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O Mercado Livre vai entrar em farmácias. Este deve ser o impacto – em números

Entrada na categoria mexeria pouco no ponteiro da gigante de ecommerce, machucaria as margens de RD Saúde e tiraria do mercado principalmente as farmácias independentes

MELI: Valor total de vendas feitas na plataforma já é superior a todo o mercado farmacêutico no Brasil (Imagem gerada por inteligência artificial)

MELI: Valor total de vendas feitas na plataforma já é superior a todo o mercado farmacêutico no Brasil (Imagem gerada por inteligência artificial)

Natalia Viri
Natalia Viri

Editora do EXAME IN

Publicado em 9 de setembro de 2025 às 11h53.

Última atualização em 9 de setembro de 2025 às 11h55.

A possível entrada do Mercado Livre no varejo farmacêutico deve machucar as margens da RD Saúde, mas afetar principalmente as farmácias independentes, aponta o Itaú BBA. Ao mesmo tempo, deve mexer pouco no ponteiro da gigante de ecommerce.

O banco fez as contas e, mesmo num cenário otimista, a categoria deve representar cerca de 6,5% do total comercializado pelo MELI em 2030.

É menos sobre o potencial do mercado e mais sobre o tamanho que chegou a plataforma: o valor movimentado pelo MELI no Brasil neste ano já é maior do que todo o mercado endereçável do varejo de medicamentos no país.

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Aos números:

  • Em 2024, o GMV, indicador que mede todo o valor total das mercadorias comercializadas no MELI, foi de US$ 24 bilhões no Brasil, valor que deve passar a US$ 33 bilhões neste ano, nas contas do banco.
  • Já o mercado total de medicamentos vendidos no varejo deve chegar a US$ 27 bilhões, considerando tanto os chamados OTC, vendidos fora do balcão e sem receita (US$ 8,5 bilhões), quanto os remédios com prescrição (US$ 18,5 bilhões).

Para o banco, a entrada na categoria é menos uma questão de volume e mais de recorrência. “É por isso que acreditamos que o ângulo estratégico aqui é aumentar a penetração numa categoria que impulsiona recorrência e retenção dentro da plataforma, eventualmente dando apoio a uma estratégia de cross-sell”, escreveu a equipe liderada por Rodrigo Gastim.

Na visão do BBA, faz mais sentido para o MELI começar sua jornada na categoria vendendo medicamentos sem prescrição, devido a logística e o manejo menos complexo e as margens brutas mais altas, na casa de 35%, contra 15% a 17% para medicamentos sem prescrição.

A categoria já tem uma penetração online alta, de 26%, no Brasil, já em linha com os Estados Unidos e acima da média global de 20%.

Assumindo que o setor cresça 9% ao ano entre 2025 e 2030 (abaixo do ritmo de 13% nos últimos quatro anos) e o MELI atinja seu market share de 42% também nesta categoria, as vendas poderiam chegar a US$ 2 bilhões em 2030. É cerca de 3% do GMV estimado para a plataforma no Brasil no mesmo ano.

No segmento de medicamentos com prescrição, o desafio do MELI é muito maior, avalia o banco. Trata-se de um mercado mais robusto, de US$ 18,5 bilhões por ano e uma penetração online na casa dos 15%.

A necessidade de receita e, em alguns casos, de retenção de receita, e complexidades logísticas maiores dão mais vantagem ao varejo físico, portanto a penetração online tende a ser menor. De fato, nos Estados Unidos, a Amazon teve mais dificuldades de escalar esse segmento e é mais forte em OTC.

Aqui, a oportunidade pode estar mais nos medicamentos de uso crônico, que respondem por 55% a 60% da receita, onde o consumidor é mais sensível a preço e pode programar a compra, estima Gastim. (Nesse mercado, cerca de um terço necessita de retenção de receita.)

Considerando que a penetração online do segmento chegue a 30% e o MELI consiga um share de 25% no mercado, o GMV na categoria representaria 3,5% do total em 2030.

E a RD Saúde?

Olhando para a concorrência, o banco não acredita que a RD Saúde, dona da Raia e da Drogasil, vai perder market share, mas aposta numa perda de margem bruta por conta da necessidade de praticar preços mais competitivos.

Nas contas do BBA, a margem bruta da RD pode ser impactada em 200 bps ao longo dos próximos anos pela entrada do MELI em medicamentos.

A análise considera preços 10% menores para medicamentos OTC, sem prescrição, e de 5% nos medicamentos que precisam de receita. Essas duas categorias representam 11% e 54% das vendas da RD, respectivamente.

A perda de margem já é uma tendência que vem se materializando no segmento de higiene e beleza, onde o ecommerce vem ganhando cada vez mais participação.

Considerando esse segmento na conta, o BBA estima margens brutas 3 p.p. menores ao longo dos próximos anos. Nos últimos doze meses encerrados em junho, o indicador foi de 27,3% na RD.

Esse efeito, contudo, tende a ser parcialmente compensado pelo aumento das vendas, defendem os analistas.

“Se a RD perder de 2 a 3 pontos percentuais na margem ao longo do tempo, a maior parte das farmácias independentes, que operam com uma margem EBITDA de um dígito baixo, provavelmente vão sair do negócio”, afirmam.

Esse tipo de negócio – que representou 17% da venda total da indústria no ano passado – também tem mais dependência dos medicamentos OTC, onde o MELI provavelmente terá mais impacto.

Para que o efeito líquido de perda de margem seja totalmente compensado na última linha do balanço da RD Saúde, de 25% a 45% dos players independentes teriam de sair do mercado.

É um cenário esticado, mas não impossível. Desde 2014, os players independentes perderam 13 pontos percentuais de share, com a RD capturando 50% disse ou 7 pontos percentuais, impulsionada também pela abertura de novas unidades.

Em resumo, é o que já se sabe: quando dois gigantes colidem, os menores é que são mais afetados.

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