(manusapon kasosod/Getty Images)
Instituto Millenium
Publicado em 22 de outubro de 2025 às 23h55.
Pedro Henrique Engler Urso*
O debate ambiental costuma ser sequestrado por discursos que enxergam o mercado e o capitalismo como inimigos irreconciliáveis da natureza. Entretanto, a história recente mostra justamente o contrário: o desenvolvimento econômico, somada à inovação e à capacidade de reinvenção do capitalismo, que tem fornecido as soluções mais eficazes para grandes desafios ecológicos.
Um exemplo emblemático é o da camada de ozônio. Nas décadas de 1980 e 1990, cientistas descobriram que os clorofluorcarbonos (CFCs), presentes em geladeiras e aerossóis, estavam corroendo essa barreira natural essencial para a vida na Terra. A notícia gerou enorme apreensão: muitos anunciavam catástrofes iminentes, chegando a prever o colapso da civilização. O tema ganhou espaço inclusive na cultura popular, com filmes como The Sky’s on Fire, que retratavam céus em chamas e a humanidade ameaçada pela destruição do ozônio.
No entanto, a realidade seguiu outro caminho. Em poucos anos, o mercado se reinventou. Cadeias produtivas foram reorganizadas, novas tecnologias desenvolvidas e alternativas seguras aos CFCs criadas. Esse processo contou ainda com uma cooperação internacional rara, consolidada pelo Protocolo de Montreal, que estabeleceu metas claras para a substituição dessas substâncias nocivas. O esforço foi bem-sucedido. Ao longo da década de 1990 e do início dos anos 2000, a produção e o consumo de CFCs foram gradualmente suspensos. Em 2009, cerca de 98% das substâncias controladas pelo tratado já haviam sido eliminadas do mercado global.
Hoje, o buraco na camada de ozônio ainda se forma anualmente sobre a Antártida, durante a primavera, mas tende a se fechar no verão, quando correntes de ar estratosférico vindas de latitudes mais baixas se misturam. Esse ciclo se repete a cada ano, mas com sinais claros de recuperação. As avaliações científicas indicam que a camada de ozônio está se recompondo conforme o esperado e deve retornar aos níveis anteriores a 1980 nas próximas décadas. A ameaça que um dia foi tratada como irreversível está em vias de ser superada, graças à capacidade de adaptação do mercado e à cooperação internacional.
Agora, o desafio é o aquecimento global. Mais uma vez, não será o imobilismo, nem a retórica anticapitalista que trarão as soluções, mas sim a mesma força inovadora do mercado. Já vemos surgir alternativas competitivas, como o etanol e outros biocombustíveis, além da revolução dos carros elétricos e híbridos. As maiores empresas do mundo têm investido bilhões em energias renováveis, baterias de longa duração e processos produtivos menos poluentes. Trata-se, em essência, de um processo natural de adaptação: o capitalismo transforma desafios em oportunidades.
Esse mercado verde, além de mitigar riscos ambientais, abre espaço para que países em desenvolvimento se tornem protagonistas na nova economia global. O Brasil, por exemplo, é um dos maiores produtores de cana-de-açúcar do mundo e pode expandir ainda mais sua liderança na produção de etanol, oferecendo uma alternativa energética competitiva e limpa. A Bolívia, com suas vastas reservas de lítio, possui um recurso estratégico fundamental para a fabricação de baterias de carros elétricos, tornando-se peça-chave na transição energética mundial. Chile e Argentina também despontam nesse setor, enquanto países africanos, ricos em recursos minerais e em potencial solar, podem se beneficiar da demanda crescente por paineis fotovoltaicos e insumos para tecnologias sustentáveis.
Ao invés de encarar a pauta ambiental como um obstáculo ao crescimento, ela deve ser vista como uma aliança estratégica para o desenvolvimento. A sustentabilidade, quando integrada à lógica de mercado, não restringe, mas amplia as possibilidades de enriquecimento das nações. É por meio da inovação e da abertura econômica que países pobres poderão não apenas se adaptar às mudanças climáticas, mas prosperar com elas, transformando-se em fornecedores globais de soluções sustentáveis. Assim, o combate ao aquecimento global não precisa significar estagnação pelo contrário, pode ser motor de uma nova etapa de crescimento econômico, inclusivo e ambientalmente responsável.
Há também um fator econômico fundamental que raramente é mencionado: a chamada Curva de Kuznets Ambiental. Trata-se de uma hipótese segundo a qual a relação entre crescimento econômico e impacto ambiental segue o formato de um “U invertido”. Nos estágios iniciais de desenvolvimento, a prioridade das sociedades é produzir, gerar empregos e garantir condições mínimas de vida, o que leva a maior uso de combustíveis fósseis, desmatamento e poluição. Porém, à medida que a renda média cresce e os países se tornam mais prósperos, essa tendência se reverte: populações mais ricas passam a demandar qualidade de vida, ar limpo, energia renovável e cidades sustentáveis. Além disso, o avanço tecnológico e a maior disponibilidade de capital permitem que governos e empresas adotem padrões produtivos mais eficientes e ambientalmente corretos.
Em outras palavras, o melhor caminho para os países pobres reduzirem a poluição não é frear seu desenvolvimento, mas sim enriquecer. O crescimento econômico cria os instrumentos necessários para financiar pesquisas, implementar inovações limpas e atender às crescentes exigências sociais por sustentabilidade. Ou seja, prosperidade e proteção ambiental não são objetivos opostos, mas etapas complementares de um mesmo processo de evolução.

Isso indica que o combate ao aquecimento global passa não por frear o crescimento, mas por acelerá-lo de forma sustentável, permitindo que países pobres e em desenvolvimento alcancem níveis de prosperidade que os capacitem a adotar tecnologias limpas. É nesse sentido que a cooperação internacional deve atuar: não impondo barreiras ideológicas ou travas protecionistas, mas fomentando o comércio de tecnologias verdes, compartilhando inovações e abrindo espaço para que o mercado opere sua capacidade transformadora.
*Pedro Henrique Engler Urso é formado em comércio exterior, pós-graduado em Direito da União Europeia pela Universidade de Coimbra, atualmente é estudante de direito e compõe a equipe da 39º Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.