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Lágrimas, aplausos e disputa pela vaga: tudo sobre a despedida antecipada de Barroso do STF

Ministro oficializou a decisão dez dias após deixar a presidência do Supremo; cotados para a vaga incluem Jorge Messias, Rodrigo Pacheco e Bruno Dantas

Agência o Globo
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Publicado em 10 de outubro de 2025 às 08h23.

O ministro Luís Roberto Barroso anunciou ontem que deixará o Supremo Tribunal Federal (STF) de forma antecipada e abriu caminho para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fazer uma indicação à Corte.

São cotados para a vaga o advogado-geral da União, Jorge Messias; o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG); e o ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU).

Barroso já vinha dando sinais de que se aposentaria antes do prazo — ele poderia ficar até 2033, quando completará 75 anos. A oficialização ocorreu ao fim da sessão do plenário, dez dias após deixar a presidência da Corte, posto assumido pelo ministro Edson Fachin.

“É hora de seguir novos rumos”, afirmou Barroso.

"Não tenho apego ao poder e gostaria de viver a vida que me resta sem as responsabilidades do cargo. Os sacrifícios e os ônus da nossa profissão acabam se transferindo aos familiares e às pessoas queridas. Foi uma decisão longamente amadurecida, que nada tem a ver com fatos da conjuntura atual. É a última sessão plenária de que participo" disse, que se emocionou no discurso e foi aplaudido pelos colegas ao final.

A aposentadoria foi comunicada a Fachin e ao ministro Alexandre de Moraes na noite de quarta-feira. Barroso disse que tinha marcado uma conversa com Lula na quarta-feira para avisá-lo, mas a reunião foi desmarcada diante da crise política com a iminente derrota na Câmara sobre a Medida Provisória (MP) alternativa ao aumento do IOF, o que acabou se consumando.

O ministro lembrou, no entanto, que há dois anos falou com Lula sobre a “intenção” de deixar o Supremo após o período na presidência.

Defesa da democracia

No discurso de despedida, Barroso fez elogios aos colegas e disse ser “grato” à ex-presidente Dilma Rousseff, responsável por sua indicação, há doze anos.

O ministro também afirmou que Lula fez uma “defesa firme” quando o STF “esteve sob ataque”. Após o discurso de despedida, Barroso recebeu elogios de colegas, como Fachin, Gilmar Mendes e Luiz Fux, que o chamou de “grande constitucionalista, caracterizado pela integridade profunda”.

"Sua contribuição para a democracia brasileira transcende os votos e as decisões. Vossa Excelência ajudou a construir uma cultura constitucional mais sólida, mais consciente, mais comprometida com os direitos fundamentais", disse Fachin.

Gilmar, por sua vez, que viveu embates com Barroso, afirmou que não tem “mágoas”. Eles tiveram duas grandes discussões no plenário do STF, uma em 2017 e outra em 2018.

Lula definirá sucessor

Agora, caberá a Lula definir o substituto, o que auxiliares acreditam que acontecerá de maneira célere. Será a 11ª vez que o petista vai apontar um ministro do Supremo em seus três mandatos. Barroso, por sua vez, afirmou que não tem planos políticos nem de assumir uma embaixada e que vai se dedicar ao mundo acadêmico nos próximos meses, com passagens pela Alemanha e pela França.

O magistrado também pontuou estar tranquilo com a sucessão e destacou que Lula vai “acertar de novo” na escolha, em referência às indicações já feitas neste mandato, de Flávio Dino e Cristiano Zanin. Ministros do STF avaliam que a tendência é que não haja “surpresas” e o escolhido seja um dos nomes que já circulam como cotados.

Cotados: Jorge Messias, Pacheco e Dantas

Um deles é Jorge Messias, cujo nome já havia sido citado quando a ministra Rosa Weber se aposentou, em 2023, vaga que ficou com Dino. A chefia da AGU oferece a Messias proximidade com Lula e com o STF. Na quarta-feira, por exemplo, ele esteve com Fachin.

Pessoas próximas a Lula afirmam que Messias pode ganhar força caso o presidente decida escolher alguém com atuação mais voltada a temas sociais, o que conversaria com o tom dos seus discursos políticos.

Nos últimos meses, o advogado-geral da União se aproximou mais do presidente. O ministro da AGU teve atuação na crise do INSS e também na contratação de escritório de advocacia nos Estados Unidos para contestar as tarifas impostas por Donald Trump.

Messias tem uma ligação antiga com o PT, mesmo não sendo filiado ao partido. No governo Dilma, ele foi subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil. Seu nome tem apoio de ministros do Palácio do Planalto. Além disso, ele é evangélico da Igreja Batista, o que pode indicar uma sinalização de Lula a essa parcela da população, que, em geral, tem maior rejeição ao PT. Interlocutores do Planalto ponderam, no entanto, que é necessário o aval do Senado e que haverá uma conversa com o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP).

Nesse cenário, surge com fôlego o nome do ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), aliado de Alcolumbre e com bom trânsito na Casa. Gilmar também já defendeu publicamente a nomeação de Pacheco à Corte.

Aliados dizem que Lula gosta de Pacheco, assim como de Bruno Dantas. Uma hipótese seria indicar o ministro do TCU, que tem apoio de parte do MDB, para o STF e o senador para a sua vaga na Corte de Contas, contemplando os dois.

Interlocutores de Dantas ressaltam que ele mantém contato com Lula, mesmo após ter deixado a presidência do TCU e também apontam para algumas decisões dadas por ele no tribunal consideradas decisivas para o governo, como a que liberou R$ 6 bilhões em recursos para o “Pé-de-meia”.

Sinais da saída

Apesar de a decisão ter sido formalizada ontem, ministros do STF avaliavam que uma decisão sobre a aposentadoria antecipada ocorreria até o final do ano. Na segunda-feira, Barroso disse que estava “encerrando a sua carreira” e, na terça-feira, afirmou que “foi juiz por 12 anos”. Depois, se corrigiu, ajustando o tempo verbal para o presente. Além disso, ele antecipou votos, como no caso do julgamento da ação que pode liberar a construção da Ferrogrão.

Interlocutores do Supremo relatam que o gabinete do ministro já vinha sentindo os efeitos da movimentação. Desde antes de sua saída da presidência, assessores e integrantes da equipe passaram a buscar novos locais de trabalho e postos para se realocarem.

Trajetória e legado

Barroso chegou à Corte após uma carreira na advocacia voltada para a defesa de causas constitucionais e de direitos fundamentais. Ao longo dos 12 anos no STF, cargo a que foi indicado em substituição a Ayres Britto, relatou casos de grande repercussão.

Em 2017, o Supremo considerou constitucional uma lei de 2014 que reserva aos negros 20% das vagas oferecidas em concursos públicos. Como relator, Barroso argumentou que a legislação era reparação histórica, devido à escravidão e ao racismo estrutural da sociedade.

A partir de 2020, esteve à frente de uma ação apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e por seis partidos políticos contra falhas e omissões do poder público no combate à pandemia de Covid-19 em relação aos povos indígenas. O ministro determinou a retirada de invasores ilegais dos territórios, entre outras decisões.

Também esteve à frente de ações que discutiram o porte de maconha para uso pessoal e foi o responsável por acompanhar as execuções da ação penal que puniu os envolvidos no mensalão.

Como presidente do STF, coordenou o tribunal durante o julgamento que levou à condenação de envolvidos na tentativa de golpe de Estado, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro. Nessa posição, fez discursos em defesa da democracia e da lisura do processo eleitoral brasileiro.

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