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Rio Murray, na Austrália: modelo de mercado de água causa impactos socioambientais no pais (Ignacio Palacios/Getty Images)
Publicado em 2 de junho de 2025 às 09h20.
Com sua dimensão continental, a Austrália convive com padrões de chuva irregulares, uma aridez implacável e solos pobres em nutrientes. Diante desse cenário, grande parte da população vive na bacia Murray-Darling, que concentra 85% da área irrigada do país e dois quintos da produção nacional de alimentos.
Ao longo das décadas de 1980 e 1990, o país formalizou o comércio de água por meio da separação entre os direitos de uso da água e os títulos de propriedade. Essa estrutura permitiu que agricultores vendessem seus direitos de uso para quem pudesse pagar mais.
Por um lado, o mercado da água impulsionou as exportações agrícolas e criou uma indústria de corretores e fundos de irrigação. Por outro, gerou desequilíbrios socioeconômicos ao favorecer os grandes produtores em detrimento dos pequenos.
A chamada “Seca do Milênio”, que durou de 2001 a 2009, forçou o governo a intervir. Foi necessário comprar direitos de uso a preços acima do mercado para evitar o colapso do rio Murray. Nesse contexto, em 2008, foi criada a Murray-Darling Basin Authority, agência independente responsável pela gestão das águas e da infraestrutura hídrica da região.
Em 2012, surgiu o Plano da Bacia Murray-Darling, um acordo histórico voltado à sustentabilidade do uso da água para o meio ambiente, a agricultura e as comunidades. O plano estabeleceu limites para a retirada de água do sistema fluvial. Ainda assim, segundo estudo de 2024, os investimentos e reformas promovidos ao longo de 30 anos não resultaram em benefícios socioambientais efetivos.
A retirada excessiva de água para irrigação causou problemas graves, como a proliferação de algas tóxicas, o colapso das populações de peixes e a salinização da água e dos solos, comprometendo a potabilidade. Programas que deveriam incluir os povos indígenas no sistema comercial de água não foram implementados. A exclusão de comunidades tradicionais é uma das maiores falhas da atual política hídrica australiana.
Apesar disso, há sinais de mudança. Em 2023, foi aprovada a emenda legislativa “Restoring Our Rivers”, cujo objetivo é devolver mais água ao meio ambiente. Além disso, o plano da bacia passará por revisão em 2026, abrindo caminho para possíveis correções de rota.
Ainda há muito a ser debatido sobre o acesso equitativo à água, sobretudo diante das mudanças climáticas. A experiência da bacia Murray-Darling revela os desafios de equilibrar produção e preservação ambiental em um contexto de escassez hídrica. A lição australiana pode inspirar políticas mais justas e sustentáveis em outras partes do mundo.