Patrocínio:
Parceiro institucional:
Sede do secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) recebe reuniões preparatórias, em mais importante fórum antes da COP30 (UNFCCC/Divulgação)
Editora ESG
Publicado em 16 de junho de 2025 às 07h00.
Começou nesta manhã de segunda-feira (16), em Bonn, na Alemanha, a 62ª Sessão dos Órgãos Subsidiários, mais importante reunião preparatória antes da COP30.
A expectativa é de que cerca de 5.000 participantes de delegações governamentais, organizações não governamentais e setor privado participem das discussões até o dia 26 de junho, quando se encerra o encontro.
Realizado anualmente na cidade alemã, sede do secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), o encontro em Bonn é um quase ensaio geral da diplomacia climática internacional.
Diferentemente das Conferências das Partes, este evento técnico não produz documento final, mas estabelece alicerces fundamentais políticos e metodológicos para acordos posteriores.
Contudo, essas reuniões preparatórias funcionam como termômetro para o ambiente das negociações que definirão o futuro dos compromissos globais com o clima.
A delegação brasileira chega carregando na mala pendências deixadas pela COP29 do Azerbaijão.
Conforme manifestações de André Corrêa do Lago e Ana Toni, respectivamente presidente e CEO da COP no Brasil, concentrarão esforços em três temas prioritários: transição energética justa, indicadores de adaptação climática e implementação do balanço global.
Especialistas apontam que o principal processo em discussão será o Diálogo de Sharm el-Sheikh, espaço de negociações específicas, dedicado exclusivamente ao objetivo de tornar os investimentos consistentes com um caminho de baixas emissões e desenvolvimento resiliente ao clima.
O mecanismo nasceu da necessidade de operacionalizar o Artigo 2.1c do Acordo de Paris, que estabelece a meta de "tornar os fluxos financeiros consistentes com um caminho de baixas emissões de gases de efeito estufa e desenvolvimento resiliente ao clima".
Na prática, significa redirecionar trilhões de dólares que circulam na economia global para projetos sustentáveis. Visto que hoje, a maior parte dos investimentos mundiais ainda financia atividades que agravam a crise climática, como usinas de carvão, exploração de petróleo e indústrias poluentes.
O Diálogo opera em períodos determinados para avaliar progressos e definir novas estratégias, com encerramento previsto para os dias 17 e 18 de junho. A partir de então, caberá à COP30 definir os próximos passos para alinhar fluxos financeiros globais com as metas climáticas.
Segundo análises do International Institute for Sustainable Development, o financiamento climático dominará as discussões preparatórias, especialmente após o acordo do Novo Objetivo Coletivo Quantificado (NCQG) em US$ 300 bilhões anuais até 2035.
E também neste aspecto, a reunião de Bonn é estratégica. A implementação prática desses recursos e a complementaridade com mecanismos existentes demandam esclarecimentos técnicos antes da conferência amazônica.
Outro fórum importante, o Grupo de Trabalho para Transição Justa permanece sem consenso desde a conferência de Baku, evidenciando as resistências ao processo de migração para economia de baixo carbono com proteção social adequada.
"Nos últimos anos, as negociações sobre financiamento climático foram dominadas pela definição da nova meta coletiva quantificada. Com esse processo acordado, outros instrumentos igualmente relevantes ganham protagonismo rumo à COP30", lembra Natalie Unterstell, do Instituto Talanoa, em artigo no hub Política por Inteiro.
A especialista destaca que a articulação entre o Artigo 2.1c e o financiamento climático previsto no Artigo 9 representa um elemento central nas discussões.
A complementaridade entre esses mecanismos foi reconhecida no âmbito do Diálogo de Sharm el-Sheikh, mas ainda demanda fortalecimento contínuo diante do contexto geopolítico que ameaça os fluxos de financiamento climático internacional.
Entre as três prioridades brasileiras para Bonn, o balanço global representa provavelmente o maior desafio técnico e político.
Este mecanismo funciona como uma espécie de "raio-X" quinquenal do planeta, avaliando se os países estão cumprindo suas promessas de redução de emissões estabelecidas no Acordo de Paris.
No primeiro diagnóstico apresentado na COP28 de Dubai, a perspectiva foi preocupante. O mundo estava longe de cumprir a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C. Porém, desde então, as nações não conseguem concordar sobre como partir do alerta para ações concretas.
Como anfitrião da COP30, caberá ao Brasil mediar um acordo que transforme o diagnóstico em prescrição, definindo diretrizes práticas para que os países ajustem suas políticas climáticas baseadas na avaliação científica.
Os indicadores de adaptação climática receberão análise inédita em versão consolidada durante as reuniões alemãs.
Apenas 22 países formalizaram suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) atualizadas, documentos que estabelecem quanto cada nação reduzirá suas emissões até 2030.
O atraso generalizado expõe a complicada realidade, em que essas metas climáticas se converteram em disputas políticas internas que dividem governos, empresários e sociedade.
O que inicialmente consistia em compromissos técnicos elaborados por especialistas ambientais, hoje alimenta debates nacionais intensos sobre quem arcará com os custos da transição energética.
No Brasil, isso significa embates entre o agronegócio e políticas de desmatamento, trabalhadores da indústria petrolífera e investimentos em energia renovável, desenvolvimento regional e preservação ambiental.
A maior expectativa, contudo, é sobre a postura dos Estados Unidos, que anunciaram a saída do Acordo de Paris em janeiro deste ano, mas permanecem formalmente vinculados até janeiro de 2026.
A condição ambígua inevitavelmente influencia as estratégias de outras delegações e o tom das negociações multilaterais.
Para países insulares ameaçados pelo aumento do nível do mar, comunidades rurais africanas enfrentando secas prolongadas e populações urbanas sofrendo com eventos extremos, as discussões alemãs não representam exercícios diplomáticos abstratos.
São definições sobre acesso a recursos de adaptação, transferência de tecnologias limpas e proteção social durante a transição energética. E sobrevivência.
Os próximos dias em Bonn revelarão se o multilateralismo climático possui energia política suficiente para acelerar decisões que, tradicionalmente, levam anos para amadurecer.
A janela temporal estreita até novembro exige que delegações deixem a postura defensiva e priorizem consensos operacionais sobre disputas ideológicas.
E o sucesso alemão determinará se Belém produzirá acordos concretos ou repetirá os impasses que mantêm milhões de pessoas vulneráveis aos impactos climáticos.