Andrei Roman: CEO da AtlasIntel defende que a direita precisa se esforçar para criar um grande tema (Germano Lüders /Exame)
Publicado em 12 de outubro de 2025 às 09h45.
Última atualização em 12 de outubro de 2025 às 09h48.
Existe a crença no meio político de que um terço do eleitorado está em disputa para a eleição presidencial do ano que vem, aqueles que não se identificam como petistas e bolsonaristas. Andrei Roman, cientista político e CEO do instituto de pesquisa AtlasIntel, defende que o número, na verdade, é menor.
"Na verdade, parte desse eleitor que não se diz nem petista e nem bolsonarista tem uma identificação política não pelo que ele gosta, mas pelo que ele não gosta, pela negação de algo", afirma Roman em entrevista exclusiva à EXAME.
À frente do instituto que acertou o resultado da última eleição americana e do pleito na Argentina, Roman calcula que um terço do eleitorado seja lulista e outro terço, bolsonarista.
"Quando perguntamos nas nossas pesquisas, o bolsonarista ocupa mais ou menos um terço do eleitorado, e o petista também mais ou menos um terço. Então, você pensaria que tem um terço livre. Mas essa não é a conta", afirma.
Em sua lógica, ao excluir esses eleitores que são anti-Lula ou anti-Bolsonaro, apenas 10% estão em realmente em disputa e eles são, entre outras características, principalmente neutros e desinteressados pela política.
"A maioria desses 10% é de fato formada por um eleitor desinteressado. É apolítico, não gosta dos políticos, acha que todos os partidos são corruptos e bandidos, que todo mundo mente", diz.
O cientista política aponta que esse será o eleitor importante para as campanhas. Eles têm como caracteristas menos escolaridade, estão concentrados na classe C e, no recorte de gênero, composto por mais mulheres do que homens.
"Tem essas características e ao mesmo tempo pode ser bastante fragmentado. Esse eleitor é representado em sua maioria nesses perfis que citei, mas isso não define todo o 10%. Não vai ser apenas focando em mulheres de classe C com ensino médio que você vai resolver [a campanha]", afirma.
A conquista dessas pessoas passa por apresentar algo novo, explica Roman. Ele cita outisders pelo mundo, como Javier Milei, na Argentina, e Nayib Bukele, em El Salvador, que conseguiram conquistar esse tipo de eleitor. No Brasil, o exemplo mais próximo disso, segundo Andrei, foi o influenciador Pablo Marçal, que disputou a eleição pela prefeitura de São Paulo em 2024.
"Ele se conectou com esse público em termos culturais e de aspirações de vida. Marçal falou sobre temas relevantes para o eleitor que os outros políticos não falam. E foi algo que não tem como não prestar atenção porque ele vem, grita, e esculhamba todo mundo. O eleitor pode estar desinteressado em relação à vida eleitoral, mas esse cara [candidato] não vai deixar ele ficar desinteressado", afirma.
Na entrevista, Andrei destacou ainda que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vive um bom momento e é favorito. Mas caso a oposição consiga emplacar um grande tema na eleição, como segurança pública e corrupção, a disputa pode se abrir. A falta de uma liderança clara e organização, porém, é o desafio.
"Eu diria que ou a oposição vai conseguir achar uma pauta dominante para a eleição, ou simplesmente não vai existir uma pauta dominante, o que favorece o governo", afirma.
Já é possível captar qual será o grande tema da eleição do ano que vem?
Para responder a essa pergunta, primeiro preciso passar por esse atual governo. Diria que o grande fracasso do governo Lula 3 é a incapacidade de atualizar o seu discurso e programa político. De efetivamente impor uma pauta, uma narrativa ou um eixo dominante em termos de marca. É algo que prejudicou muito o governo no início, está afetando menos agora, mas não porque esse problema foi resolvido, mas porque aconteceram alguns eventos conjunturais que ajudaram o governo a escapar dessa percepção de que não existe um uma pauta, uma visão central.
A fraqueza da oposição, a falta de liderança da oposição e principalmente o conflito com a administração de Trump fizeram com que essa recuperação do discurso de soberania nacional pelo governo tenha oferecido uma âncora para mostrar o desempenho do Lula de uma forma mais positiva.
E sempre quando o ângulo muda para o papel de liderança internacional do Lula, tradicionalmente, o público brasileiro se orgulha disso. O Lula é bastante reconhecido a nível internacional como um líder marcante. No entanto, isso me parece temporário. E acredito que até a eleição dificilmente isso vai se manter.
Isso quer dizer que essa falta de âncora e narrativa política vai fazer com que provavelmente não exista uma pauta central da eleição que seja imposta pelo governo, pelo lado do Lula. Se não conseguiu fazer isso ao longo de três anos de governo, dificilmente conseguirá fazer no quarto ano, dificilmente conseguirá fazer isso na eleição. Do lado do governo, não existe uma pauta clara imposta por eles. Eu diria que ou a oposição vai conseguir achar uma pauta dominante para a eleição, ou simplesmente não vai existir uma pauta dominante.
Como foi em 2022?
Exato. Afinal, não teve um tema macro muito claro e forte. Se não existir um tema dominante, se ficar no micro, a conjuntura é mais favorável para o governo. Porque tem um pouco de melhora de tudo atualmente, um pouco de melhora econômica, melhora de expectativas sobre a inflação, um pouco de melhora internamente como o Brasil está se relacionando no mundo em situações de conjuntura externa, inclusive com a relação com Trump. Tem uma certa melhora pontual de programas do governo em diversas áreas. O acúmulo é positivo.
Finalmente parece que algumas coisas estão andando e que o governo está conseguindo mostrar algum legado mais relevante. A pauta de isenção do Imposto de Renda, por exemplo, é algo que poderá, dentro dessa desse conjunto de exemplos, ser legado positivo, impactante e mais claro. Mas são micros: 'Olha essa média aqui, essa ambulância, esse esforço na educação com o Pé-de-Meia, o meio ambiente na COP'. Com essa dispersão de pautas que o governo está mostrando algo mais positivo na margem.
E se existir uma pauta?
Se isso acontecer, é porque provavelmente ela foi imposta pela oposição. [Nesse cenário,] a oposição finalmente achou uma liderança, achou uma voz e trouxe uma pauta contra o governo com um eixo de discussão central da campanha. E se isso acontecer é porque provavelmente a campanha vai ser pior para o governo do que seria em um cenário de dispersão de pautas.
Qual seria uma pauta que poderia ser imposta pela oposição?
Do meu ponto de vista, tem duas possibilidades claras em termos de pauta central para oposição. E acho que pode existir até uma junção delas. Pode ser uma pauta muito focada em segurança pública, porque existe de fato uma emergência nessa área em algumas regiões do país, como no Nordeste, por exemplo. A situação em São Paulo também não é das melhores.
Mas o que há de novo é que tem regiões onde não existia essa preocupação antes e agora é algo bem novo e está erodindo bastante também na popularidade do governo e de governadores alinhados. Estados como Bahia e Ceará observam um avanço das facções. E também no Rio de Janeiro. Existe um medo do crime organizado quando se trata de facção, que assusta bastante e cada vez mais está virando também um tema cultural.
O que significa a questão de segurança como tema cultural?
Nós estamos vendo uma celebração do crime em termos artísticos, em música, em expressões de jovens, por exemplo, que estão se tatuando com símbolos dessas facções que estão de certa forma reverberando todo um repertório cultural cultural desse mundo. E isso está gerando de certa forma uma guerra cultural, mas existe uma uma expressão cultural que tende a gerar uma contrarreação.
Essa contrarreação da maioria tende a ser bastante contundente e forte. Uma negação de que 'não é isso que é a nossa cultura, nosso valores e a nossa nação. E que não é isso que deveria ser a nossa política, não é isso que o nosso presidente deveria representar'.
Caso um candidato for abraçar, de certa forma, essa pauta de batalhar contra o crime e, inclusive, se aproveitar desses aspectos culturais para tratar o tema, entendo que isso pode render frutos bastante interessante. É aproveitar o tema de uma forma bem especifica. Juntar segurança pública com um pouco do repertório cultural em torno do crime organizado.
Qual seria um segundo tema?
Essa discussão pode ser de alguma forma ampliada quando eu estava falando de uma de uma segunda questão, que poderia ser mais uma vez o tema da corrupção. Não estamos falando muito sobre isso, mas existiu um grande escândalo de corrupção, o do INSS.
Vejo que ele foi mal aproveitado pela oposição por um contexto de falta de liderança, principalmente porque o foco foi capturado pelo julgamento de Bolsonaro, do golpe de Estado, de quem que liderará a oposição, de quem será o candidato, e esqueceram de fazer política e capitalizar em um tema relevante, que determinou uma queda muito rápida e espetacular de aprovação do governo.
Eles deixaram simplesmente sumir do noticiário e da discussão política. Mas o escândalo estava aí. E esse poderia ser um segundo tema.
E qual seria a união dessas questões?
Entendo que se a direta for dar certo em termos de articular uma pauta dominante da campanha seria algo sobre decadência moral do país. Você junta a penetração do crime organizado na sociedade com toda a questão da corrupção e empacota isso de uma forma que é representativa do legado do atual governo para o país. É possível falar sobre a decadência moral com a emergência de ser combatida por uma candidatura da direita.
Em sua avaliação, algum nome hoje poderia capturar essa retórica?
Acho que [o governado de Goiás] Ronaldo Caiado poderia ser alguém que poderia incorporar bem. Ele é um pouco mais velho, tem aquela estatura alta, um cara que projeta pela imagem e postura e tem um case de ter sido um dos melhores governadores na área de segurança. E também nunca foi acusado de nada estranho ou ligado a corrupção. Acho que hoje ele tá fazendo isso menos do que poderia.
Mas todos podem de certa forma. [O governador do Paraná] Ratinho Jr. ter um bom marqueteiro pode explorar bem o tema, o [governador de Minas Gerais Romeu] Zema pode fazer isso e [governador do Rio Grande do Sul] Eduardo Leite também, se o Ratinho não for o candidato. Qualquer um deles explorando esses temas, pode capitalizar de forma bastante interessante.
Romeu Zema, Ronaldo Caiado e Ratinho Júnior são nomes presidenciáveis (Expozebu /Divulgação)
E o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas?
Ele falou que não é mais candidato.
Como você pensa o eleitorado brasileiro hoje estruturalmente, olhando para petistas e bolsonaristas? Nesse contexto, você concorda com a percepção que Lula tem um teto de votos baixo?
É correto. Lula tem um teto baixo. Ele tem um teto baixo por causa de uma sedimentação identitária do eleitor.
Em quanto você estima esse teto em termos de votos válidos?
Na melhor das hipótese 55%. E na pior das hipóteses 45%. Estamos navegando por essa banda.
"Lula tem um teto [de votos] baixo por causa de uma sedimentação identitária do eleitor" - Andrei Roman, CEO da AtlasIntel
Como você entende esses 10% de diferença no potencial de voto de Lula?
Entre 45% e 55%, identificamos 10% do eleitorado com um perfil diferente. Quando perguntamos nas nossas pesquisas, o bolsonarista ocupa mais ou menos um terço do eleitorado, e o petista também mais ou menos um terço. Então, você pensaria que tem um terço livre. Mas essa não é a conta.
Na verdade, parte desse eleitor que não se diz nem petista e nem bolsonarista, ainda tem uma identificação política não pelo que ele gosta, mas pelo que ele não gosta, pela negação de algo.
Existe o eleitor que realmente não gosta do Bolsonaro, mas também não gosta tanto do Lula, embora realmente o dominante dele seja não gostar do Bolsonaro. Por isso, ele pode aderir de maneira oportunista ao Lula, não por forte convicção, mas para barrar algo que ele realmente acha que é muito ruim para o país.
Da mesma forma existe um eleitor que realmente não gosta do Lula. Se for o Bolsonaro, ou qualquer opção, mesmo sem tanta simpatia por esse nome, ele não quer o Lula. Quando tiramos desse terço do eleitorado que não é nem petista, nem bolsonarista, os eleitores da negação do outro, temos de fato apenas 10% dos eleitores que realmente não são nem petistas, nem bolsonaristas e nem gostam do Bolsonaro ou do Lula mais do que do outro ou rejeita mais que o outro. Eles são realmente neutros.
Mas por que eles são neutros?
Não é nada ligado a um eleitor centrista radical pragmático que acha que existem coisas boas nos dois lados e que não gosta de briga política. Quando pegamos as pesquisas, vemos que esse perfil de eleitor não passa de 2%.
A maioria desses 10% é de fato um eleitor desinteressado. É apolítico, não gosta dos políticos, acha que todos os partidos são corruptos e bandidos, que todo mundo mente. E que ninguém vai ajudá-lo de verdade. Ele pensa que está sozinho para fazer o melhor para si e para a sua família e que luta por isso.
Pode até ser um eleitor que se iludiu no passado com alguma figura, mas hoje não se convence com mais ninguém. E também não quer mais prestar mais atenção e prefere assistir seu jogo de futebol, sua novela, e tomar a sua cerveja e ficar longe. Esses são os 10%.
E quem são esses 10% olhando para fatores demográficos? Esse parece ser o eleitor que as campanhas terão que buscar, certo?
Sim. É um eleitor bastante importante para as campanhas. Ele tende ser um pouco mais desinteressado. Ele é menos escolarizado, mais concentrado na classe C. São mais mulheres do que homens. Tem essas características e ao mesmo tempo pode ser bastante fragmentado.
Esse eleitor é representado em sua maioria nesses perfis que citei, mas isso não define todo esse 10%. Não vai ser apenas focando em mulheres de classe C com ensino médio que você vai resolver. Ele está super representado nesse segmento, mas não é todo mundo.
Que tipo de discurso pode conquistar esse eleitor?
Geralmente esse eleitor se interessa quando há alguma coisa nova, que descobre como algum diferente do que tinha antes. Um outsider em geral tende a ser um tipo de pessoa que pode mobilizar esse eleitorado melhor, alguém como o Javier Milei, como Nayib Bukele.
O Pablo Marçal é um excelente exemplo. Em São Paulo, se você olha o mapa da votação do Marçal, ele foi bem em regiões que antigamente eram fortes mais para a esquerda. Ele entrou no nicho de uma classe social de entregadores de aplicativo, motoristas de Uber e um público masculino. E conseguiu encontrar basicamente as vulnerabilidade dos seus principais adversários na corrida.
Ele se conectou com esse público em termos culturais e de aspirações de vida. Marçal falou sobre temas relevantes para o eleitor que os outros políticos não falam. E foi algo que não tem como não prestar atenção porque ele vem, grita, e esculhamba todo mundo. O eleitor pode estar desinteressado em relação à vida eleitoral, mas esse cara [candidato] não vai deixar ele ficar desinteressado.
O momento em que o candidato José Luiz Datena agride o candidato Pablo Marçal durante debate da TV Cultura nas eleições de 2024 (TV Cultura/Youtube/Reprodução)
Há chance de um fator Marçal na eleição presidencial?
Acho que é um pouco prematuro falar sobre isso. Depende muito se Tarcísio for ou não for candidato. Porque se ele não for candidato, ele aumenta o espaço de eleitores órfãos disponíveis olhando para alguma alternativa. É mais fácil vir um candidato como Marçal na corrida presidencial no momento em que Bolsonaro não tem um candidato. Essa é a primeira análise para pensar em um potencial espaço para um outsider. Se Tarcísio for candidato, esse espaço diminui muito.
E chegar no primeiro turno fragmentado é pior, melhor ou indiferente para a oposição?
O primeiro desafio da direita é fazer com que Lula não ganhe a eleição no primeiro turno. Se a gente for analisar a eleição passada, as candidaturas que existiam fragmentavam mais o campo de centro-esquerda que o campo de direita, no meu ponto de vista. Tinha Simone Tebet e Ciro Gomes. Ciro, basicamente, é um grande nome de esquerda, e Simone, uma mulher com pauta moderada que capturava parte do eleitor letrado mais à esquerda.
Mas essa é uma possibilidade real?
Lula teve 48,5% de votos no primeiro turno em 2022, por isso a ideia de que ele poderia vencer no primeiro turno essa próxima eleição é factível, ainda mais quando a recuperação dos índices de aprovação é basicamente um consenso entre as pesquisas.
Na nossa pesquisa, ele já está com 50% de aprovação. Se ele tem 50% de aprovação e não tem candidatura para fragmentar esse espaço progressista, por que ele não poderia ganhar?
Em tese, se Lula atrair alguns eleitores da Simone e do Ciro da eleição anterior, chega a 50% no primeiro turno da próximo eleição. Esse é um desafio factível. O eleitor bolsonarista vai achar que essa análise não não procede, mas a lógica dos números mostra que é possível. Por isso, esse é o primeiro desafio da direita para eleição do ano que vem.
E como a direita pode impedir que Lula ganhe no primeiro turno?
Se a oposição conseguir encontrar uma pauta dominante para a campanha, isso vai ser a principal maneira de fazer com que o Lula não ganhe no primeiro turno. A direita precisa de uma pauta moral, seja segurança pública, corrupção ou dos pontos fracos do governo. Para defender junto ao eleitor que o atual governo foi incompetente, indecente e imoral. Isso sem dúvida desidratará Lula ao longo da campanha.
Com isso, reduz as chances de vitória no primeiro turno. Tudo isso não é trivial, esse é um desafio grande da oposição por causa do ecossistema de presidenciáveis hoje, com a canibalização na direita e não na esquerda no próximo ciclo.
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante a abertura do Debate Geral da 80.ª Sessão Ordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas. Sede da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York ( Ricardo Stuckert / PR)
Existe um outro ponto que a direita precisa avançar?
Um segundo desafio é fazer uma separação entre o que foi o governo Bolsonaro e o bolsonarismo com uma agenda que não seja de retomada. É preciso convencer o país de que Lula deve perder a eleição, mas que não teremos um novo governo Bolsonaro, que é uma mudança.
Isso acontece porque não há uma maioria a favor de uma continuidade do que foi a experiência Bolsonaro. Há 40% de eleitores bolsonaristas e alguns antilulistas muito convictos. Precisa existir algo a mais que isso para convencer o eleitor mais moderado que não é apenas uma alternância de poder e nem uma atualização do que foi Bolsonaro. Precisa mostrar que é algo diferente, que é algo melhor e de mais conteúdo.
E o Tarcísio pode representar isso?
Sempre analisamos que Tarcísio tem essa credbilidade. Ele tem um capital de imagem muito superior que Bolsonaro, muito por ter outro estilo de fazer política, de discurso, são outros atributos. Pela comunicação dele, as pessoas entendem que representa algo muito diferente.
Mas quando ele se associa muito ao Bolsonaro, de fato, perde um pouco esse brilho. Um dos grandes desafios dele é se posicionar de maneira fiel para manter a sua legitimidade dentro do movimento bolsonarista para que ele seja aceito como candidato ao mesmo tempo que não pode perder esse bônus de imagem dentro do segmento mais moderado do eleitorado que rejeita o discurso mais radical do Bolsonaro.
Tarcísio discursa durante a manifestação de 7 de setembro na Av. Paulista (NELSON ALMEIDA/AFP)
Qualquer um precisa da aprovação de Bolsonaro para ser competitivo?
Qualquer um precisa não ser sabotado pelo Bolsonaro. É um pouco diferente. Uma coisa é o Bolsonaro fazer campanha para você, dizer 'você é meu candidato', como pode fazer com o Caiado, por exemplo. Mas será que o Caiado precisa disso? Talvez não. Porém, o Caiado certamente não precisa do Bolsonaro dizendo: 'O Caiado é o anticristo, Caiado é de esquerda, que traiu o nosso movimento'. Com certeza, o Caiado não precisa disso.
Então, se o Bolsonaro se posicionar contra algum desses candidatos de forma muito agressiva, isso pode prejudicá-los?
Exatamente. Se o Bolsonaro atacar violentamente, isso será muito problemático para aquele candidato. Já vimos isso acontecer com o [prefeito de São Paulo] Ricardo Nunes e também com o Marçal em São Paulo em 2024, por exemplo. Isso realmente comprova o impacto desses ataques.
E em relação à melhor situação econômica percebida pelas pessoas, como nos rendimentos? Como isso pode influenciar as eleições?
Claro, o governo vai tentar entregar algum dinheiro a mais para a população, mas também terá candidatos da direita dizendo: 'Olha, o governo está tentando comprá-lo com esses benefícios'. Depende muito do talento político dos candidatos, da estratégia da campanha e da habilidade de transmitir essas mensagens.
Não é algo fácil de determinar, qual vai ser mais relevante: o impacto econômico ou o discurso político. Isso se dá também porque o crescimento econômico não é astronômico, é algo que acontece, mas em uma frequência lenta.
De maneira geral, qual é o eleitor que vai às urnas em 2026, levando em consideração os novos dados do Censo?
O eleitorado de 2026 não será exatamente o mesmo que o de 2022. A expectativa sobre a ascensão do eleitorado evangélico não se confirmou. O ritmo de aceleração dos evangélicos caiu, e o número de evangélicos ficou abaixo do esperado, em torno de 27%, quando a previsão era de que chegasse a 30%, 33% ou até 35%. Isso significa que não foi necessário recalibrar as pesquisas da Atlas com base nisso.
O segmento de religião que mais cresce hoje no Brasil, de fato, é o público agnóstico e os católicos não praticantes. A ascensão do público não religioso está sendo mais intensa e rápida do que a ascensão dos evangélicos, o que é bastante relevante.
Outro dado importante é sobre os eleitores jovens, de 16 a 19 anos, que vão votar pela primeira vez. Eles tendem a ter um perfil muito mais progressista do que os outros grupos etários. Isso pode favorecer o Lula, especialmente entre os novos eleitores. No entanto, ele não vai ganhar apenas por causa disso, pois há também uma erosão do apoio ao Lula no Nordeste, que é uma base tradicionalmente muito forte para o PT.
O que você acha sobre a disputa nas eleições estaduais? A esquerda vai conseguir se recuperar?
A esquerda tende a ir mal nas eleições estaduais. Alguns governadores da esquerda não vão conseguir a reeleição, como vimos nas eleições municipais. No entanto, a direita precisa se aliar ao centro para criar uma candidatura mais moderada. Se a direita radical dominar, vai ficar mais difícil. Vamos ver o que acontece em estados como Ceará, onde a direita tem chances de vitória.
E a geografia eleitoral? Como ela pode se desenrolar em 2026?
No Sul e no Centro-Oeste, a direita tem uma grande base. Já no Nordeste, o desafio será a disputa em estados-chave, como a Bahia. O governo estadual na Bahia é um grande fator para as eleições de 2026. A situação sobre se o ministro da Casa Civil, Rui Costa, será candidato é crucial, pois a taxa de aprovação do atual governador não é das melhores, e existe um opositor forte, o ACM Neto.
E sobre o Senado, como você vê a competição?
O principal desafio no Senado será a canibalização de candidaturas, especialmente na direita. Em São Paulo, por exemplo, temos vários candidatos que competem entre si. Se esses candidatos não se organizarem, a direita pode perder as duas vagas no Senado para a esquerda. A falta de uma liderança forte na direita pode ser um grande problema.
O que podemos esperar para a eleição na Câmara dos Deputados?
O Centrão vai se recuperar bem nessa próxima eleição. A desaceleração do bolsonarismo, de certa forma, vai ajudar o Centrão a se recompor. Então, o que vimos nas últimas eleições, nas quais o Centrão teve uma grande força, vai voltar a ser relevante, especialmente devido à estrutura partidária, à competência de fazer uma boa campanha, recursos e organização, que são fatores muito fortes para a atuação do Centrão.
Você acha que a desinformação e o uso das redes sociais terão um impacto nas eleições de 2026?
Acredito que o público brasileiro está mais maduro em relação a isso. A questão das fake news e das redes sociais não terá o impacto que teve nas últimas eleições. As pessoas estão mais cientes do que está acontecendo e têm uma postura mais reservada, tanto em relação a Bolsonaro quanto a Lula. A grande novidade será o uso da inteligência artificial, mas mesmo assim não acho que isso será determinante nas eleições.