Amigos confraternizando: quem mede o impacto de uma frase dita num bar? ( Maskot/Getty Images)
Estrategista de Comunicação
Publicado em 24 de outubro de 2025 às 16h14.
A promessa era simples: mais dados, mais acerto. Só que o marketing, diferente da química e da física, não opera em laboratório. Marketing é feito de gente, de humor, de contexto e, por que não, de sorte.
Mesmo com toda a engenharia de dados, algoritmos, Inteligência Artificial e rastreabilidade, ainda há zonas cinzentas, principalmente no offline, onde o efeito de uma ação pode demorar semanas, misturar-se a outros gatilhos e, do nada, ressurgir das cinzas, quando ninguém mais esperava.
A palavra que melhor define estes tempos talvez seja contrassenso: nunca tivemos tantos dados, ferramentas e métricas e, ainda assim, nunca foi tão difícil entender por que algumas campanhas funcionam e outras simplesmente flopam.
Se as marcas conhecem tanto o comportamento de seus consumidores, sabem quando compram, o que consomem, até o tipo de humor que preferem, por que razão o imprevisível continua vencendo? Por que campanhas planejadas com toda a ciência a seu favor morrem invisíveis, enquanto outras, quase acidentais, viram assunto, meme, conversa?
Campanhas memoráveis têm algo em comum: elas se tornam parte da vida das pessoas, não do funil. Ativam emoções antes de gatilhos e conversas antes de métricas. Marcas que compreendem isso tratam o dado como bússola, não como mapa. Sabem que o ROI mais poderoso é o da relevância, aquele que faz alguém do outro lado dizer “UAU, essa marca é diferente” antes mesmo de clicar em qualquer botão.
Awareness é o início de toda confiança. E confiança, o começo de toda conversão.
Durante anos, nos fizeram crer (e talvez fosse isso mesmo) que bastava medir para entender. Só que existe um abismo entre “informação” e “sentido”.
Dados mostram o que aconteceu, raramente explicam os porquês daquilo ter acontecido. E talvez essa seja a verdade que o mercado ainda evita encarar: por mais sofisticado que seja o modelo, ainda existe algo que não se rastreia: o momento em que alguém se sente tocado por um texto, um slogan, um vídeo, uma voz anônima.
A angústia do marketing contemporâneo reside justamente aqui: tudo se mede, pouco se compreende. Testes de incremento, media mix modeling, pixels, QR codes, pesquisas pós-compra... tudo ajuda, nada encerra o assunto. O motivo é simples: existe algo que escapa à matemática – aquilo que acontece quando uma marca entra na conversa das pessoas, não nos cliques delas.
Como estimar o impacto de uma frase dita num bar? De uma recomendação feita no grupo da família? De um podcast ouvido na academia?
Essa é a fronteira que o marketing ainda não soube cruzar, a do rastreável para o memorável.
Há ferramentas para tudo, contudo, falta sensibilidade para o invisível: o sentimento de confiança que antecede qualquer decisão. Campanhas inesquecíveis não nascem porque acertaram o KPI. Nascem porque tocaram o coração das pessoas. Porque arriscaram. Porque soaram verdadeiras.
A lógica da performance, do “post viral rápido”, do “hack de engajamento”, está saturada. O diferencial hoje é conexão. Marcas que ainda tentam viralizar seguem otimizando para compartilhamento. As que realmente conseguem fazem diferente contam, com autenticidade, algo que vale ser compartilhado.
É menos “vamos quebrar a internet” e mais “vamos quebrar o gelo com quem importa”.
Talvez seja hora de o marketing fazer as pazes com o invisível, com o offline, o espontâneo, o que acontece nas entrelinhas dos relatórios.
A obsessão por rastrear tudo tem feito muitas marcas esquecerem que consumidores são pessoas, e não dados. Pessoas compartilham histórias, não planilhas.
Os algoritmos podem prever cliques e até sentimentos. Nunca o arrepio que transforma lembrança em lealdade, audiência em comunidade e um simples anúncio em algo impossível de esquecer.
O futuro do marketing não será o da onisciência dos dados, e sim o da humildade diante do intangível.
Quem sabe trocar uma simples pergunta resolva essa equação. De “quanto essa ação converteu?” para “quanto essa ação significou?”