismo: promete dinheiro que não há e ataca o equilíbrio fiscal".

O que diz a vice-presidente

Inspiradas pelo insulto do presidente, as redes sociais ecoaram o sentimento e atacaram Villarruel. Chamaram-na de "estúpida" e enviaram mensagens de ódio contra ela. No último sábado, ela respondeu.

"Um presidente que nem consegue cumprimentar uma pessoa com quem chegou ao poder? Eu nunca perco a educação", escreveu ela no Instagram. Em outro momento, acrescentou: "Quando o presidente decidir se comportar como um adulto, poderei saber quais são suas políticas, já que ele não fala comigo."

Após as múltiplas acusações contra ela, a vice-presidente se definiu como "nacionalista" e negou qualquer vínculo com o kirchnerismo. "Se você tiver alguma acusação legal, eu aguardo. Mas se você for falar bobagem, é melhor ficar quieta", disse ela a um usuário que a vinculou à oposição.

Com as mensagens que publicou no Instagram na manhã do último sábado, Villarruel rompeu com a formalidade e o sorriso que sempre esconde por trás e revelou o que realmente pensa e sente sobre Javier Milei. A vice-presidente, como nunca antes, rompeu com a Casa Rosada e criticou a direção do governo, sem sutilezas.

Ela não apenas defendeu suas ações durante a última sessão do Senado — na qual o partido governista sofreu seis derrotas consecutivas — como também criticou abertamente a Secretária Geral da Presidência e parte da comitiva presidencial. Ela também deixou claro que não compartilha da visão da presidente sobre os projetos de lei que visam restaurar as pensões e declarar estado de emergência por invalidez.

“Se houver equilíbrio [fiscal], ajudar os mais vulneráveis não deveria ser tão terrível. A questão é que um aposentado não pode esperar, e uma pessoa com deficiência, menos ainda. Que economizem em viagens e no SIDE, e pronto”, respondeu Villarruel a um comentário no Instagram. Isso é o oposto da opinião expressa por Milei, que chamou os apoiadores dos projetos de “degenerados fiscais” e disse que os vetaria.

O motivo

Tudo começou na última quinta-feira, quando a Casa Rosada (Palácio Presidencial) tentou impedir Villarruel de validar – usando algum truque regulatório – a sessão que se anunciava para o Executivo. Três funcionários do Casa Rosada escreveram à vice-presidente pedindo que ela não autorizasse a sessão, mas ela os ignorou, alegando que não poderia se esquivar de seu papel "institucional", com a maioria dos blocos exigindo a votação. Naquela mesma noite, após uma série de derrotas de La Libertad Avanza, Milei chamou Villarruel de "traidora".

Javier Milei disse que vetaria o aumento da pensão, argumentando que os gastos extras ameaçavam seu superávit fiscal, e culpou Villarruel por permitir que a votação prosseguisse. Na Argentina, o vice-presidente do país também atua como presidente do Senado.

Em janeiro, Milei obteve uma grande vitória econômica quando descobriu-se que 2024 seria o primeiro ano em mais de uma década em que a Argentina registraria um superávit orçamentário. No mês passado, a taxa de inflação mensal do país também caiu para 1,5%, a menor em mais de cinco anos.

Mas as medidas de austeridade que ajudaram o presidente a reduzir o déficit e a controlar a inflação também desencadearam protestos, com aposentados realizando comícios semanais em frente ao Congresso.

Após a aprovação da moção, o presidente Milei foi rápido em anunciar que bloquearia o aumento da pensão. "Aposto cem mil contra um que todos vocês sabem o que eu vou fazer. Sabem de uma coisa? Vamos vetar. E se, por acaso, o que não acredito que vá acontecer, mas se o veto for derrubado, levaremos isso à justiça", disse ele.

Villarruel, por sua vez, disse que aposentados e pessoas com deficiência "não podiam esperar" mais que seus pagamentos fossem aumentados e sugeriu que o presidente deveria economizar gastando menos com serviços de inteligência e em viagens.

A nova tensão entre Milei e Villarruel parece minar qualquer tipo de gestão coordenada entre a Casa Rosada e a presidência do Senado. Pessoas próximas à vice-presidente, após o episódio nas redes sociais, disseram que suas mensagens eram "respostas pessoais" de uma conta do Instagram que ela administra sem uma equipe oficial de comunicação.

Aqueles que conhecem bem Villarruel sugerem que suas postagens no Instagram não faziam parte de uma ação política calculada para romper abertamente com a Casa Rosada e que provavelmente se tratava de uma reação espontânea e pessoal, que antecipava qualquer plano. Até então, ela havia resistido a quase todos os ataques sem demonstrar qualquer reação visceral. Mas desta vez foi diferente.

Aqueles dentro da Casa Rosada suspeitam que Villarruel queira se preparar com uma equipe porque acredita que pode substituir Milei como presidente. Já aqueles dentro do círculo presidencial, no entanto, sustentam que as iniciativas da vice-presidente para estabelecer sua própria estrutura política não estão causando grandes preocupações. Pessoas próximas à presidente afirmaram: "Ela não pode causar danos porque não pode construir nada."

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