Nestor e Alexandre Heineck, da Docile: três gerações da família ainda circulam pela fábrica que ajudaram a construir (Leandro Fonseca /Exame)
Repórter de Negócios
Publicado em 27 de maio de 2025 às 11h13.
No interior do Rio Grande do Sul, a indústria de guloseimas gaúcha Docile trabalha com muito açúcar, jujuba e embalagens coloridas rumo ao primeiro bilhão de reais.
Sediada em Lajeado, a 120 quilômetros de Porto Alegre, a indústria conta com esteiras desfilhando pastilhas, e jujubas caem de 2 metros de altura, como numa cachoeira de doces. Corredores com metros de extensão exibem marshmallows recém-saídos da máquina, antes mesmo de serem cortados.
Todos os dias, oito caminhões carregados com 25 toneladas de doces partem da expedição da empresa. Por mês, são 250 milhões de embalagens com a marca Docile chegando ao mercado, com jujubas, balas de goma, marshmallows, pastilhas de menta e todo tipo de guloseimas imaginável. Só no Brasil, são 170 itens da Docile nas gôndolas de supermercados. Contando as exportações, são mais de 400 produtos.
Com essa mistura de encantamento e doce, a Docile está próxima de seu primeiro bilhão de reais em faturamento, previsto para 2026.
Para chegar lá, reforçou o marketing com campanhas protagonizadas por estrelas dos esportes olímpicos nacionais, como a skatista Rayssa Leal e a ginasta Rebeca Andrade. A empresa também expandiu a malha logística. Em um ano, saltou de 13 para 74 distribuidores. Em 2024, inaugurou um centro de distribuição em Extrema, entre São Paulo e Minas, e viu crescer também o mercado internacional: hoje, 35% da receita já vem da exportação.
De 2020 para cá, a receita praticamente dobrou. Em 2024, foi de 684 milhões de reais. Para este ano, a meta é chegar aos 810 milhões de reais.
Fabrica de doces da Docile em Lajeado: todo dia, oito caminhões repletos de doces saem da fábrica localizada a 120 quilômetros de Porto Alegre (Leandro Fonseca /Exame)
Por trás da confiança do primeiro bilhão de reais, há uma aposta de que o mercado de açúcar não está estagnado. Muito pelo contrário.
“Temos produtos sem açúcar, com aromas e corantes naturais, itens para veganos”, diz Alexandre Heineck, presidente do conselho e um dos três irmãos fundadores. “Mas queremos mesmo é proporcionar essa alegria para o consumidor, o mainstream, e ainda tem muito açúcar nesse universo.”
Embora o Brasil seja o quinto maior mercado de guloseimas do mundo, o consumo per capita ainda é modesto, 2 quilos por ano. Em países ricos é muito mais: na Suécia, por exemplo, são consumidos mais de 16 quilos, de acordo com os dados do Ministério da Agricultura local.
A grande prova dessa aposta é um investimento de 150 milhões de reais recém-anunciado pela Docile. Um terço vai para o marketing. O restante, para modernizar a fábrica, com máquinas mais velozes e autônomas.
Apesar de relativamente jovem — a Docile completa 34 anos em 2025 —, a história da família com doces remonta a 1936.
Naquele ano, Natalício Heineck, avô dos fundadores, começou uma produção artesanal. Mais tarde, ela virou a Florestal Alimentos, uma das principais indústrias de balas e pirulitos do Sul do país. O filho de Natalício, Nestor, nascido no mesmo ano da Florestal, seguiu no setor. Em 1991, os três filhos de Nestor, Alexandre, Fernando e Ricardo, criaram uma distribuidora de xarope de glicose.
Sete anos depois, já produzindo refresco em pó, ela passaria a se chamar Docile. “Nosso pai diz que nasceu em cima de um saco de açúcar, botou o dedinho, provou e ficou contagiado”, diz Alexandre. Hoje, Nestor, aos 88 anos, ainda circula pela fábrica, dividindo os corredores com filhos e netos.
Parte dos lançamentos da Docile fica no Brasil, mas uma fatia crescente vai para o exterior.
A empresa é hoje a maior exportadora de doces e guloseimas do país, e vê na exportação uma de suas principais avenidas de crescimento. Do que sai pelos portos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, 60% já levam a marca Docile. O restante segue no modelo private label. É o caso das balas em formato dos clássicos personagens Mickey e Minnie, vendidas nos parques da Disney, nos Estados Unidos.
Trata-se de uma tentativa de morder um pedaço de um mercado global estimado em 69 bilhões de dólares, com expectativa de crescimento de 20% nos próximos anos, segundo a consultoria Mordor Intelligence.
O novo tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump, no entanto, acendeu um sinal de alerta. A partir de 2025, produtos importados nos Estados Unidos — incluindo doces brasileiros — passarão a pagar alíquotas a partir de 10%. Para a Docile, isso não muda a estratégia. “Os Estados Unidos não têm como absorver de uma hora para a outra a demanda de todos os produtos importados”, diz Ricardo Heineck, CEO da empresa. Os principais concorrentes, como Turquia e Colômbia, também foram atingidos pela medida com a mesma alíquota. Mas a aposta está em outro flanco: a China, maior fornecedora global do setor, terá tarifas ainda mais altas. “Pode haver necessidade de absorver parte da demanda antes destinada à China”, diz.
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