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Câmara aprova projeto que garante licença menstrual de até 2 dias por mês

Se aprovada no Senado, o Brasil passará a integrar o grupo de países que já reconhecem o direito à licença menstrual - entre eles, Espanha, Japão, Indonésia e Coreia do Sul

De autoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e relatado pela Professora Marcivania (PCdoB-AP), o texto segue agora para análise no Senado Federal (Alison Calazans/Getty Images)

De autoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e relatado pela Professora Marcivania (PCdoB-AP), o texto segue agora para análise no Senado Federal (Alison Calazans/Getty Images)

Publicado em 29 de outubro de 2025 às 12h35.

Última atualização em 29 de outubro de 2025 às 12h36.

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A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira, 28, o Projeto de Lei 1249/22, que garante licença de até dois dias consecutivos por mês para mulheres com sintomas menstruais graves. De autoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e relatado pela Professora Marcivania (PCdoB-AP), o texto segue agora para análise no Senado Federal.

“Cerca de 15% das mulheres enfrentam sintomas graves, com fortes dores na região inferior do abdômen e cólicas intensas, que chegam, muitas vezes, a prejudicar a rotina”, afirma a deputada Feghali.

O benefício será concedido a trabalhadoras com carteira assinada, empregadas domésticas e estagiárias, mediante laudo médico que comprove a impossibilidade temporária de exercer as atividades.

O afastamento será remunerado, e o Poder Executivo ainda definirá as regras sobre a validade, apresentação e renovação dos laudos médicos.

Uma lei que já existe no Japão desde 1940

Se aprovada também no Senado, o Brasil passará a integrar o grupo de países que já reconhecem o direito à licença menstrual — entre eles, Espanha, Japão, Indonésia e Coreia do Sul.

“O Japão, por exemplo, já prevê licença menstrual desde a década de 1940, e países como Indonésia, Coreia do Sul e Taiwan também reconhecem esse direito”, explica Tiago Santos, VP da Sesame HR, empresa espanhola de tecnologia voltada à gestão de pessoas.

Morando há anos na Espanha, Santos lembra que o país europeu aprovou recentemente uma lei semelhante, garantindo licença para mulheres com sintomas incapacitantes durante o ciclo menstrual.

“Foi um marco importante na Europa — e especialmente relevante para nós, na Sesame HR, que temos uma forte presença no mercado espanhol. Essa tendência global mostra que o tema está ganhando espaço nas agendas públicas e corporativas”, afirma.

Para ele, o projeto brasileiro representa “um avanço civilizatório”.
“É uma medida justa e oportuna. Reconhece uma condição de saúde que afeta milhões de mulheres e que, por muito tempo, foi invisibilizada no ambiente de trabalho”, diz.

Como aplicar no Brasil?

A questão, agora, é como transformar o texto de lei em prática cotidiana. E é nesse ponto que especialistas pedem cautela.

Para Priscilla Couto, especialista em liderança e carreira femininas, o avanço é inegável — mas precisa vir acompanhado de maturidade cultural e gestão responsável.

“A aprovação da licença menstrual reconhece algo biológico e recorrente, que afeta milhões de mulheres, especialmente as que sofrem com cólicas severas e endometriose”, diz.

Ela cita dados que reforçam a urgência da discussão: segundo a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO), 20% das mulheres no mundo têm sintomas incapacitantes durante o ciclo. E uma pesquisa da Always (P&G, 2023) mostra que 67% das brasileiras já trabalharam com dor intensa por medo de serem vistas como menos comprometidas.

“O risco é a lei nascer certa, mas ser aplicada em ambientes imaturos, onde o tema ainda é tabu ou tratado como ‘folga extra’”, alerta.

Couto lembra que, na Espanha, sindicatos chegaram a denunciar que algumas empresas evitaram contratar mulheres em idade fértil após a aprovação da medida. “A boa política precisa vir acompanhada de fiscalização e de políticas de equidade para não gerar retrocessos disfarçados.”

“Tema precisa sair da sombra”

Para Isis Borge, sócia-diretora da Assigna e sócia do Talenses Group, a proposta é bem-intencionada, mas exige cuidado na implementação.
“Existe o risco de que algumas empresas passem a evitar a contratação de mulheres, reforçando barreiras que ainda enfrentamos no mercado de trabalho, especialmente considerando o histórico de estigmas em torno da licença maternidade”, afirma.

O maior ganho, segundo ela, está em trazer o tema à tona dentro das empresas.

“Falar sobre menstruação, gravidez e menopausa ajuda a quebrar tabus e a normalizar a conversa sobre saúde da mulher no ambiente corporativo. Quanto mais falamos sobre isso, mais avançamos rumo a uma cultura inclusiva e aberta.”

Apesar disso, Borge avalia que a maioria das empresas brasileiras ainda não está pronta.
“Poucas devem aderir de bom grado, porque não é um benefício comum hoje. É um tema complexo de gerenciar, considerando as demandas e entregas das equipes.”

Confiança, estrutura e equilíbrio

Para Elcio Paulo Teixeira, CEO da Heach Recursos Humanos, a medida reconhece uma necessidade legítima, mas precisa ser aplicada com equilíbrio.

“O projeto representa um avanço importante, mas pode gerar resistência na contratação de mulheres em determinadas funções. É preciso equilibrar o direito individual e os impactos práticos no mercado de trabalho”, afirma.

Ele destaca que o principal desafio será estruturar políticas internas e capacitar lideranças.
“Será necessário criar protocolos de confidencialidade e preparar gestores para lidar com o tema de forma empática e respeitosa. A chave é tratar a licença como questão de saúde ocupacional — e não de privilégio.”

O caminho da maturidade

Para especialistas, o sucesso da licença menstrual dependerá de dois pilares: regulamentação clara e cultura organizacional madura.
Priscilla Couto resume os passos essenciais:

  1. Definir regras claras sobre laudo médico e remuneração;
  2. Criar protocolos internos que assegurem privacidade;
  3. Capacitar gestores para uma comunicação empática;
  4. Fortalecer a cultura de confiança — sem medo de uso do direito.

“Nenhuma lei funciona se a mulher sentir medo de usá-la”, diz Couto. “O sucesso dessa medida depende menos do jurídico e mais da maturidade das relações de trabalho.”

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