Rafael Coca, founder e co-CEO da Spark (Divulgação)
Redação Exame
Publicado em 13 de julho de 2025 às 20h31.
*Por Rafael Coca
“Tenho duas notícias: uma boa e outra má. Qual você quer ouvir primeiro?”.
A clássica brincadeira é um gatilho para preparar as pessoas para o que vem a seguir, e a escolha pode mudar o tom da conversa. No Cannes Lions, o VP de marketing da Apple conseguiu mandar ambas as notícias em uma única frase, dando a tônica realista dos debates sobre inteligência artificial no festival:
“A IA não vai matar a propaganda, mas também não vai salvá-la”, disse Tor Myhren.
Misto de alívio e de preocupação. Mas, com essa fala, o executivo colocou uma boa pitada de razão nesse debate entre inteligência artificial e criatividade humana na comunicação. Vale lembrar que a pauta está carregada por uma mistura de euforia, dúvidas e questionamentos, um clima quase palpável no ar da Riviera Francesa, que eu também já havia sentido em Austin, no SXSW deste ano, porém olhando para além da publicidade.
Além do Tor, para entender diferentes visões sobre o assunto, acompanhei palestras de figuras globais que representam polos diferentes dessa indústria: entre elas, John Hegarty, um dos profissionais mais respeitados da publicidade internacional e fundador da lendária agência BBH. Também assisti ao painel que juntou os dois polos do debate no palco, Arthur Sadoun, chairman e CEO do Publicis Groupe, e Shantanu Narayen, chairman e CEO da Adobe.
No geral, os discursos no Palais foram no caminho da convergência entre o tech (toque tecnológico) e o touch (toque da criatividade humana). Verdade seja dita, há um reconhecimento de que a indústria caminha para ser mais “tech”, mas, ao mesmo tempo, há uma “segurança” de que ela depende essencialmente do “touch”.
Por um lado, a IA é apontada como a provável maior força transformadora que a indústria publicitária já viu. Nas palavras de Tor Myhren, uma parceira colaborativa, “um braço biônico” que potencializa as capacidades humanas, ajudando as agências e marcas a se tornarem mais ágeis, menos burocráticas, mais inovadoras.
E, por outro lado, existe a celebração da publicidade ainda como um negócio de pessoas e para pessoas, e que quando esse acesso à tecnologia é democratizado, o que sobra para competir é justamente a criatividade.
Um exemplo concreto dessa integração é o case da Natura, vencedora do Grand Prix na categoria Sustainable Development Goals no Cannes Lions deste ano. A campanha “The Amazon Greenventory”, criada em parceria com a agência Africa Creative, utilizou drones equipados com inteligência artificial para realizar o maior inventário florestal já feito na Amazônia.
O estudo mapeou 60 mil hectares de floresta no Pará, área equivalente a aproximadamente 100 mil campos de futebol, uma tarefa que, com métodos tradicionais, levaria mais de duas décadas. Este inventário amplia as cadeias produtivas da Natura na região, melhora a conservação e fortalece seu impacto socioambiental e econômico, beneficiando milhares de pessoas.
Por fim, a mensagem que ecoou no Cannes Lions deste ano, pelo menos para mim, é que a inteligência artificial não chega para substituir o talento e a autenticidade, mas para potencializar o trabalho criativo, abrindo novas possibilidades de comunicação.
O desafio é encontrar esse equilíbrio, onde tecnologia e criatividade caminhem lado a lado, impulsionando a inovação sem perder a essência. Essa sinergia será o diferencial para marcas e profissionais que desejam não semente acompanhar, mas liderar na era da inteligência artificial.