A gratificação de 40% para quem ocupa cargo de confiança é obrigatória e precisa constar separadamente no contracheque. (Tom Merton/Getty Images)
Colaboradora
Publicado em 26 de setembro de 2025 às 17h00.
Gerente, supervisor, coordenador. Se você trabalha em uma empresa, certamente conhece alguém com um desses títulos ou talvez seja você mesmo que ocupe uma dessas funções. Mas será que todo profissional que carrega esse nome no crachá realmente ocupa um cargo de confiança perante a lei trabalhista?
A resposta faz toda a diferença no salário e na rotina do trabalhador. Quem está enquadrado nessa categoria tem direito a uma gratificação especial, mas perde alguns direitos característicos do trabalhador CLT comum. É uma troca que pode ser vantajosa ou não, dependendo de como a empresa aplica as regras. E muitas vezes, o que realmente importa é o que acontece na prática do dia a dia, não apenas o que está registrado no contrato.
Um cargo de confiança é aquela função em que o funcionário atua como representante direto do empregador em determinadas situações. Ele possui poder para tomar decisões importantes sem precisar solicitar autorização constantemente, pode admitir e demitir funcionários e aplicar advertências e suspensões aos subordinados.
A lei trabalhista brasileira, mais especificamente a CLT no artigo 62, estabelece que esses profissionais não possuem horário fixo de trabalho. Sua dedicação é medida pelos resultados que entregam, não pelas horas que permanecem na empresa.
Para os bancários, ainda existe uma regra especial no artigo 224 da CLT que define condições específicas para quem trabalha em instituições financeiras. Mas o princípio permanece o mesmo: ter responsabilidade e autonomia verdadeiras, não apenas no título.
Para identificar se um cargo é realmente de confiança, os juízes do trabalho analisam o que a pessoa faz no dia a dia, não apenas o título que aparece no crachá. E existem algumas características que precisam estar presentes.
A primeira delas é a autonomia para tomar decisões. O funcionário precisa poder organizar seu trabalho da forma que considerar melhor, definir prioridades e resolver problemas sem consultar a chefia. Por isso mesmo, quem ocupa esse cargo não registra ponto, já que organiza a própria rotina.
Outra característica importante é representar o empregador nas decisões. Na prática, significa que quando esse profissional decide algo, é como se fosse o próprio empregador decidindo. Além disso, o salário precisa ser diferenciado, com uma gratificação determinada por lei.
Ter acesso a informações sigilosas da empresa, como senhas de sistemas ou dados financeiros, ajuda a caracterizar o cargo, mas isoladamente não é suficiente. Muitos profissionais trabalham com informações importantes sem possuir o poder de mando.
Quem ocupa cargo de confiança mantém diversos direitos garantidos, como férias, décimo terceiro e FGTS. No entanto, algumas questões mudam em relação aos demais funcionários.
Mesmo sem horário fixo, o trabalhador tem direito ao descanso semanal, preferencialmente aos domingos. Se trabalhar em domingo ou feriado sem folga compensatória em outro dia, a empresa deve pagar o dobro por esse dia trabalhado.
Aqui está a principal diferença, já que não existe pagamento de horas extras para cargo de confiança. Como não há limite de jornada, o funcionário pode trabalhar além das oito horas diárias sem receber adicional por isso.
Quem trabalha no período noturno também não recebe adicional, seguindo a mesma lógica das horas extras. Porém, atenção, se a empresa controlar o horário de alguma forma, esses direitos podem ser reconhecidos judicialmente.
A gratificação de 40% para quem ocupa cargo de confiança é obrigatória e precisa constar separadamente no contracheque. Esse valor integra o cálculo das férias, décimo terceiro e FGTS, aumentando esses benefícios proporcionalmente.
Chegar a um cargo de confiança geralmente acontece por dois caminhos principais. O mais comum é a promoção interna, quando o funcionário já está na empresa e se destaca pelo desempenho, conhecimento técnico e capacidade de liderança. Nesses casos, a empresa reconhece o potencial do colaborador e oferece a oportunidade de assumir maiores responsabilidades.
O segundo caminho é a contratação direta do mercado para posições de gestão. Profissionais com experiência em cargos similares, formação sólida na área e histórico de resultados positivos costumam ser buscados para ocupar essas funções estratégicas. MBAs, especializações e tempo de carreira também pesam nessa seleção.
Independentemente da via de acesso, existem algumas competências-chave para quem almeja esse tipo de posição. A capacidade de tomar decisões sob pressão, habilidade para gerenciar equipes e conflitos, visão estratégica do negócio e excelente comunicação são as características valorizadas.
Aceitar uma promoção para cargo de confiança apresenta aspectos positivos e negativos. Entre os benefícios, o salário aumenta consideravelmente com a gratificação obrigatória, também há o reconhecimento dentro da empresa, participação em reuniões estratégicas e maior visibilidade para futuras promoções.
A questão da flexibilidade de horário também atrai muitos profissionais. Sem a obrigação de registrar ponto, é possível organizar melhor o dia, resolver questões pessoais quando necessário e trabalhar de forma mais independente.
Contudo, existem desvantagens que pesam na decisão. As jornadas podem se estender consideravelmente, já que não há pagamento de hora extra para compensar o trabalho além do expediente normal. A cobrança por resultados também aumenta, e a pressão cotidiana pode afetar a saúde e o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Além disso, a demissão pode ocorrer mais facilmente, bastando a empresa alegar quebra de confiança.
Um gerente de loja que contrata vendedores, estabelece metas e pode dispensar funcionários é um exemplo clássico do cargo de confiança na prática.
Diretores de departamento que administram orçamentos e tomam decisões sobre investimentos também se enquadram nessa categoria. O mesmo vale para supervisores de produção que podem interromper linhas de montagem, realocar pessoas entre setores e aplicar sanções quando necessário.
No setor bancário, gerentes de agência e gerentes de contas empresariais geralmente ocupam cargos de confiança legítimos. Já o caixa bancário ou o analista, mesmo quando recebem títulos diferenciados, raramente possuem o poder decisório necessário para serem enquadrados nessa categoria.
A regra é clara, se a empresa enquadra alguém como cargo de confiança, deve pagar a gratificação correspondente. Não existe meio termo. Ou a empresa paga corretamente e remove o controle de horário, ou mantém o funcionário com todos os direitos trabalhistas normais.
Muitas organizações tentam contornar a legislação, criando cargos com títulos atrativos mas sem pagar a gratificação completa. Continuam exigindo cumprimento de horário, registro de ponto e controle integral, e ainda querem evitar o pagamento de horas extras. Isso configura fraude trabalhista e pode resultar em consequências judiciais sérias.
Quando o trabalhador questiona judicialmente e comprova que não possuía autonomia real, a empresa pode ser condenada a pagar todas as horas extras retroativas, adicional noturno e ainda os reflexos nas férias e décimo terceiro. Por isso, é fundamental fazer as coisas corretamente desde o início.