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COP30, em Belém, será palco de oportunidade histórica do Brasil (Anderson Coelho/Getty Images)
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Publicado em 23 de outubro de 2025 às 09h51.
Por Mariana Plum, Valéria Amorim, Idayane Ferreira.
A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada no Brasil, coloca o país diante de uma oportunidade histórica.
Pela primeira vez, uma conferência global sobre o clima acontece em solo brasileiro em um momento em que a crise climática deixou de ser apenas um desafio ambiental: tornou-se um fator central de soberania, estabilidade e defesa nacional.
Os impactos do aquecimento global afetam diretamente as bases que sustentam o funcionamento dos Estados. Enchentes, secas e desastres naturais provocam deslocamentos populacionais, comprometem o abastecimento de energia e alimentos, desestruturam economias locais e ampliam desigualdades sociais.
Cada evento extremo pressiona instituições públicas, aumenta gastos emergenciais e ameaça a coesão social. Em um cenário como esse, o clima se torna uma variável de (in)segurança.
Diversos países já incorporaram esse entendimento em suas políticas de defesa e diplomacia. Os Estados Unidos, a União Europeia e as nações do Sudeste Asiático tratam as mudanças climáticas como multiplicadoras de ameaças, sejam elas econômicas, humanitárias ou estratégicas.
Isso se reflete no parecer emitido pelo Congresso Nacional via Comissão Mista de Controle de Atividade de Inteligência que, ao apreciar os documentos norteadores da Defesa Nacional, a Política, a Estratégia e o Livro Branco de Defesa, orienta a inclusão de considerações sobre mudanças climáticas nos documentos.
Essa sugestão busca garantir a conexão entre a Política Nacional de Defesa (PND) e a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), uma vez que as duas “políticas tratam de questões diretamente relacionadas à segurança nacional, ao desenvolvimento sustentável e à adaptação e mitigação dos impactos das mudanças climáticas” (CCAI, 2024).
Um país com a dimensão territorial e a diversidade socioambiental do nosso não pode se dar ao luxo de tratar o clima como pauta setorial.
A segurança climática, portanto, transcende a simples mitigação de emissões e se estabelece, em um sentido mais amplo, como a garantia de estabilidade e resiliência contras as ameaças do clima.
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o conceito refere-se diretamente "aos impactos da crise climática na paz e na segurança, especialmente em ambientes frágeis e afetados por conflitos” (PNUD, 2023).
As mudanças climáticas podem desencadear a competição por recursos naturais, a precariedade dos meios de subsistência e o deslocamento em massa, elevando o risco de tensões e instabilidade social.
Garantir a resiliência nacional exige uma nova postura estratégica, onde a gestão desses riscos é integrada ao planejamento de longo prazo, reconhecendo o meio ambiente como elemento indissociável da estabilidade nacional.
Como defende o Centro Soberania e Clima, a floresta deve ser compreendida como infraestrutura crítica para o país pois concentra não apenas uma das maiores reservas de biodiversidade do planeta, mas também uma das principais fontes de estabilidade climática global.
O desmatamento e a degradação ambiental da região têm efeitos que ultrapassam suas fronteiras, interferindo no regime de chuvas, na segurança hídrica e na própria capacidade produtiva do país.
Ao mesmo tempo, a floresta é um território de disputas políticas, econômicas e geopolíticas. O que acontece na Amazônia hoje define parte do papel que o Brasil terá no mundo nas próximas décadas.
Durante a aula inaugural da 2ª edição do curso “Mudança do Clima e as Agendas de Segurança e Defesa”, promovido pela Escola Soberania e Clima, especialistas do Ministério das Relações Exteriores, das Forças Armadas, da ONU, da academia e do setor privado discutiram como o país pode se preparar para esse novo tempo.
As conclusões apontam para um consenso: o Brasil precisa de uma visão estratégica e duradoura para integrar meio ambiente, segurança e desenvolvimento. É preciso incorporar o risco climático à formulação de políticas públicas e transformar o conhecimento em ação concreta.
Envolve repensar planos de segurança nacional, políticas energéticas, agricultura, planejamento urbano e infraestrutura. Também passa pela cooperação internacional, seja para o financiamento de tecnologias limpas, seja para a proteção de biomas estratégicos. Mais do que nunca, a segurança climática depende da diplomacia, da ciência e da educação.
E é nesse ponto que o Brasil tem uma vantagem comparativa importante: a capacidade de liderar pela formação e pelo conhecimento.
Iniciativas como a Escola Soberania e Clima e o Centro Soberania e Clima vêm construindo um espaço de diálogo qualificado entre academia, segurança, defesa, diplomacia e sociedade civil.
Ao promover cursos, estudos e debates públicos, essas instituições contribuem para formar uma geração capaz de compreender e responder aos desafios complexos da emergência climática.
A COP30 será um marco. Mas sua relevância não se medirá apenas pelos acordos firmados ou pelas metas de carbono anunciadas. O verdadeiro legado estará em como o Brasil e o mundo incorporarão a dimensão da segurança climática às suas decisões políticas e sociais.
Não há soberania possível sem estabilidade ambiental. E não há estabilidade sem conhecimento. O desafio que temos pela frente é transformar informação em estratégia, ciência em política pública e formação em preparo coletivo. O futuro exige isso, e ele já começou.