Casimiro Miguel, fenômeno da mídia brasileira, construiu boa parte do seu capital social não em salas de networking tradicionais, e sim em transmissões ao vivo da CazéTV (Divulgação)
Estrategista de Comunicação
Publicado em 18 de setembro de 2025 às 14h44.
Durante décadas, “fazer networking” foi quase uma liturgia do sucesso. Blocos pesados de cartões de visita trocados em congressos, coquetéis corporativos, almoços de relacionamento, conversas de corredor... Era assim que executivos garantiam presença nos lugares certos e ampliavam o alcance de suas carreiras.
Oportunidades eram fruto do olho no olho: quanto mais gente você conhecia, mais portas se abriam.
Hoje, vivemos em outro mundo. A inteligência artificial entrou de vez no centro da equação e passou a mediar nossas conexões. Plataformas de recrutamento sugerem “contatos relevantes” em segundos, algoritmos de CRM indicam quem deve ser priorizado, agentes inteligentes redigem mensagens sob medida para clientes e parceiros. O networking ganhou escala e velocidade e, nesse processo, perdeu densidade.
O desafio deixou de ser apenas “ter acesso”. Agora, a bola da vez é ser relevante.
Reid Hoffman, cofundador do LinkedIn, já dizia: redes não servem para conectar todos a todos, e sim para criar vínculos com propósito. Só que a IA radicalizou esse paradoxo. Hoje, qualquer C-Level está a dois cliques de distância de um investidor em Cingapura ou de um parceiro em Tel-Aviv.
Essa abundância tem um custo: a superficialidade. A mesma máquina que aproxima, também dilui.
É nesse ponto que entra o que a tecnologia não toca e nunca tocará: confiança, escuta genuína e presença humana.
Casimiro Miguel, fenômeno da mídia brasileira, construiu boa parte do seu capital social não em salas de networking tradicionais, e sim em transmissões ao vivo da CazéTV. Nos bastidores, a IA ajuda seu grupo a organizar clipes, sugerir cortes virais, revisar textos e editar conteúdos.
O que sustenta o valor da sua rede, no entanto, não é a eficiência algorítmica; é a autenticidade. O jeito direto com que Casimiro interage com sua audiência, atletas e marcas transformou seguidores em parceiros e audiência em mercado. O algoritmo amplia. A confiança fideliza.
Satya Nadella, CEO da Microsoft, vive o mesmo dilema – em outro cenário. Em entrevistas, já contou que usa agentes internos de IA para organizar informações antes de reuniões estratégicas: a tecnologia resume históricos de contatos, mapeia interesses comuns e sugere pontos de conexão.
Ele chega mais preparado e, ainda assim, não terceiriza o essencial. “A IA me prepara, mas não me substitui naquilo que importa: a conexão humana”, afirmou no Fórum Econômico Mundial.
Nadella usa a máquina para ganhar tempo e reinveste esse tempo na escuta ativa.
Aqui no Brasil, felizmente, vejo líderes praticando networking à moda antiga: respondem pessoalmente a mensagens no WhatsApp, ligam para parceiros estratégicos, convidam prospects para conversar sem pedir nada em troca – e vêm colhendo resultados duradouros.
Em um mundo que automatiza relatórios e apresentações, gestos assim têm impacto multiplicado: produzem histórias que se perpetuam e vínculos que resistem ao tempo.
Esse movimento híbrido – tecnologia para acelerar, humanidade para consolidar – já é marca Geração Z, nascida entre 2000 e 2010. Ela, que entrou em peso no mercado de trabalho e usa IA para preparar abordagens, reconhece que o que realmente abre portas é a combinação entre preparo tecnológico e autenticidade.
Uma pesquisa da Deloitte confirma: 62% dos jovens brasileiros preferem líderes acessíveis a líderes hiperconectados. Em outras palavras, não basta ser lembrado por estar em todas; é preciso ser lembrado por fazer diferença em uma.
O chamado “networking invisível” também cresce. Um estudo da McKinsey revela que 70% dos executivos já utilizam IA para tarefas de prospecção: da triagem de convites à produção de relatórios sobre quem estará presente em uma reunião.
Uma camada silenciosa, mediada por máquinas, que redefine como contatos são feitos. O mesmo levantamento, porém, mostra que os líderes mais lembrados continuam sendo aqueles que se fazem presentes de forma humana.
Mary Barra, CEO da General Motors desde 2014, é um exemplo. Seus assistentes de IA ajudam a mapear regiões e históricos de vendas, ainda assim nada substitui sua visita discreta às concessionárias, sem aviso prévio. É o olhar direto, a presença inesperada, que gera confiança.
A IA, portanto, já transformou o networking. Tornou-o mais rápido, mais amplo, mais global. Não substituiu (nem nunca substituirá) o que está na base de toda relação verdadeira: confiança, escuta genuína e presença estratégica.
Relações profundas não acompanham a escala das máquinas. Exatamente por isso se tornaram ainda mais valiosas.