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Do campo à SPFW: como o algodão quer reconquistar espaço e impulsionar um setor de R$ 33 bilhões

Sou de Algodão lança campanha para resgatar a conexão do algodão com a brasilidade e destacar sua relevância econômica e cultural, promovendo a fibra nacional no Brasil — e no mundo

 (Banco de imagens ABRAPA/Divulgação)

(Banco de imagens ABRAPA/Divulgação)

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 22 de junho de 2025 às 06h05.

Última atualização em 22 de junho de 2025 às 18h30.

O Brasil deve produzir 3,7 milhões de toneladas de algodão em 2025, segundo projeções do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Com alta estimada de 1,6% nas exportações, o país deve embarcar cerca de 2,83 milhões de toneladas da fibra para o mercado internacional — mantendo-se entre os principais fornecedores globais do produto.

Esse avanço embasa a nova fase da campanha "Brasilidades", iniciativa do movimento Sou de Algodão, criada pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) para valorizar a cultura da fibra no Brasil — e no exterior.

As exportações do algodão brasileiro vão para mais de 150 países, e os principais importadores são: China, Vietnã, Bangladesh, Turquia e Paquistão.

Segundo Silmara Ferraresi, diretora de relações institucionais da Abrapa e gestora do movimento, a campanha busca resgatar a conexão entre o algodão, a economia e a identidade cultural brasileira.

“O que consideramos extremamente relevante é recuperar essa noção de brasilidade ligada ao design e à moda nacional feita com algodão. Se olharmos para o uso de tecidos pela indústria, tanto no Brasil quanto no mundo, o algodão ainda é a fibra natural mais utilizada”, afirma.

Na safra 2023/24, o Brasil ultrapassou os Estados Unidos e assumiu a liderança nas exportações globais de algodão, com 2,6 milhões de toneladas embarcadas. Agora, na temporada 2024/25, o país encara novos desafios, especialmente diante da concorrência das fibras sintéticas, que ganham espaço por fatores como preço e disponibilidade.

O cultivo de algodão é a quarta maior cultura temporária do país, com valor de produção estimado em R$ 33 bilhões, mostram dados da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura e Pecuária (SPA/Mapa).

Segundo a Embrapa, desde o final da década de 1990 e início dos anos 2000, o cerrado brasileiro se consolidou como a principal região produtora da fibra. Por lá, as cultivares precoces têm ciclo de cerca de 150 dias, as de ciclo médio entre 160 e 180 dias, e as de ciclo longo, mais de 180 dias.

Além disso, o ciclo do algodoeiro varia em função da cultivar e do ambiente. Quanto mais próximo à linha do Equador, mais curto é o ciclo.

“Queremos educar o consumidor sobre o que ele veste, e reforçar que o algodão brasileiro representa emprego, tecnologia e responsabilidade ambiental”, diz Ferraresi.

Apesar do avanço no mercado externo, o consumo interno de algodão tem se mantido estável nos últimos cinco anos, oscilando entre 700 mil e 750 mil toneladas de pluma, segundo dados da Abrapa. No contexto nacional, a indústria têxtil continua sendo uma das mais relevantes da economia.

O setor conta com 24,3 mil empresas em operação e emprega diretamente cerca de 1,33 milhão de pessoas, com uma massa salarial anual de R$ 25,2 bilhões. Considerando empregos indiretos, a cadeia têxtil movimenta aproximadamente 10 milhões de postos de trabalho — sendo a maior parte composta por mulheres.

“Nosso setor não apenas gera empregos em larga escala, mas mantém a produção dentro do país, o que nos diferencia de mercados que migraram para a Ásia”, ressalta Ferraresi.

Os dados também apontam para uma cadeia robusta: R$ 193,2 bilhões em faturamento no segmento têxtil e R$ 389,9 bilhões em confecção, além de R$ 16,5 bilhões em impostos e taxas arrecadados, segundo o Ministério da Fazenda.

No mercado interno, o algodão representa entre 40% e 50% do volume de tecidos consumidos no segmento formal. No entanto, no cenário global, a participação da fibra brasileira ainda varia entre 21% e 23%, sendo superada pelas fibras sintéticas.

Por isso, a Abrapa aposta na diferenciação da fibra nacional para ampliar sua competitividade e fortalecer sua presença no mercado internacional. Segundo Ferraresi, "é preciso destacar a qualidade, o valor agregado e a sustentabilidade da fibra nacional".

Nesse sentido, diz a executiva, o Brasil tem avançado como um dos maiores fornecedores de algodão responsável do mundo. Desde 2004, o país conta com um programa de rastreabilidade que garante a origem da produção.

Em 2012, foi iniciada a certificação de fazendas, que hoje atesta práticas sustentáveis no campo. “Conseguimos garantir a origem do algodão e como ele é produzido, com respeito ao meio ambiente e às pessoas”, diz a diretora.

Algodão brasileiro

Além do consumo, a campanha 'Brasilidades' mira mudar a percepção do consumidor. Em uma pesquisa qualitativa realizada pela Abrapa, uma das entrevistadas disse que não usaria um vestido de algodão em uma festa de gala porque “lembrava chita”.

O episódio, diz Ferraresi, ilustra o desafio de reposicionar a imagem do algodão no imaginário brasileiro. “Ainda precisamos trabalhar muito para mostrar o potencial e a sofisticação dessa fibra.”

A ligação com a moda é uma das frentes da campanha. Durante a última edição da São Paulo Fashion Week, em outubro de 2024, o movimento levou à passarela uma gama de designs nacionais para mostrar o 'luxo' da fibra brasileira.

A ideia era mostrar que a fibra, além de tradicional, é versátil e pode compor peças sofisticadas. “Queremos mostrar que o algodão é uma fibra de alta moda, sem perder sua identidade e sua conexão com a cultura brasileira”, afirma Ferraresi.

As projeções do setor para 2025 são positivas. Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT), e Ministério da Fazenda, a produção têxtil deve crescer 2,6% e a de vestuário, 1,3%. O varejo do setor também deve avançar 1,3%.

Em termos de geração de empregos, a estimativa é de um saldo positivo de 8 mil postos na indústria têxtil e 10,5 mil na confecção apenas no primeiro trimestre do ano.

“Não é só sobre aumentar o consumo, mas valorizar a fibra essencial para a nossa história, para a moda e para a indústria brasileira”, diz a diretora.

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