Ciência

Apenas perda de peso? Cientistas criam teste que ajuda a prever outros efeitos do Ozempic no corpo

Estudo analisou a saciedade calórica de cada pessoa e relacionou os resultados com a eficácia do tratamento

Mateus Omena
Mateus Omena

Repórter

Publicado em 2 de outubro de 2025 às 18h35.

Última atualização em 2 de outubro de 2025 às 19h02.

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A busca por bem-estar e mudanças estéticas impulsionaram o uso de canetas emagrecedoras e outros medicamentos para a perda de peso, como Ozempic e Mounjaro. Por outro lado, muitas pessoas ainda encaram dúvidas não apenas sobre a eficácia desses métodos, como também os imprevisíveis efeitos sobre o corpo.

Para responder a essa questão, um grupo de pesquisadores da Mayo Clinic realizou um teste genético que pode prever como as pessoas reagirão a medicamentos para emagrecimento, como os da classe GLP-1. O teste analisa a “saciedade calórica” (CTS, do inglês calories to satiation) de cada pessoa — ou seja, a quantidade de alimento necessária para que ela se sinta satisfeita — e correlaciona essa característica biológica com a eficácia do tratamento.

Os resultados, publicados na revista Cell Metabolism, representam um avanço significativo em direção a terapias mais personalizadas e eficazes para indivíduos que lidam com a obesidade.

"Os pacientes merecem tratamentos que reflitam sua biologia, e não apenas o tamanho dos seus corpos," afirma o Dr. Andres Acosta, gastroenterologista da Mayo Clinic e autor principal do estudo. "Esse teste nos permite oferecer o medicamento certo para a pessoa certa desde o início."

Controle da saciedade

A obesidade é uma condição crônica e complexa que afeta mais de 650 milhões de adultos globalmente. Ela resulta de uma combinação de fatores genéticos, ambientais e comportamentais, que variam de pessoa para pessoa. Isso ajuda a explicar por que as respostas aos tratamentos para perda de peso são tão diferentes entre os indivíduos. No entanto, muitas vezes, as escolhas de tratamento são baseadas em medidas simples, como o índice de massa corporal (IMC), ao invés de considerar os processos biológicos que influenciam o ganho e a perda de peso.

Para entender esses processos, o Dr. Acosta focou na saciedade, o sinal fisiológico que indica ao corpo que a pessoa já comeu o suficiente. Em 2021, ele e sua equipe estabeleceram uma série de fenótipos da obesidade para descrever padrões alimentares. Por exemplo, algumas pessoas com obesidade tendem a consumir refeições muito grandes ("cérebro faminto"), enquanto outras ingerem porções médias, mas fazem lanches com frequência ao longo do dia ("intestino faminto").

Neste estudo, os pesquisadores examinaram a saciedade em quase 800 adultos com obesidade, convidando-os a participar de uma refeição com lasanha, pudim e leite à vontade até se sentirem cheios. Os resultados mostraram uma variação surpreendente: alguns participantes pararam de comer depois de consumir 140 calorias, enquanto outros ingeriram mais de 2 mil calorias. Em média, os homens ingeriram mais calorias que as mulheres.

A equipe investigou possíveis explicações para essa variabilidade. Diversos fatores, como peso corporal, altura, percentual de gordura, relação cintura-quadril e idade — além de hormônios ligados ao apetite, como a grelina e a leptina — tiveram um impacto pequeno. No entanto, nenhum desses fatores explicou a grande diferença na ingestão calórica. Por isso, os pesquisadores recorreram à genética.

Utilizando aprendizado de máquina, a equipe combinou variantes de dez genes conhecidos por afetar a ingestão alimentar em uma métrica única, chamada CTS-GRS (“Escore Genético de Risco para Saciedade Calórica”, do inglês Calories to Satiation Genetic Risk Score). Esse escore, obtido por meio de uma amostra de sangue ou saliva, fornece uma estimativa personalizada do limiar de saciedade esperado para cada pessoa.

Em seguida, os pesquisadores calcularam o CTS-GRS em ensaios clínicos com dois medicamentos aprovados pela FDA: um medicamento de primeira geração para perda de peso, a combinação fentermina-topiramato (nome comercial Qsymia), e um medicamento mais recente da classe GLP-1, a liraglutida (Saxenda).

Uma possível solução

Os resultados mostraram que:

Pessoas com um limiar de saciedade mais alto perderam mais peso com a combinação fentermina-topiramato. Esse medicamento pode ajudar a controlar o tamanho das porções e reduzir a ingestão excessiva de refeições grandes (cérebro faminto).

Pessoas com um limiar de saciedade mais baixo tiveram melhores resultados com a liraglutida. Esse medicamento pode diminuir a fome geral e a frequência de ingestão de alimentos (intestino faminto).

"Com um único teste genético, podemos prever quem tem maior chance de sucesso com dois tipos de medicamentos," comenta o Dr. Acosta. "Isso significa um cuidado mais eficaz e com melhor custo-benefício para os pacientes."

A equipe também conduziu estudos adicionais para prever a resposta à semaglutida, outro medicamento da classe GLP-1 (comercializado como Ozempic e Wegovy), e espera publicar esses resultados em breve. Além disso, estão trabalhando para expandir o teste, incorporando dados do microbioma e do metaboloma, além de desenvolver modelos para prever efeitos colaterais comuns, como náuseas e vômitos.

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