Erich Shibata, diretor criativo da Cimed, durante o CMO Summit: “Criatividade não é luxo — é diferencial competitivo acessível”
Colaborador
Publicado em 30 de junho de 2025 às 19h45.
Última atualização em 30 de junho de 2025 às 20h25.
Durante muito tempo, o setor farmacêutico foi visto como tradicional quando o assunto era marketing. Atributos como ousadia e alegria, tão próximos das letras de música, não pareciam fazer parte do universo de marcas que têm a responsabilidade de cuidar da saúde das pessoas. Nos últimos anos, porém, a Cimed mudou esse jogo.
Mais do que apenas aparecer, a companhia se transformou de uma farmacêutica tradicional, conhecida por medicamentos genéricos, em um fenômeno de comunicação. Erich Shibata, diretor criativo da empresa, abriu os bastidores dessa virada “cool” da empresa na palestra que encerrou o primeiro dia de CMO Summit, na última quarta-feira, 25 de junho.
Realizado no Expo Center Norte, na capital paulista, a primeira edição presencial do evento reuniu mais de 3 mil pessoas ao longo de dois dias de evento – a EXAME é parceira de mídia do encontro. Muitas dessas 3 mil pessoas estavam diante de Shibata na hora da apresentação, curiosas para entender os segredos da Cimed. Em cerca de 1 hora, o executivo não só falou dos carros amarelos, do moletom viral e do segredo por trás do Carmed. Ele também deixou claro que criatividade, consistência e coragem são essenciais para gerar desejo.
“Criatividade não é um luxo. Mas é o diferencial competitivo mais acessível que existe”, disse o executivo, ao lembrar que seus primeiros projetos na Cimed tinham um orçamento praticamente simbólico.
O primeiro vídeo que fez para redes sociais, por exemplo, custou cerca de R$ 2 mil. A entrega, porém, abriu espaço para orçamentos um pouco menos rigorosos. Aos poucos, ele conseguiu convencer a alta liderança de que vale a pena investir se houver confiança que o retorno virá. “Coisa boa é como droga. Quem experimenta, quer mais”, resumiu Shibata, arrancando risos da plateia.
A prova mais clara desse efeito viciante da criatividade está nas redes sociais da empresa, uma das vitrines mais poderosas do branding da Cimed. Com mais de 12 milhões de seguidores na soma das plataformas e cerca de 700 milhões de impressões mensais, a farmacêutica aposta em uma linguagem leve, formatos nativos e uma identidade visual marcante. No TikTok, por exemplo, a empresa utiliza estratégias típicas da nova geração de conteúdo, como vídeos com cortes duplos (um em cima, outro embaixo) para prender a atenção do público e entregar mensagens de forma divertida e eficaz.
Parte da força digital da Cimed vem de dentro: a empresa criou uma cultura ativa de "influenciadores de crachá", incentivando seus colaboradores a se tornarem promotores espontâneos da marca. Eles recebem produtos em primeira mão, aprendem a produzir conteúdo e ajudam a amplificar lançamentos com engajamento orgânico.
“Quando um colaborador leva um lançamento de produto para casa antes de chegar na farmácia, ele mostra com orgulho para a família. E a filha diz: meu pai trabalha na empresa do remédio amarelo!”, contou. Esse tipo de identificação emocional com a marca, segundo Shibata, é o que cria conexões reais — e duradouras.
Outro caso emblemático é o do moletom amarelo que a empresa criou para seus colaboradores. Mais do que apenas um uniforme, o item ganhou design fashion desde o princípio. Rejeitado inicialmente no âmbito corporativo, teve sua primeira leva bancada do próprio bolso de Shibata e do CEO João Adibe. Hoje, virou item disputado por funcionários, clientes e influenciadores. “Teve diretor que preferiu ganhar um moletom a um bônus em dinheiro”, contou.
Responsável por uma grande quantidade de produtos, a Cimed enfrentou durante muito tempo um dilema: como utilizar o orçamento de marketing para promover tanta coisa? A resposta de Erich foi investir na força do branding – e, mais especificamente, em uma cor.
A aposta no amarelo – improvável para uma farmacêutica – se transformou em um símbolo de alegria, prosperidade e atenção. Mais que isso, virou quase uma obsessão para Shibata, que revisa pessoalmente todas as aplicações da cor (e as rejeita se vierem no tom errado). “A Tiffany não muda o tom de azul, por que a gente mudaria o nosso amarelo?”, argumentou, destacando a fixação com consistência.
Ao apostar no amarelo, o executivo acabou usando uma tática antiga: a de unir esforços em vez de dividi-los. Com a cor amarela se tornando conhecida por conta dos investimentos da empresa em redes sociais, o próximo passo foi redesenhar todos os rótulos e embalagens da empresa para inserir a coloração.
É um diferencial importante: assim, quando o cliente chega na farmácia e pede por um remédio genérico, ele é capaz de distinguir a Cimed de outras fabricantes, mesmo em uma commodity. “Pode custar R$ 2 a mais, mas como o cliente conhece a gente, ele confia e aceita pagar mais”, explica, mostrando na prática como o posicionamento de marca pode impactar os negócios.
Karla Adibe e João Adibe, da Cimed. Foto: Leandro Fonseca (Leandro Fonseca/Exame)
Ao longo de sua palestra, Shibata também enfatizou a importância das experiências múltiplas para a criatividade. Formado em design industrial, ele mesmo se considera um executivo não convencional. Sua primeira experiência profissional, antes de ir para a Cimed, foi desenhando jatos executivos na Embraer – e atendendo clientes como o ator Jackie Chan. A vivência acabou lhe ensinando bastante sobre regionalização, escuta dos clientes e respeito às diferenças culturais.
Foi essa bagagem que ele trouxe para a Cimed — e talvez por isso tenha conseguido romper com o que chamou de “cinza padrão” da indústria farmacêutica. “Se todo mundo faz igual, por que alguém escolheria você?”, questionou. Defensor da flexibilidade e da quebra de silos, destacou que a Cimed só conseguiu se reinventar porque trouxe gente de fora do setor: “Nosso CTO veio do McDonald's. Nosso RH veio da JBS. Eu vim da aviação. A diversidade de pensamento cria inovação de verdade”.
Ele também criticou a rigidez das empresas corporativas e ressaltou que parte do sucesso da Cimed se deve ao fato de que, hoje, a companhia é uma empresa familiar. “O executivo pensa em mitigar riscos. Já o dono da empresa pensa em vender o almoço para pagar a janta, mas ele aceita o risco. Quando você entende isso, você consegue vender suas ideias com mais empatia”, aconselhou.
Ao final, porém, ele enfatizou que não adiantaria nada mostrar todos os tons de amarelo para o mundo se isso não se reverter no caixa da empresa. “Design bonito não serve para nada se não vender. Tudo precisa gerar resultado financeiro. Se eu proponho uma ação e ela não tem retorno, não adianta”, afirmou. “A criatividade precisa ter propósito e direção.”