Maurício Rodrigues, CEO da divisão agrícola da Bayer na América Latina: “Tem gente que é oradora nata; no meu caso, a confiança em se posicionar veio com treino, repetição e muito estudo” (Reinaldo Canato/Bayer/Divulgação)
Repórter
Publicado em 4 de outubro de 2025 às 08h01.
Assim como no campo, onde cada safra depende das sementes plantadas no passado, Maurício Rodriguescolheu na carreira o que cultivou desde cedo: disciplina, curiosidade e coragem para enfrentar o novo. Hoje, ele é presidente da divisão agrícola da Bayer na América Latina e lidera um negócio bilionário que aposta em agricultura regenerativa, tecnologia e sustentabilidade para crescer.
“Eu tive uma trajetória diferente de muitas pessoas negras no país porque meus pais romperam um ciclo pela educação. Eles me deram condições de competir”, afirma o executivo, que perdeu a mãe ainda aos 12 anos e que hoje é um dos poucos CEOs negros no Brasil.
Nascido na Grande São Paulo, filho de gaúchos, escolheu a Engenharia Civil na Poli-USP e iniciou a carreira no mercado financeiro. O destino, porém, o levou à então Monsanto (hoje Bayer), onde entrou pela área de finanças e nunca mais deixou o agronegócio. “Foi uma entrada casual e hoje já somo 26 anos na companhia”, diz Rodrigues, que em junho de 2021 chegou ao posto de CEO da Bayer Crop Science para a América Latina.
“No final, a gente aprender que quem é responsável pela sua própria carreira é você mesmo,” diz o CEO que compartilha os desafios profissionais e do setor no "De frente com CEO", podcast da EXAME.
No início dos anos 2000, performance individual era quase sinônimo de liderança, afirma o CEO. Hoje, ele resume a régua em três eixos comportamentais: curiosidade, colaboração e um ego bem controlado.
“Escutar genuinamente é diferente de fingir que está ouvindo”, diz. “Delegar é parte do trabalho - e um exercício diário de ego,” afirma o executivo.
Para acelerar decisões, a divisão opera com um modelo interno de “Dynamic Shared Ownership” (propriedade compartilhada e dinâmica) que tem como objetivo reduzir as camadas de decisão e dar mais empoderamento às pessoas que estão mais próximas dos problemas.
“É um exercício muito forte de ego, porque eu preciso confiar nas pessoas, acreditar que elas sabem fazer o trabalho e entender que a minha palavra final nem sempre é a mais relevante", diz. "O papel do líder é identificar onde pode agregar, dar direcionamento estratégico e deixar a estrutura caminhar de forma mais eficiente. É menos sobre camadas e mais sobre autonomia.”
Timidez não é defeito, é ponto de atenção, e essa característica Rodrigues venceu com muito estudo. “Eu escutava muito, mas não me posicionava na hora certa”, conta.
Um mentor o provocou a falar mais cedo nas reuniões, com preparo e respeito.
“Tem gente que é oradora nata; no meu caso, a confiança em se posicionar veio com treino, repetição e muito estudo,” afirma Rodrigues.
A experiência internacional foi o outro salto. Rodrigues passou por Estados Unidos e México (2010–2014) e lá entendeu a importância de conhecer novos mundos, o desconforto do novo e a necessidade de ter novos olhares para o negócio que é global.
“Nesses países eu precisei conquistar espaço do zero, em outra cultura e em outro idioma. Essa vivência ampliou meu repertório e me deu uma visão diferente sobre o Brasil”, diz. “Olhar o país de fora aumenta a responsabilidade, mas também mostra onde precisamos evoluir e como podemos contribuir de forma mais global.”
A diversidade e a inclusão aparecem no discurso de Rodrigues não como iniciativas pontuais, mas como valores inegociáveis da Bayer. Ele destaca o grupo de afinidade Biafro e os programas de trainees voltados à formação de lideranças negras como exemplos de ações estruturadas, sempre guiadas pela meta de refletir a sociedade em que a empresa está inserida.
“Diversidade e inclusão não são projetos, são valores inegociáveis. Queremos que a Bayer reflita a sociedade em que está inserida. Avançamos muito, principalmente em gênero e raça, mas ainda temos um caminho a percorrer. O importante é a consistência, porque é ela que vence metas episódicas,” diz Rodrigues.
Fundada em 1863, a Bayer se consolidou como uma das maiores multinacionais de ciências da vida, com presença em 80 países e 354 unidades ao redor do mundo. A companhia emprega cerca de 99,7 mil colaboradores, atuando nas áreas agrícola, farmacêutica e de consumo.
Em 2024, a multinacional registrou 46,6 bilhões de euros em vendas (alta de 0,7%) e Ebitda de 10,1 bilhões de euros (queda de 13,5%). O fluxo de caixa livre somou 3,1 bilhões de euros, um salto de 137% em relação ao ano anterior. Já os investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) atingiram 6,2 bilhões de euros, avanço de 15,6%.
A região da América Latina foi responsável por 6,25 bilhões de euros em vendas da divisão agrícola em 2024. São cerca de 13 mil funcionários, sendo 800 em P&D e 2,9 mil em Product Supply, com presença em 19 países e sedes em quatro deles.
No Brasil, onde está presente desde 1896, a Bayer conta com 3.300 funcionários na divisão agrícola e 28 centros de inovação.